já li sim, o primeiro parágrafo já é fabuloso... o livro é "anarquista", anarquista no sentido de Homem livre para ser ele mesmo, sem ser 'servo ou servido'.
mas o trecho a seguir é uma pedaço também interessante, quase um reflexo de uma sociedade anestesiada alienada.
Desobediência: Virtude Original do Homem
Oscar Wilde
Pode-se até admitir que os pobres tenham virtudes, mas elas devem ser lamentadas. Muitas vezes ouvimos que os pobres são gratos à caridade. Alguns o são, sem dúvida, mas os melhores entre eles jamais o serão. São ingratos, descontentes, desobedientes e rebeldes - e têm razão. Consideram que a caridade é uma forma inadequada e ridícula de restituição parcial, uma esmola, geralmente acompanhada de uma tentativa impertinente, por parte do doador, de tiranizar a vida de quem a recebe. Por que deveriam sentir gratidão pelas migalhas que caem da mesa dos ricos? Eles deveriam estar sentados nela e agora começam a percebê-lo. Quanto ao descontentamento, qualquer homem que não se sentisse descontente com o péssimo ambiente e o baixo nível de vida que lhe são reservados seria realmente muito estúpido.
Qualquer pessoa que tenha lido a história da humanidade aprendeu que a desobediência é a virtude original do homem. O progresso é uma conseqüência da desobediência e da rebelião. Muitas vezes elogiamos os pobres por serem econômicos. Mas recomendar aos pobres que poupem é algo grotesco e insultante. Seria como aconselhar um homem que está morrendo de fome a comer menos; um trabalhador urbano ou rural que poupasse seria totalmente imoral. Nenhum homem deveria estar sempre pronto a mostrar que consegue viver como um animal mal alimentado. Deveria recusar-se a viver assim, roubar ou fazer greve - o que para muitos é uma forma de roubo.
Quanto à mendicância, é muito mais seguro mendigar do que roubar, mas é melhor roubar do que mendigar. Não! Um pobre que é ingrato, descontente, rebelde e que se recusa a poupar terá, provavelmente, uma verdadeira personalidade e uma grande riqueza interior. De qualquer forma, ele representará uma saudável forma de protesto. Quanto aos pobres virtuosos, devemos ter pena deles mas jamais admirá-los. Eles entraram num acordo particular com o inimigo e venderam os seus direitos por um preço muito baixo. Devem ser também extraordinariamente estúpidos. Posso entender um homem que aceita as leis que protegem a propriedade privada e admita que ela seja acumulada enquanto for capaz de realizar alguma forma de atividade intelectual sob tais condições. Mas não consigo entender como alguém que tem uma vida medonha graças a essas leis possa ainda concordar com a sua continuidade.
Entretanto, a explicação não é difícil, pelo contrário. A miséria e a pobreza são de tal modo degradantes e exercem um efeito tão paralisante sobre a natureza humana que nenhuma classe consegue realmente ter consciência do seu próprio sofrimento. É preciso que outras pessoas venham apontá-lo e mesmo assim muitas vezes não acreditam nelas. O que os patrões dizem sobre os agitadores é totalmente verdadeiro. Os agitadores são um bando de pessoas intrometidas que se infiltram num determinado segmento da comunidade totalmente satisfeito com a situação em que vivem e semeiam o descontentamento nele. É por isso que os agitadores são necessários. Sem eles, em nosso estado imperfeito, a civilização não avançaria. A abolição da escravatura na América não foi uma conseqüência da ação direta dos escravos nem uma expressão do seu desejo de liberdade. A escravidão foi abolida graças a conduta totalmente ilegal de agitadores vindos de Boston e de outros lugares, que não eram escravos, não tinham escravos nem qualquer relação direta com o problema. Foram eles, sem dúvida, que começaram tudo. É curioso lembrar que dos próprios escravos eles recebiam pouquíssima ajuda material e quase nenhuma solidariedade. E quando a guerra terminou e os escravos descobriram que estavam livres, tão livres que podiam até morrer de fome livremente, muitos lamentaram amargamente a nova situação. Para o pensador, o fato mais trágico da revolução francesa não foi o de que Maria Antonieta tenha sido morta por ser rainha, mas que os camponeses famintos da Vendée tivessem concordado em morrer defendendo a causa do feudalismo.
