Huxley escreveu:Vamos a mais uma réplica a Acauan:
Acauan escreveu:
Huxley,
Antecipando a conclusão final, na maioria dos pontos falamos a mesma coisa, apenas não ficou claro de quais definições partimos e de como as aplicamos.
Por exemplo, quando eu disse "se houve redução visível na pobreza de uma população, então a renda per capita desta população aumentou." e você respondeu "a pobreza diminui tão somente se a renda dos que estão abaixo da linha de pobreza se eleve." apenas repetimos a mesma idéia com outras palavras, uma vez que "a renda per capita desta população" a que me referi é exatamente "a renda dos que estão abaixo da linha da pobreza" da qual você falou.
Além destas diferenças de interpretação temos que considerar um segundo ponto que requer cautela em discussões econômicas que é a fundamentação nos índices.
Considero um mito a tendência existente, tanto no estudo da economia quanto da gestão de empresas, a crença de que toda a realidade econômica ou administrativa possa ser integralmente traduzida em números.
Ora, a realidade econômica é sócio-cultural e seus números só fazem sentido quando analisados sob esta perspectiva.
Assim, os índices devem ser condizentes com a realidade sob análise.
Para a discussão em curso é relevante o que de fato diminui a pobreza material da população em análise.
Nestes termos, do ponto de vista exclusivamente econômico a educação é recurso, riqueza potencial, mas não riqueza efetiva.
Assim, a educação fornece meios para minorar a pobreza, mas não minora a pobreza por si só.
Quando você inclui a educação como componente do índice de crescimento econômico, deixa indefinido se este índice pondera o aumento de riqueza efetiva ou o aumento de riqueza potencial.
Nestes termos, a proposição de que é possível aumentar o salário do trabalhador e a renda nacional (veja bem, nacional) sem crescimento econômico é inconsistente.
Partindo de seu próprio exemplo, do operário fabricante de sapatos que se educa e aumenta sua produtividade em 10%. Se a fábrica não apresentar crescimento econômico ou seja, não aumentar sua produção e venda de sapatos, nenhuma riqueza adicional terá sido gerada.
Uma regra que todo gestor industrial conhece é que aumento de produtividade sem aumento de produção implica ou em aumento da ociosidade ou em redução do quadro de funcionários.
Neste ambiente, o ganho médio de renda e o aumento de salário é zero, pois o que porventura venha ganhar a mais o operário que se educou e se tornou produtivo será no fim cancelado pela demissão de algum funcionário devido ao aumento da ociosidade.
Note que é possível um aumento de salário e renda local, onde a produtividade, a produção e as vendas cresceram em fase, mas se o mercado de sapatos não cresceu, então o que foi ganho por uma determinada população terá sido, necessariamente, perdida por outra, resultando na soma zero.
Bem, eu não falei que é possível “a proposição de que é possível aumentar o salário do trabalhador e a renda nacional sem crescimento econômico (nota minha: crescimento da renda per capita)”.Exclua esse “e a renda nacional”.
Bem, eu queria saber de onde vem a idéia que “aumento de produtividade sem aumento de produção implica ou em aumento da ociosidade ou em redução do quadro de funcionário”.Ora, nenhum gestor terá incentivos para dá ordens de corte de produção a menos que a demanda agregada se reduza, e estagnação da produção (para questões de simplificação, suponhamos que o crescimento da população foi igual a 0%, de modo a tornar o crescimento da renda per capita igual a 0%) não garante redução na demanda agregada.Quanto à “redução do quadro de funcionários”, aí essa idéia já é um pouco melhor.Mas reduzir a quantidade de trabalho aplicada implica em reduzir a quantidade de produto gerado.Para que o produto gerado não se reduza, a empresa deveria compensar com o aumento da produtividade dos fatores tecnológicos.Só assim, ela anularia o ganho salarial resultado do aumento da produtividade decorrente do maior conhecimento do trabalhador com a melhor produtividade via melhora tecnológica.E se a empresa haver algum limite para a melhora tecnológica (digamos, se há uma restrição no aumento da importação de bens de capital mais eficientes devido à desvalorização cambial) num dado período?Se este é o caso, é totalmente possível que o salário do trabalhador aumente em ambiente de estagnação.Se houver uma apropriação ao menos parcial do aumento da produtividade do trabalhador pelos salários, então uma melhora na educação causando melhores salários poderia se desvincular de crescimento econômico.Não sei o quanto essa situação imaginada aqui seria provável (ou se ela seria muito provável), mas é absolutamente seguro afirmar que a melhor qualidade da mão-de-obra é um dos componentes do crescimento econômico, como mostram os dados empíricos que apontam que ela tem impacto sobre a renda nacional (Psacharopoulos,1994;Krueger & Lindahl,2000;Menezes-Filho 2001;Ferreira & Pessôa,2002).
