Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

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emmmcri
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por emmmcri »

RicardoVitor escreveu:Emmmcri, quanto você doa (%) do seu rendimento mensal aos pobrezinhos necessitados?


Já ajudei sim muitos trabalhadores em dificuldades que foram impostas pelo sistema ou pelo momento da vida.Não vejo nenhum problema nisso, também já precisei de ajuda e recebi.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Huxley,

Existe uma cronologia logica na discussao cientifica que e seguidamente desrespeitada por certos economistas que voce aprecia.

Dados so fazem sentido dentro de um corpo teorico que lhes atribua um significado. E necessaria uma compreensao do que se estuda, para entao saber quais dados sao importantes e como eles devem ser avaliados.

Voce nao vai aprender nada sobre desenvolvimento economico simplesmente olhando certas estatisticas economicas de paises. Estatisticas sao medias e somas de determinados dados coletados, mas se nao sabemos quais dados medir, como medir, e como interpretar a medicao, o que temos e apenas um amontoado de numeros.

Feita essa ressalva, vamos ao problema do crescimento e investimento.

facamos as definicoes:

O crescimento economico consiste na maior producao de bens no presente em relacao ao passado.

A poupanca consiste na parcela dos bens atuais que nao serao consumidos no presente, visando aumentar a disponibilidade de bens no futuro.


Colocando dessa forma, vemos que o investimento e um fator necessario para o crescimento economico. Pois se nao a investimento, ou seja, se a producao e inteiramente consumida, o capital nao se altera, assim como a sua capacidade de producao de bens.

Nao ha como refutar a realidade desse teorema, que na verdade e um simples corolario das definicoes, apelando para estatisticas.

Mas o que esse teorema nao afirma e que a taxa de investimento, ou seja, a proporcao de bens poupados sobre consumidos, determina a taxa de crescimento, ou seja, a relacao entre a quantidade de bens presentes sobre bens passados.

O primeiro problema aqui presente e o da medicao dessas quantidades. Podemos dizer que tres bananas representam uma riqueza maior do que duas bananas, caso a qualidade delas seja aproximadamente igual. Mas o que dizer de bananas de qualidade de diferentes, ou de macas? Como podemos dizer que houve crescimento, decrescimetno ou estabilidade, se a nossa economia produzia, na data N, 20 bananas e 30 macas de qualidade media, e passou a produzir, na data N+1, 25 bananas de qualidade inferior e 15 macas de qualidade superior?

O uso de quantificadores monetarios sofre do mesmo problema. A moeda e apenas uma mercadoria que e facil de ser trocada, gracas das propriedades particulares que a determinam. Os precos em moeda sao as razoes pelas quais quantidades definidas de moedas sao trocadas por quantidades definidas de bens de uma determinada quantidade. O uso da moeda para quantificar o crescimento e absurdo, pois, na medida em que seja fixada a quantidade de moeda, e a quantidade dos demais bens seja multiplicada por 2, temos evidentemente um crescimento economico que fez dobrar a economia (se negligenciarmos os servicos industriais prestados pela propria moeda, como por exemplo, o uso do ouro para fabricacao de bens). Contudo, a soma dos precos em moeda de todos os bens permanece fixa, a diferenca e que os precos das quantidades fixas de bens diminuiram.

Contudo, se a quantidade de moeda for multiplicada por um fator de 2, e a quantidade de outros bens por um fator de 1/2, teremos que a economia encolheu pela metade (negligenciando novamente os servicos industriais da quantidade adicional de moeda), mas ainda assim a soma dos precos em moeda da quantidade total de bens cresceu.

Nada do que esta escrito acima necessita de comprovacao empirica. Sao enunciados completamente racionais que derivam de leis basicas da economia, e das definicoes empregadas para os termos.

Quando um economista ou estatistico examina esses precos, e os soma e traca medias sem levar em consideracao os fatos acima ele simplesmente esta triturando dados desprovidos de conteudo. Nao ha analise, ha apenas consideracoes especulativas a cerca de dados parciais mal compreendidos.

O segundo problema e quanto a natureza do investimento. O excedente de bens nao consumidos pode ser empregado de varias formas diferentes. Algumas delas rendem excelentes aumentos na producao de bens demandados, outras rendem aumentos menos significativos, outras desenvolvem novos bens, ate entao desconhecidos, mas cuja demanda latente e manifesta, outros sao apenas desperdicio de recursos em metodos pouco eficazes ou na producao de bens pouco demandados.

O que determinara o sucesso do investimento sera a capacidade dos empresarios de estimar quais serao os desejos futuros das pessoas e identificar quais sao os metodos mais eficazes para alcancar a maior satisfacao desses desejos. Nao ha nenhuma razao para acreditar que, dotados de uma quantidade equivalente de capital, dois empresarios diferentes, em paises diferentes, conseguirao satisfazer as necessidades futuras dos consumidores aumentando a producao na mesma medida. Ate porque qualquer medida nesse sentido sofre dos problemas destacados acima.

A unica coisa que se pode afirmar com certeza indubitavel e que para realizar tais progressos os empresarios precisam de capital, e, se eles forem realmente competentes nas suas avaliacoes futuras, a quantidade de servicos que poderao prestar aumentara caso dispuserem de mais capital poupado.

Isso porque nem o mais habil empresario conseguira satisfazer muitas pessoas com acesso a poupanca de um palito de dentes e um pedaco de sabao, e um empresario muito menos competente conseguiria muito mais com uma fabrica equipada com maquinas de ultima geracao e mao de obra competente.

Tambem e impossivel negligenciar os efeitos do ambiente institucional das nacoes, da eficiencia dos metodos de producao ja existentes e do custo em termos de investimento para aumentar sua eficacia, da realidade dos desejos dos consumidores em diferentes culturas.

Dizer que a taxa de investimento da nacao X foi 10% e de crescimento de 5%, enquanto a da nacao Y foi 15% e o crescimento foi de 3%, simplesmente nao diz nada, mesmo se considerarmos que essas medidas guardam alguma relacao razoavel com a realidade. Apenas um estudo minucioso das condicoes particulares dos mercados nas nacoes X e Y, das leis e instituicoes de cada pais, do capital fisico e de conhecimento ja acumulado permitiriam uma compreensao correta desses dados.

Grande parte do seu texto consiste basicamente em recortes de pesquisas estatisticas que refutariam as verdades fundamentais acima. Mas qualquer um que queira ir um pouco alem dos numeros vera que, nesse caso, eles nada dizem, e na verdade sao apenas uma forma de se enganar.
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

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Huxley
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por Huxley »

user f.k.a. Cabeção escreveu:

O crescimento economico consiste na maior producao de bens no presente em relacao ao passado.

A poupanca consiste na parcela dos bens atuais que nao serao consumidos no presente, visando aumentar a disponibilidade de bens no futuro.


Colocando dessa forma, vemos que o investimento e um fator necessario para o crescimento economico. Pois se nao a investimento, ou seja, se a producao e inteiramente consumida, o capital nao se altera, assim como a sua capacidade de producao de bens.

Nao ha como refutar a realidade desse teorema, que na verdade e um simples corolario das definicoes, apelando para estatisticas.

Mas o que esse teorema nao afirma e que a taxa de investimento, ou seja, a proporcao de bens poupados sobre consumidos, determina a taxa de crescimento, ou seja, a relacao entre a quantidade de bens presentes sobre bens passados.

O segundo problema e quanto a natureza do investimento. O excedente de bens nao consumidos pode ser empregado de varias formas diferentes. Algumas delas rendem excelentes aumentos na producao de bens demandados, outras rendem aumentos menos significativos, outras desenvolvem novos bens, ate entao desconhecidos, mas cuja demanda latente e manifesta, outros sao apenas desperdicio de recursos em metodos pouco eficazes ou na producao de bens pouco demandados.

