Botanico escreveu:
Porque apesar de ser uma jogada que descaracteriza o Espiritismo, neste ponto a Federação Espírita Brasileira conseguiu fazer uma jogada de mestre.
A FEB foi constituída em seu início por ex-católicos altamente carolas, que por falta de doutrinação suficiente, deixaram essa fé, mas levaram a carolice junto com eles.
Em termos doutrinários, o Espiritismo se mostrou mais atraente, mas certas coisas eram MUITO DOLOROSAS para esses ex-católicos.
Tente saber entre os chatólicos deste forum o que eles pensariam se o papa decidisse que a tal Santa Maria não é mais a Virgem Santíssima e sim foi uma esposa comum, que transou com seu marido José e ainda teve outros filhos além de Jesus. Acredito que isso partiria o coração da maioria dos católicos, senão de todos.
E era exatamente isso que há no Espiritismo: não existe por aqui Virgem Santíssima e Jesus é só um irmão espiritual mais velho, que teve uma evolução espiritual exatamente como a nossa, sem quaisquer privilégios ou ajuda especial. Isso quer dizer que o espírito que animou Jesus pode muito bem ao longo de sua evolução ter animado personagens equivalentes a Hitler, Torquemada, Tarmelão, Átila, Gengis-Kã, & Cia Bela.
ISTO É O QUE DIZ O ESPIRITISMO.
Mas aí alguém chegou na FEB com uma obra espúria, chamada os Quatro Evangelhos, de Jean B. Roustaing, composta com a ajuda de uma médium obsidiada e CONTRÁRIA À DOUTRINA ESPÍRITA.
Mas junto com ela, vinham coisas importantíssimas para a carolice católica dos fundadores da FEB:
a) Dizia que Jesus foi um espírito que evoluiu EM LINHA RETA (quer dizer, jamais pecou, jamais pisou na bola e portanto NUNCA ENCARNOU (é um jeito disfarçado de se reconstruir o Jesus divino, da Fé Católica).
b) Como NUNCA ENCARNOU, quando apareceu por aqui como Jesus, ele era apenas um espírito auto-materializado (um agênere). Conseqüentemente, Maria foi enganada com uma falsa gravidez e "pariu" durante um sono induzido. Quando acordou estava com o "menino" Jesus em seus braços. Isso foi o mais importante de tudo, pois agora lhes foi devolvida a Virgem Santíssima.
Assim então juntou-se a fome, a vontade de comer e o banquete. A FEB mergulhou de cabeça no Rustenguismo e fez dele seu dogma oficial (uma "pós-graudação" de Espiritismo). Assim então até fins dos anos 90 a FEB foi rustenguista roxa, fazendo estatutos e manobras de forma a permitir que somente rustenguistas estivessem nos quadros de direção.
Para neutralizar os outros movimentos espíritas "kardecistas", a FEB convidou-os a fazer parte dela, garantindo-lhes ampla liberdade de opinião e participação... mas na prática é óbvio que isso não iria acontecer e os grupos, depois de desfeitos e absorvidos por ela, simplesmente desapareceram, pois não conseguiram se reorganizar.
Nos anos 1940 foi criado um certo Conselho Federativo, que para desgosto de seu organizador, Wantil de Freitas, estabeleceu que o Livro dos Espíritos era de estudo prioritário nos centros espíritas. Mas esse malandrão não saiu perdendo de todo: fez incluir na obrigatoriedade de estudos o livro Brasil, coração do mundo e pátria do evangelho.
Certo que para o pessoal daqui, TODOS os livros que Chico Xavier publicou são lixo, mas esse aí é o MAIS LIXO DE TODOS. Trata-se de uma absurda patriotada, que mostra um Jesus confuso e perdido, que recebe o aviso do anjo Ismael (tido e havido pela FEB como seu mentor espiritual) que iria transplantar a árvore do evangelho para o Brasil e Jesus pergunta: _ Onde é essa terra?
Quem por aqui acha que Jesus era burro, perdido, sem prestígio e sem moral, então vai gostar desse livro (ao menos neste aspecto).
Apesar de todos esses pesares, a FEB acertou o alvo onde interessava: deu mais ênfase na Filosofia e Religão espíritas, embora desconsiderasse o aspecto científico. E mesmo promovendo ao máximo o lixo rustenguista, este não teve a penetração que a FEB desejava (menos mau).
E no resto do Mundo, como foi a coisa? Bem, o chamado Neo-espiritualismo é um salseiro esotérico, onde cada médium faz a sua corrente e pensamento, mas na França havia o "kardecismo" ainda ativo. Porém ele não se manteve como devia. O sucessor de Kardec, Gaetan Leymarie, era um cara fraco, excessivamente liberal, e abriu muito espaço na Revista Espírita para que pessoas com idéias particulares e não afinadas com a DE, escrevessem o que bem entendessem. A coisa começou a se estragar aí.
Figuras como Delanne, Geley, Leon Denis, Gustave Meyer, etc ainda tentaram segurar a coisa, mas o interesse maior era o aspecto científico.
E aí é que a coisa degringolou. Com a morte de Geley, sucedeu-o Robert Amadou, fervoroso católico, que achou que a Metapsíquica estava impregnada demais de espiritismo e substitui-a pela então charmosa Parapsicologia. A idéia de que os fenômenos seriam causados por espíritos foi ficando cada vez menos aceita e o número de espíritas foi decaindo e a União Espírita Francesa virou um exército de generais e de palhaços (tinha até uma cigana lendo sortes no saguão do prédio desta União). A pá de cal foi dada por André Dumas. Interessadíssimo e fazer do Espiritismo apenas ciência, determinou o fim de publicação da Revista Espírita (mas manteve os direitos para si) e sua substituição por outra (Reinatrê 2000), sem comprometimento com a DE.
A FEB tentou conseguir de Dumas a autorização para continuar publicando a Revista Espírita em qualquer língua, exceto a francesa, mas Dumas recusou ceder neste ponto. Achava ele que o lado religioso e filosófico eram "um outro Kardec" (havia mais de um?). E assim o número e espíritas na França nem chegava a mil. E todo o esforço de Dumas não foi recompensado: livros espíritas nas livrarias francesas eram encontrados junto com os folclóricos, bruxaria, esoterismo, etc e tal.
Nos anos 1980, Roger Perez virou a mesa: tomou na justiça os direitos autorais de publicação da Revista Espírita e cuidou de reestruturar o Espiritismo e devolver-lhe a real DE.
Quem quiser saber mais, leia a coleção Allan Kardec, de Zeus Wantil e Francisco Thiesen (em três volumes - o primeiro é impecável, mas o II e o III têm algumas referências a Roustaing que podem ser desconsideradas) e Kardec, irmãs Fox e outros, de Jorge Rizzini.
É isso.
O mais interessante nisso tudo é que os espiritas brasileiros ficaram interessados em explicar esse fenômeno.
Tem uns textos católicos que acusam a maçonaria de estar infiltrada na Igreja para tentar destruí-la.
Nesse caso, parace que o catolicismo toma o lugar da Maçonaria para que a teoria conspiratória ganhe corpo.
A hipótese de o espiritismo não ter sido aceito por ser classificado como tolice não pode ser cogitada, evidentemente.