Acauan escreveu:Quando você inclui a educação como componente do índice de crescimento econômico, deixa indefinido se este índice pondera o aumento de riqueza efetiva ou o aumento de riqueza potencial.
Refiro-me a riqueza efetiva mesmo.Considero que melhoria na qualidade da mão-de-obra tem um efeito qualitativamente igual à de um aumento no investimento em capital físico.
Quem diz o contrário, estará concordando com a lógica do ex-ministro Delfim Neto, segundo o qual o “bolo tem de primeiro crescer, para depois ser repartido”.Não existe defasagem entre o período que o bolo cresce e o período em que o bolo é distribuído.O aumento visível da produtividade média do trabalho garante que a economia cresça e seja capaz de distribuir renda AO MESMO TEMPO!Isso não é conversa de esquerdista.Isso pode ser visto em textos de economistas liberais, como o ex-presidente do BC Gustavo Franco:
http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/insercao.pdfColocarei mais argumentos a seguir que justifiquem essa visão.
Acauan escreveu:A maioria dos índices econômicos brasileiros não consideram a enorme economia informal ou a consideram apenas estimativamente. Assim, quando estes índices dizem que não houve crescimento econômico ou o crescimento foi baixo é preciso considerar que a economia informal cresce mais nestes períodos, quando atrai mão de obra rejeitada pelo mercado formal e por apresentar flexibilidade que lhe permite expansão mesmo em tempos de estagnação.
Além disto, os pobres em geral são mais afetados pelo desempenho da economia informal do que da formal.
Se você está dizendo que o crescimento econômico brasileiro da segunda metade da década de 90 foi subestimado, eu queria saber dos dados empíricos que apóiam essa afirmação.Ainda que fosse verdade, não me parece que o efeito tenderia a ser significativo.Se essas empresas informais tivessem explorado mais trabalho de forma significativa para financiar sua suposta expansão, a taxa de desemprego não teria se elevado tanto na segunda metade da década de 90.E o motivo para acreditar que elas não tinham como ampliar seu estoque de capital e trabalho parece simples.É mais razoável supor que a flexibilidade dessas firmas informais para expansão em tempos de estagnação é pequena.Firmas informais sofrem com o não-acesso ao mercado de crédito e a baixa escala de produção.Essas empresas não têm oportunidade de explorar os retornos crescentes de escala, justamente porque sua informalidade é, em parte, responsável pela sua baixa escala.Firmas maiores tem mais probabilidades de serem fiscalizadas pelas autoridades tributárias, e isso impede que firmas menores cresçam e ganham escala, realimentando o processo baixa escala-ineficiência-informalidade.Não vejo como elas pudessem está numa situação muito melhor que as firmas formais no período considerado.
Analisando tudo, dá para concluir que realmente tivemos crescimento pífio.E tivemos crescimento pífio da renda per capita com redução da pobreza.Imagine se tivéssemos utilizado o instrumento de redução da desigualdade (a desigualdade permaneceu estável no período que considerei, devido à baixa eficiência da política social brasileira) para reduzir a pobreza.
Acauan escreveu:O problema é que se não há crescimento econômico, então o aumento de renda daquela população foi obtida às custas da redução de renda de outras, na forma de aumento de impostos ou outro meio de transferência forçada de renda.
De novo, o ganho total de renda é zero.
A possibilidade de se pode minorar a pobreza nacional a partir deste tipo de transferência, sem crescimento econômico, depende do tamanho das classes média e alta em relação à quantidade de pobres. Nos países pobres esta relação é insuficiente, por isto este tipo de transferência de renda implica em redução no consumo da classe média, o que provoca recessão ou depressão econômica, o que no médio prazo faz com que a pobreza retorne aos níveis anteriores ou aumente.