O que determinara o sucesso do investimento sera a capacidade dos empresarios de estimar quais serao os desejos futuros das pessoas e identificar quais sao os metodos mais eficazes para alcancar a maior satisfacao desses desejos. Nao ha nenhuma razao para acreditar que, dotados de uma quantidade equivalente de capital, dois empresarios diferentes, em paises diferentes, conseguirao satisfazer as necessidades futuras dos consumidores aumentando a producao na mesma medida. Ate porque qualquer medida nesse sentido sofre dos problemas destacados acima.

A unica coisa que se pode afirmar com certeza indubitavel e que para realizar tais progressos os empresarios precisam de capital, e, se eles forem realmente competentes nas suas avaliacoes futuras, a quantidade de servicos que poderao prestar aumentara caso dispuserem de mais capital poupado.

Isso porque nem o mais habil empresario conseguira satisfazer muitas pessoas com acesso a poupanca de um palito de dentes e um pedaco de sabao, e um empresario muito menos competente conseguiria muito mais com uma fabrica equipada com maquinas de ultima geracao e mao de obra competente.

Tambem e impossivel negligenciar os efeitos do ambiente institucional das nacoes, da eficiencia dos metodos de producao ja existentes e do custo em termos de investimento para aumentar sua eficacia, da realidade dos desejos dos consumidores em diferentes culturas.

Dizer que a taxa de investimento da nacao X foi 10% e de crescimento de 5%, enquanto a da nacao Y foi 15% e o crescimento foi de 3%, simplesmente nao diz nada, mesmo se considerarmos que essas medidas guardam alguma relacao razoavel com a realidade. Apenas um estudo minucioso das condicoes particulares dos mercados nas nacoes X e Y, das leis e instituicoes de cada pais, do capital fisico e de conhecimento ja acumulado permitiriam uma compreensao correta desses dados.

Grande parte do seu texto consiste basicamente em recortes de pesquisas estatisticas que refutariam as verdades fundamentais acima. Mas qualquer um que queira ir um pouco alem dos numeros vera que, nesse caso, eles nada dizem, e na verdade sao apenas uma forma de se enganar.


Cabeção,

80% das discussões sobre crescimento de longo prazo envolvem a teoria neoclássica de crescimento de Solow (1956) e suas variantes (Lucas, Romer, Grossman & Helpman).

Essa teoria leva em conta a função de produção de Cobb-Douglas e nela está incluída a idéia da Escola Austríaca de que à medida que a taxa de juros cai em conseqüência da abstenção de consumo presente em favor do futuro, a tecnologia deve em algum sentido se tornar mais 'indireta', mais 'mecanizada', e 'mais produtiva'. Ah, também leva em conta a questão da lei dos rendimentos decrescentes.

O aumento da taxa de poupança/investimento também aumenta o produto, mas não implica aumento da taxa de crescimento da renda per capita em estado estacionário, mas apenas na fase de transição (isto é, a acumulação de capital não afeta a taxa permanente de crescimento).

No modelo de Solow, o crescimento produto no longo prazo microeconômico (que dura aproximadamente 50 anos ou mais) depende tão somente da taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho (= taxa de crescimento da produtividade média do trabalho - taxa de crescimento da força-de-trabalho). E supondo que o crescimento da força-de-trabalho seja exógena e que caminha junto com o crescimento da população, o crescimento do PIB per capita depende da evolução do progresso tecnológico E NADA MAIS. Nas variantes de Solow, o aumento da taxa de investimento/poupança consegue "vencer" parcialmente a lei dos rendimentos marginais decrescentes, mas ainda assim, a acumulação de capital físico não consegue ter um papel relevante.

Porque se por acaso a taxa de crescimento do estoque de capital estiver crescendo mais rapidamente que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra, isso não afeta o crescimento do produto no longo prazo? Há produtividade marginal decrescente em ambos os fatores (capital e trabalho). Se os fatores de produção crescem a taxas diferentes, o PIB real cresce a uma taxa média ponderada dos dois fatores; portanto, o produto cresce menos que o fator que cresce mais depressa (cuja taxa de crescimento é mais elevada); então, o fator que cresce mais depressa apresenta produtividade marginal decrescente. A taxa de crescimento do estoque de capital adapta-se a qualquer taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho. A velocidade do crescimento do estoque de capital é determinada pela velocidade de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra.

Suponha por exemplo que inicialmente (fase dinâmica de transição) a taxa de crescimento do estoque de capital seja maior que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra. Quanto maior a taxa de investimento/poupança, maior a oferta de capital, portanto mais abundante e barato ele se torna, tendendo a gerar incentivos para que os capitalistas usem técnicas de produção mais intensivas em capital e, portanto, tendendo a aumentar o desemprego da força-de-trabalho. Isso resulta que: o trabalho se torna relativamente abundante em relação ao estoque de capital; portanto, o trabalho se torna relativamente mais barato que o capital em relação à situação anterior; ou seja, o salário real tende a cair. Assim, o próprio sistema de preços, portanto, através da queda do salário real, sinaliza aos empresários que se tornou mais lucrativo: a) utilizar técnicas de produção mais intensivas em trabalho e menos intensivas em capital em todas as linhas de produção da economia; b) aumentar a produção de bens que utilizam técnicas de produção relativamente mais intensivas em trabalho e diminuir a dos que utilizam técnicas relativamente mais intensivas em capital.

No modelo de Solow, ocorre o fenômeno de retornos constantes de escala: se multiplico a quantidade de ambos os fatores de produção (capital e trabalho) por x, a quantidade disponível do produto final Q (PIB real) também é multiplicado por x. No modelo de crescimento que aqui discuti, o sistema de preços (via flexibilidade dos preços dos fatores e o mecanismo neoclássico de substituição de capital e trabalho) GARANTE que as taxas de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra e a taxa de crescimento de estoque de capital se igualam no longo prazo.

user f.k.a. Cabeção escreveu:

O primeiro problema aqui presente e o da medicao dessas quantidades. Podemos dizer que tres bananas representam uma riqueza maior do que duas bananas, caso a qualidade delas seja aproximadamente igual. Mas o que dizer de bananas de qualidade de diferentes, ou de macas? Como podemos dizer que houve crescimento, decrescimetno ou estabilidade, se a nossa economia produzia, na data N, 20 bananas e 30 macas de qualidade media, e passou a produzir, na data N+1, 25 bananas de qualidade inferior e 15 macas de qualidade superior?


O que se mede é o PIB real, não o PIB nominal. O aumento da renda nacional não inclui o aumento do nível geral de preços. É por isso que existem os números-índice: http://en.wikipedia.org/wiki/Price_index . O nível de preços relativos é uma questão que depende conjuntamente do custo de produção e da utilidade atribuída aos bens pelos demandantes. O nível de preços relativos define o valor de troca que os bens têm uns sobre os outros. Se uma maçã vale duas vezes mais que uma banana, isso aconteceu porque os ofertantes e demandantes de ambos os bens definiram isso. Não há outro modo de calcular riqueza que não seja desta maneira. Em economia, trabalha-se com aproximações e abstrações. O mesmo vale para a confecção de mapas. Não há como ser diferente, pois, de outra forma, para que teríamos mapas?

user f.k.a. Cabeção escreveu:
O uso de quantificadores monetarios sofre do mesmo problema. A moeda e apenas uma mercadoria que e facil de ser trocada, gracas das propriedades particulares que a determinam. Os precos em moeda sao as razoes pelas quais quantidades definidas de moedas sao trocadas por quantidades definidas de bens de uma determinada quantidade. O uso da moeda para quantificar o crescimento e absurdo, pois, na medida em que seja fixada a quantidade de moeda, e a quantidade dos demais bens seja multiplicada por 2, temos evidentemente um crescimento economico que fez dobrar a economia (se negligenciarmos os servicos industriais prestados pela propria moeda, como por exemplo, o uso do ouro para fabricacao de bens). Contudo, a soma dos precos em moeda de todos os bens permanece fixa, a diferenca e que os precos das quantidades fixas de bens diminuiram.