Extraído da Obra "A Alma do Homem Sob o Socialismo", de 1891
Alma do Homem Sob o Socialismo - Wilde, Oscar
Enviado por Sabotagem em 8 Abril, 2006 - 12:01am.
A maioria dos homens arruína suas vidas por força de um altruísmo doentio e extremado - são forçados, deveras, a arruiná-las. Acham-se cercados dos horrores da pobreza, dos horrores da fealdade, dos horrores da fome. É inevitável que se sintam fortemente tocados por tudo isso. As emoções do homem são despertadas mais rapidamente que sua inteligência; e, como ressaltei há algum tempo em um ensaio sobre a função da crítica, é bem mais fácil sensibilizar-se com a dor do que com a idéia. Conseqüentemente, com intenções louváveis embora mal aplicadas, atiram-se, graves e compassivos, à tarefa de remediar os males que vêem. Mas seus remédios não curam a doença: só fazem prolongá-la. De fato, seus remédios são parte da doença.
Buscam solucionar o problema da pobreza, por exemplo, mantendo vivo o pobre; ou, segundo uma teoria mais avançada, entretendo o pobre.
Mas isto não é uma solução: é um agravamento da dificuldade. A meta adequada é esforçar-se por reconstruir a sociedade em bases tais que nela seja impossível à pobreza. E as virtudes altruístas têm na realidade impedido de alcançar essa meta. Os piores senhores eram os que se mostravam mais bondosos para com seus escravos, pois assim impediam que o horror do sistema fosse percebido pelos que o sofriam, e compreendido pelos que o contemplavam. Da mesma forma, nas atuais circunstâncias na Inglaterra, os que mais dano causam são os que mais procuram fazer o bem. Por fim presenciamos o espetáculo de homens que estudaram realmente o problema e conhecem a vida - homens cultos do East End - virem a público implorar à comunidade que refreie seus impulsos altruístas de caridade, benevolência e coisas desta sorte. Fazem-no com base em que essa caridade degrada e desmoraliza. No que estão perfeitamente certos. A caridade cria uma legião de pecados.
E há mais: é imoral o uso da propriedade privada com o fim de mitigar os males horríveis decorrentes da instituição da propriedade privada. É tão imoral quanto injusto.
Com o Socialismo, tudo isso naturalmente será mudado. Não haverá pessoas enfiadas em antros e em trapos imundos, criando filhos doentes e oprimidos pela fome, em ambientes insuportáveis e repulsivos ao extremo. A segurança da sociedade não dependerá, como hoje, das condições climáticas. Se cair uma geada, não teremos uma centena de milhares de homens desempregados, vagando pelas ruas em estado repugnante de miséria, implorando esmolas ao próximo, ou apinhando-se às portas de albergues abomináveis para garantir um pedaço de pão e a pousada suja por uma noite. Cada cidadão irá compartilhar da prosperidade e felicidade geral da sociedade; e, se vier uma geada, ninguém será prejudicado.
Por outro lado, o Socialismo em si terá significado simplesmente porque conduzirá ao Individualismo.
E-Book
http://sabotagem.revolt.org/node/23
Ele tem no formato L&PM Pocket, em qualquer livrari você deve achar por um preço de por volta de 10 $ ou em banca de jornal... não o substime pelo seu preço.
Ele narra questões humanas e sociais com a personalidade de um poeta.
Ele é bem pequeno, pretendo reler... prefiro reler um livro quantas vezes forem, a ler indiscrimindamente um monte de "inutilidades" apenas por ler ou querer ter um domínio intelectual integral.... bahhh... impossível, o importante é o que faz ou cria, seja com o pouco que leu.