Não há como a transferência de renda reduzir o nível de pobreza no curto e no médio prazo ele voltar a seu nível original por causa da redução do consumo da classe média.Aqui você supõe que o nível de consumo afeta as variáveis do produto efetivo gerado.Mas não levou em conta que a propensão marginal a consumir dos segmentos mais pobres da população sempre é mais alta do que a das classes mais abastadas.Como o consumo efetivo (um dos componentes do cálculo do PIB, ao lado de investimento, gasto governamental e saldo das transações correntes) depende da propensão marginal a consumir, então uma redistribuição eficiente da riqueza nunca é um jogo de soma ZERO em relação ao crescimento econômico.
Acauan escreveu:A maioria destas equações se referem a uma realidade econômica pré-globalização.
Ela não faz o menor sentido para correlacionar, por exemplo, o preço de um software complexo com os demais fatores ponderados, além de não considerar que em mercados globais o conceito de margem de lucro média é uma abstração teórica apenas. Quem compete com os produtos chineses sabe muito bem disto.
Além do que, a equação só faz sentido se não houver capacidade instalada ociosa, o que segundo a Teoria das Restrições é praticamente impossível na realidade industrial.
Havendo capacidade ociosa sem aumento das vendas, os ganhos de produtividade implicam apenas em aumento da ociosidade.
Logo, a equação carece de um elemento que quantifique a decisão do mercado de comprar o produto resultante do ganho de produtividade, implicando em maior produção com o mesmo custo fixo.
A equação que mostrei é apenas uma forma das formas de viabilizar argumentação que o aumento da produtividade do trabalho pode ser apropriada automaticamente pelos salários.Se salário real é W/P, não é preciso que o aumento de salário real seja explicado apenas com redução em P.
Existe uma outra argumentação melhor, baseada na Teoria dos Salários de Eficiência.Ela diz que o empresário, a priori, estabelece o nível de salários que estivesse na margem de deixar o trabalhador indiferente entre o ócio e o trabalho.Mas que, na verdade, eles pagam salários maiores que o de equilíbrio porque os trabalhadores têm certo arbítrio de esforço do seu trabalho e a empresa contorna possíveis relapsos pagando salários superiores ao de equilíbrio, porque salários mais altos lhes dão maior incentivo a envidar maiores esforços.Salários mais altos também evitam a rotatividade.A rotatividade da mão-de-obra é um fator negativo para as empresas, porque a contratação e o treinamento de funcionários tem alto custo para empresas.Existem dados empíricos que corroboram a Teoria dos Salários de Eficiência.Henry Ford no início do século XX elevou os salários dos operários de sua linha de montagem para uma diária de 5 dólares, que era o dobro da diária corrente da época.O resultado dessa política dessa política teve o efeito esperado pela Teoria dos Salários de Eficiência.A rotatividade caiu, o absenteísmo se reduziu e a produtividade aumentou (Mankiw, 2001.Introdução a Economia.Editora Campus, p.602).Ford mesmo declarou que considerava a política da diária de 5 dólares “um dos mais perfeitos métodos de corte de custos já aplicados”.Ora, na época trabalho requerido na linha de montagem da Ford era feito por qualquer trabalhador sem qualificação e não houve aumento da produtividade do trabalho que justificasse essa elevação dos salários.
Se o salário pode ser aumentado autonomamente pela lógica dos salários de eficiência, imagine se tiver um aumento de produtividade do trabalho (devido a melhor conhecimento técnico da mão-de-obra, por exemplo) que justifique esse aumento.Dá para entender claramente, porque tende a haver uma apropriação automática do aumento da produtividade , ao menos em parte, pelos salários.
Acauan escreveu:
Huxley, você é capaz de demonstrar esta equação e as conclusões tiradas dela substituindo as incógnitas literais por números reais da economia, provando assim que as contas batem tanto na teoria quanto na prática?
Quanto à proposição de que é possível aumentar o salário do trabalhador do sem crescimento econômico, acho que só tenho argumento teórico mesmo.Quanto a proposição que a melhor qualidade da mão-de-obra é um dos componentes do crescimento econômico, não tenho dúvidas que as contas batem tanto na teoria quanto na prática.Eu não sou especialista, mas tenho certeza que não há como vários economistas terem concluído de forma independente em estudos que a melhoria da educação tem impacto positivo sobre a renda nacional, sem que isso não significasse a validade da visão que venho defendendo aqui.Segundo dados internacionais, cada ano a mais de escolaridade aumenta o salário em 9%.No Brasil, essa influência chega a 12% (Menezes-Filho 2001:
http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/Agenda%20Perdida.pdf ).