Esse raciocínio que você colocou não é válido num mundo onde exista equilíbrio geral walrasiano, como é o caso do modelo de Solow e suas variantes.

Se um governo tentasse manter o estoque nominal de moeda constante diante de um contexto de veloz crescimento do produto potencial, a demanda agregada e o nível geral de preços iriam cair de forma absurda. No longo prazo, um nível de produção efetiva abaixo do nível potencial significa um excesso de oferta de mão-de-obra no mercado de trabalho. Isso faz diminuir o salário nominal de equilíbrio. A diminuição da massa salarial faria diminuir a demanda transacional por moeda, e como a oferta de moeda é tida como dada, o estoque REAL de moeda - estoque nominal de moeda dividido pelo nível geral de preços - aumentaria. Esse fato traria como conseqüência a diminuição da taxa de juros real. Isso aumentaria o investimento, a demanda agregada, a produção, o nível de emprego (com efeito multiplicador, etc.) até que a produto efetivo se iguale ao produto potencial. Em equilíbrio geral, o sistema de preços sempre garante que, no longo prazo, o nível de produto efetivo atinja o nível de produto potencial SEM DEFLAÇÃO.


user f.k.a. Cabeção escreveu:
Contudo, se a quantidade de moeda for multiplicada por um fator de 2, e a quantidade de outros bens por um fator de 1/2, teremos que a economia encolheu pela metade (negligenciando novamente os servicos industriais da quantidade adicional de moeda), mas ainda assim a soma dos precos em moeda da quantidade total de bens cresceu.


Idem ao caso anterior. Se o governo dobrasse o estoque nominal de moeda, ele geraria uma baita inflação, levando a um AUMENTO na taxa real de juros, gerando uma recessão que abortaria o processo de duplicação de preços pretendido. Você está partindo do pressuposto totalmente errado que o equilíbrio no mercado de bens e serviços e o equilíbrio no mercado monetário NÃO SÃO interdependentes.

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Nada do que esta escrito acima necessita de comprovacao empirica. Sao enunciados completamente racionais que derivam de leis basicas da economia, e das definicoes empregadas para os termos.

Quando um economista ou estatistico examina esses precos, e os soma e traca medias sem levar em consideracao os fatos acima ele simplesmente esta triturando dados desprovidos de conteudo. Nao ha analise, ha apenas consideracoes especulativas a cerca de dados parciais mal compreendidos.


Realmente necessita de comprovação empírica é a sua afirmação de que o equilíbrio no mercado de bens e serviços e o equilíbrio no mercado monetário NÃO SÃO interdependentes.
Editado pela última vez por Huxley em 02 Ago 2008, 21:06, em um total de 1 vez.
“A boa sociedade é aquela em que o número de oportunidades de qualquer pessoa aleatoriamente escolhida tenha probabilidade de ser a maior possível”

Friedrich Hayek. “Direito, legislação e liberdade” (volume II, p.156, 1985, Editora Visão)

"Os homens práticos, que se julgam tão independentes em seu pensar, são todos na verdade escravos das idéias de algum economista morto."

John Maynard Keynes

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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Huxley escreveu:Cabeção,

80% das discussões sobre crescimento de longo prazo envolvem a teoria neoclássica de crescimento de Solow (1956) e suas variantes (Lucas, Romer, Grossman & Helpman).

Essa teoria leva em conta a função de produção de Cobb-Douglas e nela está incluída a idéia da Escola Austríaca de que à medida que a taxa de juros cai em conseqüência da abstenção de consumo presente em favor do futuro, a tecnologia deve em algum sentido se tornar mais 'indireta', mais 'mecanizada', e 'mais produtiva'. Ah, também leva em conta a questão da lei dos rendimentos decrescentes.

O aumento da taxa de poupança/investimento também aumenta o produto, mas não implica aumento da taxa de crescimento da renda per capita em estado estacionário, mas apenas na fase de transição (isto é, a acumulação de capital não afeta a taxa permanente de crescimento).

No modelo de Solow, o crescimento produto per capita no longo prazo microeconômico (que dura aproximadamente 50 anos ou mais) depende tão somente da taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho (= taxa de crescimento da produtividade média do trabalho - taxa de crescimento da força-de-trabalho). E supondo que o crescimento da força-de-trabalho seja exógena e que caminha junto com o crescimento da população, o crescimento do PIB per capita depende da evolução do progresso tecnológico E NADA MAIS. Nas variantes de Solow, o aumento da taxa de investimento/poupança consegue "vencer" parcialmente a lei dos rendimentos marginais decrescentes, mas ainda assim, a acumulação de capital físico não consegue ter um papel relevante.

Porque se por acaso a taxa de crescimento do estoque de capital estiver crescendo mais rapidamente que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra, isso não afeta o crescimento do produto no longo prazo? Há produtividade marginal decrescente em ambos os fatores (capital e trabalho). Se os fatores de produção crescem a taxas diferentes, o PIB real cresce a uma taxa média ponderada dos dois fatores; portanto, o produto cresce menos que o fator que cresce mais depressa (cuja taxa de crescimento é mais elevada); então, o fator que cresce mais depressa apresenta produtividade marginal decrescente. A taxa de crescimento do estoque de capital adapta-se a qualquer taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho. A velocidade do crescimento do estoque de capital é determinada pela velocidade de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra.

Suponha por exemplo que inicialmente (fase dinâmica de transição) a taxa de crescimento do estoque de capital seja maior que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra. Quanto maior a taxa de investimento/poupança, maior a oferta de capital, portanto mais abundante e barato ele se torna, tendendo a gerar incentivos para que os capitalistas usem técnicas de produção mais intensivas em capital e, portanto, tendendo a aumentar o desemprego da força-de-trabalho. Isso resulta que: o trabalho se torna relativamente abundante em relação ao estoque de capital; portanto, o trabalho se torna relativamente mais barato que o capital em relação à situação anterior; ou seja, o salário real tende a cair. Assim, o próprio sistema de preços, portanto, através da queda do salário real, sinaliza aos empresários que se tornou mais lucrativo: a) utilizar técnicas de produção mais intensivas em trabalho e menos intensivas em capital em todas as linhas de produção da economia; b) aumentar a produção de bens que utilizam técnicas de produção relativamente mais intensivas em trabalho e diminuir a dos que utilizam técnicas relativamente mais intensivas em capital.

No modelo de Solow, ocorre o fenômeno de retornos constantes de escala: se multiplico a quantidade de ambos os fatores de produção (capital e trabalho) por x, a quantidade disponível do produto final Q (PIB real) também é multiplicado por x. No modelo de crescimento que aqui discuti, o sistema de preços (via flexibilidade dos preços dos fatores e o mecanismo neoclássico de substituição de capital e trabalho) GARANTE que as taxas de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra e a taxa de crescimento de estoque de capital se igualam no longo prazo.




Huxley escreveu:O que se mede é o PIB real, não o PIB nominal. O aumento da renda nacional não inclui o aumento do nível geral de preços. É por isso que existem os números-índice: http://en.wikipedia.org/wiki/Price_index . O nível de preços relativos é uma questão que depende conjuntamente do custo de produção e da utilidade atribuída aos bens pelos demandantes. O nível de preços relativos define o valor de troca que os bens têm uns sobre os outros. Se uma maçã vale duas vezes mais que uma banana, isso aconteceu porque os ofertantes e demandantes de ambos os bens definiram isso. Não há outro modo de calcular riqueza que não seja desta maneira. Em economia, trabalha-se com aproximações e abstrações. O mesmo vale para a confecção de mapas. Não há como ser diferente, pois, de outra forma, para que teríamos mapas?



A nocao de que a producao depende de dois fatores, capital e trabalho, e que a relacao dessas duas quantidades com a producao e homogenea nao e nenhuma novidade para mim. Explicarei brevemente porque ela e adotada como uma aproximacao num primeiro momento, quais sao as hipoteses que fazem os economistas extrairem a funcao de Cobb-Douglas dessa condicao, e quais sao os problemas dessas hipoteses.

Por homogenea, entende-se toda a funcao que leva um vetor x em um numero f(x), e que obedeca a relacao f(a*x)= a*f(x).

Por que os economistas pensam entao que a funcao de producao e homogenea? Na relacao entre producao, capital e trabalho, o raciocinio e este: se um indio possui uma vara de pescar e consegue pescar dez peixes por dia, dois indios identicos com duas varas de pescar identicas conseguirao pescar vinte peixes por dia (se considerarmos despreziveis as acoes desses indios sobre as reservas totais de peixe do riacho). Ao dobrar o trabalho desempenhado pelo indio, e o capital empregado para a realizacao desse trabalho (as varas de pescar), dobra-se o produto (peixes). Ou numa formulacao "mais matematica", P(2K,2L)=2P(K,L), onde K e uma quantidade de capital fisico, L e uma quantidade de trabalho e P(K,L) e o produto realizado. Desse modo, se fizer algum sentido contabilizar trabalho, capital e producao, como nesse caso dos indios, fara sentido supor que ha homogeneidade da producao em relacao as quantidades de capital e trabalho contabilizadas.

Um resultado elementar de calculo diferencial consiste em demonstrar que todas as funcoes homogeneas e diferenciaveis de duas variaveis, supostas crescentes em relacao a cada uma delas, sao da forma P(K,L)=A*(K^p)*(L^(1-p)), onde p e um numero entre 0 e 1, e A e uma constante positiva arbitraria. Como estamos discutindo economia e nao matematica, deixarei essa demonstracao como exercicio para quem tiver algum interesse nesse aspecto.

Alguns economistas ansiosos por modelizar a economia com o auxilio de objetos matematicos simples apressaram-se em supor, a titutlo aproximativo, as hipoteses necessarias para que pudessem falar de producao em termos de funcao de Cobb-Douglas. Ou seja, supuseram que existe uma relacao contabil precisamente mensuravel entre capital, trabalho e produto, fazendo sentido falar em "dobro de capital", "dobro de trabalho" e "dobro de produto", assim como supuseram a regularidade (diferenciabilidade) da funcao de producao homogenea que determiaria a relacao dessas quantidades. Apresentarei aqui alguns argumentos de porque essas suposicoes sao questionaveis.

Primeiro, analisaremos a hipotese da regularidade propriamente dita. Para isso, faremos uso de um exemplo interessante, que pode ser ilustrado com a analogia dos indios e varas de pescar anteriormente empregadas. Suponhamos que nossa economia consista em um indio que trabalha para sustentar sua familia pescando com sua vara de pescar. Como anteriormente, o indio (trabalho) mais a sua vara de pescar (capital) produzem por dia dez peixes, que eles usam para alimentar-se e para trocar com outras familias de indegenas envolvidas em atividades diferentes.

Como vimos antes, dada a homogeneidade da producao, e suposta (a titulo de aproximacao) a regularidade, o indio usa a funcao de Cobb-Douglas para modelizar sua economia. Assim, suponhamos que o nosso amigo indio encontre uma vara de pescar identica a sua, abandonada na beira do riacho. Nosso indio neoclassico logo fica feliz, pois sabe que ao dobrar o seu capital, estara multiplicando sua producao por um fator de 2^p, e como p e positivo (e menor do que 1), ele sabe que isso significara uma expansao na producao de peixes de um fator maior que um, ou seja, um crescimento. Contudo, o pobre indio logo se decepciona ao perceber que nada mudou de verdade: ao se ver incapaz de se servir de duas varas de pescar simultaneamente, percebe que o capital adicional que agora possui nao representa qualquer diferenca na producao de peixes que e capaz.

Contudo, o indio nao se deixa abalar e ensina seu filho mais velho a pescar, para que este possa se servir. Para ter tempo e condicoes fisicas de ensina-lo a pescar, o indio precisa reduzir a sua produtividade diaria de peixes em 3 unidades. Como veremos mais tarde, pode-se dizer nesse caso entao que esta havendo uma poupanca de capital humano (trabalho), destinada ao aumento da producao futura representada pela capacitacao de uma mao de obra a fim de operar um certo tipo de capital (a vara adicional nao utilizada).

Apos alguns dias de restricao de consumo a 7 peixes por dia, o garoto finalmente aprende a pescar e rapidamente desenvolve sua habilidade ate equiparar-se ao seu pai. A producao da familia, apos o periodo de poupanca e reducao do consumo, atinge os vinte peixes diarios e todos estao felizes. A familia de indigenas ao fazer isso sacrificou os beneficios de uma parte do consumo no presente por um consumo ainda maior no futuro. A epoca de prosperidade segue ate que um dia, o filho da familia se envolve numa briga com um indio de outra tribo, e acaba quebrando sua vara de pescar na peleja. A vara se torna inutil, nao podendo ser consertada.

O pai fica furioso, mas tranquiliza-se pensando novamente na funcao de Cobb-Douglas: a capacitacao de uma forca de trabalho dobrada, num dado estado de conhecimento tecnologico e estoque de capital, rende necessariamente uma producao aproximadamente 2*(1-p) maior, e como p e menor do que 1, temos entao crescimento. Ou seja, ainda que os vinte peixes nao sejam mais possiveis devido a destruicao de parte do estoque de capital, a maior mobilizacao de mao-de-obra sera suficiente para que haja um significativo aumento de producao em relacao aos dez peixes diarios correspondentes ao trabalho de um indio equipado com uma vara.

Ledo engano. O seu filho, desprovido de vara de pescar, mal consegue capiturar um peixe por dia, mergulhando no riacho e tentando apanha-los com a mao. Sem fazer uso da vara de pescar, a contribuicao de seu trabalho para producao e praticamente nula, e a familia se ve de volta a realidade de escassez de 10 peixes diarios.

E o indio revoltado joga na fogueira todos os livros de economia de crescimento que comprou do homem branco por valiosos 8 peixes.

Esse exemplo ilustra bem um fenomeno conhecido em economia como complementaridade de fatores de producao. No que diz respeito a producao de peixes, a vara de pescar e inutil sem o indio que saiba usa-la, o indio e inutil sem a vara de pescar utilizavel. A regularidade da funcao de Cobb-Douglas consiste exatamente em negar (ou negligenciar a titulo aproximativo) essa que e uma caracteristica fundamental de praticamente todas as atividades produtivas que empregam capital fisico e humano simultaneamente. A capacidade de rendimentos de um estoque de capital em relacao a mao de obra pode se encontrar esgotada, ou proxima do esgotamento, de modo que aumentos adicionais na mao de obra nao trarao ganhos significativos de producao, e vice-versa. Alias, essa situacao de quase esgotamento e perfeitamente razoavel com a realidade, pois dentro da nocao de que os recursos sao escassos, de nada adianta ao indio manter um estoque de varias varas de pescar para servir seus filhos se estes nao existem em numero suficiente para dar uso a cada uma dessas varas. A racionalidade no emprego de recursos escassos faz com que a capacidade extraida de cada um deles seja proxima do maximo, de modo a evitar desperdicios. E claro que podem existir contra-exemplos, mas estes sao casos excepcionais derivados de calculos mal feitos ou destruicao de parte consideravel de um dos estoques complementares, onde ou o capital foi excessivamente ampliada, ou fluxos migratorios e crescimento vegetativo aumentaram excessivamente o numero de habitantes de uma regiao, ou guerras e pragas destruiram partes da populacao e do capital de forma nao proporcional. Supor que esse seja um estado normal da economia equivale a supor que as pessoas nao empregam racionalmente recursos escassos, ou seja, a negar o pressuposto basico da ciencia economica.

Ate aqui examinados os problemas da hipotese da regularidade dentro de um contexto de possibilidade contabil de fatores e homogeneidade da producao, mas a propria nocao de contabilidade dos fatores e a homogeneidade da producao sao questoes que merecem um exame mais cuidadoso.

E bem verdade que quando pensamos em termos de indios pescadores ou de centrais de energia eletrica, e bem verdade que o dobro de capital fisico mais o dobro de capital humano, supondo equivalencia nas qualidades de ambos, significarao o dobro de peixes ou de energia eletrica (negligenciando novamente os efeitos que os indios tem nas reservas de peixe e que o consumo de uma usina adicional teria no custo dos fatores de producao que emprega).

Mas o mundo real e um mundo um pouco mais complicado.

A mao-de-obra, tanto quanto o capital, nao possuem um carater equivalente. Nem mesmo aproximadamente. Um empregado pode ser indolente ou dedicado, capacitado em uma determinada especialidade ou incompetente na sua execucao. Uma porcao terra pode ser, para uma determinada cultura, fertil ou improdutiva, assim como pode estar proxima ou distante dos mercados consumidores. O mesmo vale para instalacoes industriais, que podem ser adequadas para um tipo de producao, mas parcial ou completamente inconversiveis para outros tipos e escalas de producao. Os meios disponiveis para ampliar a producao dos produtos demandados sao escassos e diferenciados, e o mecanismo de precos de mercado permite aos empresarios empregar tais meios de maneira a melhor satisfazer os interesses manifestados pelos consumidores, produzindo bens de consumo, ou bens de producao de segunda, terceira, ou n-esima ordem.

Imaginemos que devido a um crescimento rapido da demanda, o preco da batata esteja alto, de modo que mais investidores sintam-se tentados comprar mais terras, mais equipamentos e contratar mais mao-de-obra para ampliar a producao de batatas. Assim, um economista de crescimento neoclassico rapidamente se apressaria em dizer que os aportes de capital humano e fisico traduzirao-se em crescimentos proporcionais de producao.

Mas esses investidores logo se deparam com a dura realidade da escassez dos fatores. As boas terras para o plantio de batatas encontram-se ja empregadas para plantar batatas por outros investidores, a mao-de-obra e equipamentos especializados tambem. Para retira-los de seus respectivos postos eles terao de oferecer salarios mais altos e precos maiores do que os que vem sendo praticados no mercado, mas os seus atuais patroes e proprietarios, cientes da demanda latente de novos investidores, ja ajustaram esses valores, de modo que adiquiri-los nao e necessariamente vantajoso. Para entrar no mercado ou para expandir sua producao, os investidores deverao empregar terras, equipamentos e mao-de-obra que nesse exato momento estavam alocados em outras cadeias de producao, para as quais seriam mais apropriados do que para a producao de batatas. A rentabilidade esperada desses novos recursos nao sera identica a dos recursos ja empregados, mas significativamente menor.

Contudo, os custos desses novos recursos nao sao proporcionalmente menores em relacao a perda de sua produtividade para a producao de batatas. Eles sao determinados pela rentabilidade que teriam se fossem empregados em outras atividades economicas, ou seja, pelos precos e salarios estabelecidos pelos seus antigos proprietarios e patroes em funcao dos fins economicos que davam para eles. Ou seja, embora a renda que os investidores almejam ter com a expansao sejam afetadas pela diminuicao da capacitacao da mao-de-obra e capital recem adquiridos, os custos nao sao, pois sao determinados pela rentabilidade marginal (dada por todos os demais projetos economicos imaginaveis) desses recursos.

Alem disso, a expansao da producao de batatas tem por efeito aplacar o excesso de demanda, traduzindo-se numa baixa de precos, sendo esse mecanismo claramente conhecido por todos, e um dos mais basicos da economia.

Logo, se a contabilidade de capital e recursos humanos for realizada em termos de custos, ve-se que a expansao daquela producao, em quantias proporcionais, nao traz uma rentabilidade proporcional, mas necessariamente menor, considerando estaveis o estado de conhecimento tecnologico vigente e as rentabilidades dos demais projetos economicos. A quantidade e qualidade do trabalho e rendimentos da mao-de-obra contratada e capital mobilizado sao inferiores, pois foram adquiridos de outros setores ou do desemprego, embora seus custos sejam estabelecidos por outros fatores que nao sua produtividade em termos de batatas. A realidade de escassez de recursos refuta portanto a hipotese aproximativa de homogeneidade da producao, dentro do unico criterio possivel de contabilidade de recursos para efeitos de calculo economico, que e o da contabilidade monetaria.

Sobre a evolucao tecnologica e o progresso do conhecimento como exogenos a atividade produtiva, temos uma afirmativa muito pouco sustentavel. Pesquisa e desenvolvimento, sejam eles de carater basico e fundamental, ou plenamente aplicavel em metodos de producao de bens consumiveis, consomem muitos recursos fisicos e humanos. Muitos individuos capacitados, equipamentos sofisticados, insumos caros, terras bem localizadas precisam ser formados, fabricados, ou retirados da producao de bens de consumo para que a pesquisa possa se realizar.

A pesquisa, quando realizada apenas para satisfazer o interesse humano em descobrir os segredos da natureza, sem qualquer investimento preocupado em aumentar a disponibilidade de bens de consumo e recursos de capital no futuro, pode ser considerada como consumo. E o ser humano usando recursos disponiveis para satisfazer uma de suas necessidades na sua escala de valores. Quando a pesquisa e feita no sentido de aumentar a producao e consumo futuros, trata-se de poupanca, ou seja, da imobilizacao de recursos no presente visando a maior utilidade atribuida a uma producao maior de bens existentes ou latentes no futuro.

Existem descobertas cientificas de base que sao realizadas como consumo, motivadas pela curiosidade dos detentores de recursos, que mais tarde poderao ser empregadas em metodos de producao mais avancados e que aumentem a producao futura de bens e os padroes de consumo da humanidade. Os fenomenos do eletromagnetismo por exemplo, foram descobertos dessa maneira. Embora esses acidentes estejam ligados diretamente com a escalada do progresso material da humanidade, eles nao devem ser considerados como objetivos do homem ao empregar seus recursos escassos. Ninguem descobriu a eletricidade para que cem ou duzentos anos depois as pessoas pudessem ouvir radio e assistir televisao. A eletrecidade foi descoberta pelo interesse de cientistas em estuda-la, pela curiosidade que motivou o consumo de tempo e recursos para compreende-la, e apenas mais tarde outras pessoas perceberam que poderiam explora-la em niveis economicos superiores. Ou seja, o que antes era um bem de consumo, que divertia as pessoas com os seus fenomenos bizarros e anti-intuitivos, passou a ser empregado como bem de producao para outros bens de consumo que faziam o uso desses fenomenos.

De qualquer modo, tanto para a descoberta motivada pela curiosidade e consumo, quanto para a descoberta motivada pelo interesse em aumentar a producao e consumo futuros, existe o fato de que elas nao seriam possiveis ou identicas se as condicoes de producao fossem diferentes daquelas que permitiram os recursos caros utilizados na sua realizacao.

A ideia, de origens hegelianas e marxistas, de um progesso continuo e inabalavel da humanidade, independente das acoes e consideracoes dos individuos e das formas que escolhem para alocar sua producao, e completamente falsa e nao passa de pensamento mistico. Nao existem forcas ou fluxos historicos que aumentam sistematicamente o conteudo de conhecimentos humanos. O que existe sao seres humanos abrindo mao de outras formas de consumo e poupanca para investirem no aumento de seu conhecimento, motivados ou pela simples satisfacao trazida pela melhor compreensao dos problemas que os atormentam e dos fenomenos que os interessam, ou por ampliar sua capacidade de produzir outros bens que queiram consumir. Se ninguem investisse tempo e recursos humanos e fisicos na descoberta cientifica, essa nao se produziria automaticamente como lei historica.

Essa poupanca ou consumo nao tem qualquer relacao necessariamente estabelecida com o Estado. Os individuos podem faze-la tanto atraves de decisoes voluntarias no mercado, quanto podem ser coagidos a realiza-las pelo governo, que atraves de seus burocratas escolhera as quantidades e qualidades desses investimentos e consumos de recursos no mercado intelectual. Nada disso muda o fato de que o progresso tecnologico da humanidade so pode vir da mobilizacao de recursos para o futuro atraves de poupanca.

Qualquer hipotese adicional que escape dessas consideracoes e na verdade uma manifestacao disfarcada do misticismo marxista que atribuia o avanco ideologico e tecnologico as forcas irresistiveis do progresso historico, cuja acao se daria independentemente de circuntancias tais como a realidade dos recursos disponiveis e as valoracoes dos individuos que decidem como emprega-los.

Alem disso, existe o problema de que mesmo quando novos metodos sao desenvolvidos, para implanta-los na cadeia de producao e necessaria a poupanca de recursos necessarios para bancar o custo de sua fabricacao e da substituicao do capital parcialmente conversivel que pode ser adaptado, assim como os rendimentos do capital inconversivel que seria abandonado ou transformado em sucata. Assim, mesmo que novos e mais modernos metodos estejam disponiveis para a realizacao de uma producao mais barata, eficiente e de qualidade, pode ser que a valoracao atual dos individuos nao atribua tanta importancia as contribuicoes desses metodos, e preferiam gastar ou aplicar os recursos necessarios para realizar essa conversao em outras cadeias de producao mais atraentes.

No mais, negar que a acumulacao de capital per capta nao tem sido um fator relevante no crescimento economico e olhar pela janela do seu apartamento localizado no 17 andar de um edificio, ver os postes da rede eletrica, os automoveis nas auto-estradas, em meio a outros predios, arranha-ceus e pontes, fabricas e estradas de ferro, centros de lazer, escolas e universidades e afirmar que nada do que se esta vendo existe ou e relevante, pois trata-se tao somente de capital fisico acumulado que nao estava disponivel na epoca em que os homens habitavam cavernas e comiam carne crua. E simplesmente um grande esforco de negacao da realidade.

Sobre as taxas de crescimento populacional exogenas, essa tambem e outra falacia grotesca. Voltemos ao exemplo do nosso indio. Com o seu trabalho que lhe rende 10 peixes por dia, ele alimenta e compra recursos necessarios para a sobrevivencia da sua pequena familia, formada por ele, sua esposa, um filho mais velho, um filho mais novo, e uma menina cacula. Se mais uma crianca nascer antes do filho mais velho ser capaz de produzir, ela tera dificuldades para sobreviver pois a producao nao conseguiria suprir adequadamente as necessidades adicionais geradas pela sua existencia improdutiva de crianca. Caso sobreviva em meio a precariedade, seu consumo adicional trara dificuldades suplementares para a acumulacao de poupanca do velho indio, que nao podera guardar o suficiente para comprar uma vara de pescar para seu filho mais velho ou reduzir seu tempo de trabalho para dedicar-se a ensina-lo as tecnicas e artes de seu oficio corretamente.

Somente essas consideracoes simples ja mostram o quanto a taxa de crescimento populacional afeta a producao e acumulacao de capital. Mas pode-se alegar que elas sao derivadas da ma compreensao introduzida pelo fato de que a economia representada pelo indio e sua familia trata-se de uma precaria situacao de subisistencia, onde o impacto da populacao adicional sobre o consumo e significativo, algo que nao seria verdadeiro nas sociedades altamente produtivas do capitalismo moderno. Nessas economias, o excedente de producao seria tao grande que permitiria a sobrevida de praticamente todos os nascentes, sendo as taxas de mortalidade ligadas a fatores que nao sao diretamente afetados pela producao e consumo atuais, como doencas congenitas e geneticas ou acidentes na gestacao, parto ou primeira infancia. A taxa de crescimento vegetativo passaria entao a ser uma escolha das familias, que dentro de seus planejamentos particulares para os perfis de consumo e investimentos futuros, assim como outros aspectos de ordem de preferencia pessoais (tais como gostar ou nao de criancas, ou os efeitos e custos sociais de se ter uma familia numerosa), definiram em cada cultura o numero de filhos por casal.

Esse argumento de ordem psicologica pode ate ter alguma validade dentro de determinadas culturas e valores de certas epocas. Mas nada em si contem de fundamental para que possamos considerar, com certeza absoluta, que um nivel de crescimento vegetativo, abaixo do biologicamente admissivel pelo tempo de gestacao das femeas humanas, devera limitar o crescimento vegetativo das populacoes em situacoes de abundancia de recursos. E evidente que pessoas nao sao bacterias, mas nada a priori impediria uma cultura de valorizar extremamente familias numerosas, de modo que varios individuos se empenhassem em ter quantos filhos pudessem, se os niveis de producao fossem altos o suficiente para que as taxas de crescimento vegetativos maximais (biologicamente falando) nao prejudicassem o acumulo de capital.

Mas o mais importante e que e seguidamente desconsiderado e o fator imigracao. Economias em crescimento e com alta producao e consumo por individuo atraem pessoas de economias onde os niveis de vida sem considerados piores, pelas pessoas que migram. Se nenhuma barreira for estabelecida impedindo esses movimentos migratorios, aumentarao e diminuirao as taxas de crescimento populacional nas diferentes economias segundo os sucessos de e fracassos de suas economias. Nao ha a menor razao para se raciocinar em termos de Estados-nacoes nesse caso, esse e exatamente o caso onde barreiras sao estabelecidas para impedir total ou parcialmente esse fluxo. Se considerarmos os perfis de crescimento das cidades em virtude da industrializacao, que produziram o exodo rural dentro dos proprios paises, teremos uma clara evidencia de que o crescimento e desaparecimento da populacao em determinadas localidades estaria muito mais ligado a fatores economicos do que a escolhas de familias sobre taxas de natalidade.

Alias, o pensamento em Estado-nacoes como agentes economicos de importancia relevante e um dos fatores que mais obscurece o raciocinio e leva as conclusoes mais absurdas. Isso porque essas entidades sao justamente compostas de instituicoes cujo objetivo e restringir certas liberdades dos individuos de decidir como devem governar suas vidas. Se queremos raciocinar corretamente em termos de economia, devemos pensar em Estados-nacoes nao como agentes economicos, mas como dificuldades suplementares que os verdadeiros agentes economicos precisam considerar e superar nas alocacoes que pretendem dar a seus recursos.

O fato da taxa de crescimento vegetativo dos EUA, por exemplo, ser relativamente dissociada de seu desempenho economico nas ultimas decadas diz respeito apenas as politicas vigentes que impedem fluxos migratorios, e nao a qualquer natureza exogena do crescimento relativo a producao. Se os fluxos migratorios forem analisados dentro da America, onde essas barreiras inexistem ou sao menos intensas, ou em outras epocas em que a imigracao era menos combatida, as conclusoes obtidas serao consideravelmente diferentes.



Essas sao apenas algumas consideracoes que tornam a teoria que voce divulga inadequada para fornecer uma explicacao geral para o crescimento economico. As consideracoes e suposicoes feitas que permitiriam os teoremas derivados sao extremamente restritivas, quando nao sao de todo inadequadas, de modo que a teoria resultante de seu exame serve no maximo para uma descricao impropria de alguns casos particulares atraves da analise de dados que revelam realidades dos problemas apenas de um modo extremamente parcial. Podem servir de aproximacoes para situacoes posteriores a uma guerra, ou para condicoes especificas de restricoes institucionais impostas pelos Estados Nacoes, mas na medida em que nao se apresentem como tais, e nao assumam que estao assumindo uma serie de condicoes historicas como pressuposicoes, serao teorias economicas erradas, que levarao finalmente a conclusoes erradas.

O que existe aqui e um problema grave de natureza epistemologica. Ao criarmos objetos e construcoes mentais para melhor estudar uma determinada ciencia, propondo teorias para o comportamento desses objetos e construcoes, devemos ter sempre a preocupacao de bem estabelecer a relacao guardada entre essas construcoes de nossas mentes e os fenomenos reais e categorias fundamentais que nossa ciencia pretendia estudar a priori, assim como procurar estabelecer as limitacoes que os nossos conceitos impoem a amplitude de nossos raciocinios.

Ao estudar economia, deve-se antes de mais nada reconhecer que os unicos agentes economicos sao os individuos. Eles podem organizar-se em diferentes tipos de empreendimentos cooperativos, como empresas, sindicatos ou Estados-nacoes, mas permanece o fato basico de que individuos e apenas eles decidem e escolhem, preferem e preterem, agem ou nao agem.

Assim, ao criarmos conceitos coletivos abstratos para efeitos de estudo, tais como classes de individuos, tipos de capital e etc; deve-se haver uma preocupacao em se saber como devemos coletar e interpretar dados sobre esses coletivos de modo que eles nos digam algo sobre os verdadeiros agentes da economia, e como os modelos teoricos que criamos explicando o seu comportamento podem nos ajudar a decifrar os problemas ligados a realidade subjacente de individuos agentes, que possuem diferentes escalas de valores e preferencias, assim como respondem de formas diferentes aos incentivos produzidos pelas acoes dos demais individuos e condicoes da natureza que determinam a escassez dos recursos disponiveis.

Continua...
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

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Huxley escreveu:Cabeção,

80% das discussões sobre crescimento de longo prazo envolvem a teoria neoclássica de crescimento de Solow (1956) e suas variantes (Lucas, Romer, Grossman & Helpman).

Essa teoria leva em conta a função de produção de Cobb-Douglas e nela está incluída a idéia da Escola Austríaca de que à medida que a taxa de juros cai em conseqüência da abstenção de consumo presente em favor do futuro, a tecnologia deve em algum sentido se tornar mais 'indireta', mais 'mecanizada', e 'mais produtiva'. Ah, também leva em conta a questão da lei dos rendimentos decrescentes.

O aumento da taxa de poupança/investimento também aumenta o produto, mas não implica aumento da taxa de crescimento da renda per capita em estado estacionário, mas apenas na fase de transição (isto é, a acumulação de capital não afeta a taxa permanente de crescimento).

No modelo de Solow, o crescimento produto per capita no longo prazo microeconômico (que dura aproximadamente 50 anos ou mais) depende tão somente da taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho (= taxa de crescimento da produtividade média do trabalho - taxa de crescimento da força-de-trabalho). E supondo que o crescimento da força-de-trabalho seja exógena e que caminha junto com o crescimento da população, o crescimento do PIB per capita depende da evolução do progresso tecnológico E NADA MAIS. Nas variantes de Solow, o aumento da taxa de investimento/poupança consegue "vencer" parcialmente a lei dos rendimentos marginais decrescentes, mas ainda assim, a acumulação de capital físico não consegue ter um papel relevante.

Porque se por acaso a taxa de crescimento do estoque de capital estiver crescendo mais rapidamente que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra, isso não afeta o crescimento do produto no longo prazo? Há produtividade marginal decrescente em ambos os fatores (capital e trabalho). Se os fatores de produção crescem a taxas diferentes, o PIB real cresce a uma taxa média ponderada dos dois fatores; portanto, o produto cresce menos que o fator que cresce mais depressa (cuja taxa de crescimento é mais elevada); então, o fator que cresce mais depressa apresenta produtividade marginal decrescente. A taxa de crescimento do estoque de capital adapta-se a qualquer taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho. A velocidade do crescimento do estoque de capital é determinada pela velocidade de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra.

Suponha por exemplo que inicialmente (fase dinâmica de transição) a taxa de crescimento do estoque de capital seja maior que a taxa de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra. Quanto maior a taxa de investimento/poupança, maior a oferta de capital, portanto mais abundante e barato ele se torna, tendendo a gerar incentivos para que os capitalistas usem técnicas de produção mais intensivas em capital e, portanto, tendendo a aumentar o desemprego da força-de-trabalho. Isso resulta que: o trabalho se torna relativamente abundante em relação ao estoque de capital; portanto, o trabalho se torna relativamente mais barato que o capital em relação à situação anterior; ou seja, o salário real tende a cair. Assim, o próprio sistema de preços, portanto, através da queda do salário real, sinaliza aos empresários que se tornou mais lucrativo: a) utilizar técnicas de produção mais intensivas em trabalho e menos intensivas em capital em todas as linhas de produção da economia; b) aumentar a produção de bens que utilizam técnicas de produção relativamente mais intensivas em trabalho e diminuir a dos que utilizam técnicas relativamente mais intensivas em capital.

No modelo de Solow, ocorre o fenômeno de retornos constantes de escala: se multiplico a quantidade de ambos os fatores de produção (capital e trabalho) por x, a quantidade disponível do produto final Q (PIB real) também é multiplicado por x. No modelo de crescimento que aqui discuti, o sistema de preços (via flexibilidade dos preços dos fatores e o mecanismo neoclássico de substituição de capital e trabalho) GARANTE que as taxas de crescimento da disponibilidade de mão-de-obra e a taxa de crescimento de estoque de capital se igualam no longo prazo.




Huxley escreveu:O que se mede é o PIB real, não o PIB nominal. O aumento da renda nacional não inclui o aumento do nível geral de preços. É por isso que existem os números-índice: http://en.wikipedia.org/wiki/Price_index . O nível de preços relativos é uma questão que depende conjuntamente do custo de produção e da utilidade atribuída aos bens pelos demandantes. O nível de preços relativos define o valor de troca que os bens têm uns sobre os outros. Se uma maçã vale duas vezes mais que uma banana, isso aconteceu porque os ofertantes e demandantes de ambos os bens definiram isso. Não há outro modo de calcular riqueza que não seja desta maneira. Em economia, trabalha-se com aproximações e abstrações. O mesmo vale para a confecção de mapas. Não há como ser diferente, pois, de outra forma, para que teríamos mapas?



A nocao de que a producao depende de dois fatores, capital e trabalho, e que a relacao dessas duas quantidades com a producao e homogenea nao e nenhuma novidade para mim. Explicarei brevemente porque ela e adotada como uma aproximacao num primeiro momento, quais sao as hipoteses que fazem os economistas extrairem a funcao de Cobb-Douglas dessa condicao, e quais sao os problemas dessas hipoteses.

Por homogenea, entende-se toda a funcao que leva um vetor x em um numero f(x), e que obedeca a relacao f(a*x)= a*f(x).

Por que os economistas pensam entao que a funcao de producao e homogenea? Na relacao entre producao, capital e trabalho, o raciocinio e este: se um indio possui uma vara de pescar e consegue pescar dez peixes por dia, dois indios identicos com duas varas de pescar identicas conseguirao pescar vinte peixes por dia (se considerarmos despreziveis as acoes desses indios sobre as reservas totais de peixe do riacho). Ao dobrar o trabalho desempenhado pelo indio, e o capital empregado para a realizacao desse trabalho (as varas de pescar), dobra-se o produto (peixes). Ou numa formulacao "mais matematica", P(2K,2L)=2P(K,L), onde K e uma quantidade de capital fisico, L e uma quantidade de trabalho e P(K,L) e o produto realizado. Desse modo, se fizer algum sentido contabilizar trabalho, capital e producao, como nesse caso dos indios, fara sentido supor que ha homogeneidade da producao em relacao as quantidades de capital e trabalho contabilizadas.

Um resultado elementar de calculo diferencial consiste em demonstrar que todas as funcoes homogeneas e diferenciaveis de duas variaveis, supostas crescentes em relacao a cada uma delas, sao da forma P(K,L)=A*(K^p)*(L^(1-p)), onde p e um numero entre 0 e 1, e A e uma constante positiva arbitraria. Como estamos discutindo economia e nao matematica, deixarei essa demonstracao como exercicio para quem tiver algum interesse nesse aspecto.

Alguns economistas ansiosos por modelizar a economia com o auxilio de objetos matematicos simples apressaram-se em supor, a titutlo aproximativo, as hipoteses necessarias para que pudessem falar de producao em termos de funcao de Cobb-Douglas. Ou seja, supuseram que existe uma relacao contabil precisamente mensuravel entre capital, trabalho e produto, fazendo sentido falar em "dobro de capital", "dobro de trabalho" e "dobro de produto", assim como supuseram a regularidade (diferenciabilidade) da funcao de producao homogenea que determiaria a relacao dessas quantidades. Apresentarei aqui alguns argumentos de porque essas suposicoes sao questionaveis.

Primeiro, analisaremos a hipotese da regularidade propriamente dita. Para isso, faremos uso de um exemplo interessante, que pode ser ilustrado com a analogia dos indios e varas de pescar anteriormente empregadas. Suponhamos que nossa economia consista em um indio que trabalha para sustentar sua familia pescando com sua vara de pescar. Como anteriormente, o indio (trabalho) mais a sua vara de pescar (capital) produzem por dia dez peixes, que eles usam para alimentar-se e para trocar com outras familias de indegenas envolvidas em atividades diferentes.

Como vimos antes, dada a homogeneidade da producao, e suposta (a titulo de aproximacao) a regularidade, o indio usa a funcao de Cobb-Douglas para modelizar sua economia. Assim, suponhamos que o nosso amigo indio encontre uma vara de pescar identica a sua, abandonada na beira do riacho. Nosso indio neoclassico logo fica feliz, pois sabe que ao dobrar o seu capital, estara multiplicando sua producao por um fator de 2^p, e como p e positivo (e menor do que 1), ele sabe que isso significara uma expansao na producao de peixes de um fator maior que um, ou seja, um crescimento. Contudo, o pobre indio logo se decepciona ao perceber que nada mudou de verdade: ao se ver incapaz de se servir de duas varas de pescar simultaneamente, percebe que o capital adicional que agora possui nao representa qualquer diferenca na producao de peixes que e capaz.

Contudo, o indio nao se deixa abalar e ensina seu filho mais velho a pescar, para que este possa se servir. Para ter tempo e condicoes fisicas de ensina-lo a pescar, o indio precisa reduzir a sua produtividade diaria de peixes em 3 unidades. Como veremos mais tarde, pode-se dizer nesse caso entao que esta havendo uma poupanca de capital humano (trabalho), destinada ao aumento da producao futura representada pela capacitacao de uma mao de obra a fim de operar um certo tipo de capital (a vara adicional nao utilizada).

Apos alguns dias de restricao de consumo a 7 peixes por dia, o garoto finalmente aprende a pescar e rapidamente desenvolve sua habilidade ate equiparar-se ao seu pai. A producao da familia, apos o periodo de poupanca e reducao do consumo, atinge os vinte peixes diarios e todos estao felizes. A familia de indigenas ao fazer isso sacrificou os beneficios de uma parte do consumo no presente por um consumo ainda maior no futuro. A epoca de prosperidade segue ate que um dia, o filho da familia se envolve numa briga com um indio de outra tribo, e acaba quebrando sua vara de pescar na peleja. A vara se torna inutil, nao podendo ser consertada.

O pai fica furioso, mas tranquiliza-se pensando novamente na funcao de Cobb-Douglas: a capacitacao de uma forca de trabalho dobrada, num dado estado de conhecimento tecnologico e estoque de capital, rende necessariamente uma producao aproximadamente 2*(1-p) maior, e como p e menor do que 1, temos entao crescimento. Ou seja, ainda que os vinte peixes nao sejam mais possiveis devido a destruicao de parte do estoque de capital, a maior mobilizacao de mao-de-obra sera suficiente para que haja um significativo aumento de producao em relacao aos dez peixes diarios correspondentes ao trabalho de um indio equipado com uma vara.

Ledo engano. O seu filho, desprovido de vara de pescar, mal consegue capiturar um peixe por dia, mergulhando no riacho e tentando apanha-los com a mao. Sem fazer uso da vara de pescar, a contribuicao de seu trabalho para producao e praticamente nula, e a familia se ve de volta a realidade de escassez de 10 peixes diarios.

E o indio revoltado joga na fogueira todos os livros de economia de crescimento que comprou do homem branco por valiosos 8 peixes.

Esse exemplo ilustra bem um fenomeno conhecido em economia como complementaridade de fatores de producao. No que diz respeito a producao de peixes, a vara de pescar e inutil sem o indio que saiba usa-la, o indio e inutil sem a vara de pescar utilizavel. A regularidade da funcao de Cobb-Douglas consiste exatamente em negar (ou negligenciar a titulo aproximativo) essa que e uma caracteristica fundamental de praticamente todas as atividades produtivas que empregam capital fisico e humano simultaneamente. A capacidade de rendimentos de um estoque de capital em relacao a mao de obra pode se encontrar esgotada, ou proxima do esgotamento, de modo que aumentos adicionais na mao de obra nao trarao ganhos significativos de producao, e vice-versa. Alias, essa situacao de quase esgotamento e perfeitamente razoavel com a realidade, pois dentro da nocao de que os recursos sao escassos, de nada adianta ao indio manter um estoque de varias varas de pescar para servir seus filhos se estes nao existem em numero suficiente para dar uso a cada uma dessas varas. A racionalidade no emprego de recursos escassos faz com que a capacidade extraida de cada um deles seja proxima do maximo, de modo a evitar desperdicios. E claro que podem existir contra-exemplos, mas estes sao casos excepcionais derivados de calculos mal feitos ou destruicao de parte consideravel de um dos estoques complementares, onde ou o capital foi excessivamente ampliada, ou fluxos migratorios e crescimento vegetativo aumentaram excessivamente o numero de habitantes de uma regiao, ou guerras e pragas destruiram partes da populacao e do capital de forma nao proporcional. Supor que esse seja um estado normal da economia equivale a supor que as pessoas nao empregam racionalmente recursos escassos, ou seja, a negar o pressuposto basico da ciencia economica.

Ate aqui examinados os problemas da hipotese da regularidade dentro de um contexto de possibilidade contabil de fatores e homogeneidade da producao, mas a propria nocao de contabilidade dos fatores e a homogeneidade da producao sao questoes que merecem um exame mais cuidadoso.

E bem verdade que quando pensamos em termos de indios pescadores ou de centrais de energia eletrica, e bem verdade que o dobro de capital fisico mais o dobro de capital humano, supondo equivalencia nas qualidades de ambos, significarao o dobro de peixes ou de energia eletrica (negligenciando novamente os efeitos que os indios tem nas reservas de peixe e que o consumo de uma usina adicional teria no custo dos fatores de producao que emprega).

Mas o mundo real e um mundo um pouco mais complicado.

A mao-de-obra, tanto quanto o capital, nao possuem um carater equivalente. Nem mesmo aproximadamente. Um empregado pode ser indolente ou dedicado, capacitado em uma determinada especialidade ou incompetente na sua execucao. Uma porcao terra pode ser, para uma determinada cultura, fertil ou improdutiva, assim como pode estar proxima ou distante dos mercados consumidores. O mesmo vale para instalacoes industriais, que podem ser adequadas para um tipo de producao, mas parcial ou completamente inconversiveis para outros tipos e escalas de producao. Os meios disponiveis para ampliar a producao dos produtos demandados sao escassos e diferenciados, e o mecanismo de precos de mercado permite aos empresarios empregar tais meios de maneira a melhor satisfazer os interesses manifestados pelos consumidores, produzindo bens de consumo, ou bens de producao de segunda, terceira, ou n-esima ordem.

Imaginemos que devido a um crescimento rapido da demanda, o preco da batata esteja alto, de modo que mais investidores sintam-se tentados comprar mais terras, mais equipamentos e contratar mais mao-de-obra para ampliar a producao de batatas. Assim, um economista de crescimento neoclassico rapidamente se apressaria em dizer que os aportes de capital humano e fisico traduzirao-se em crescimentos proporcionais de producao.

Mas esses investidores logo se deparam com a dura realidade da escassez dos fatores. As boas terras para o plantio de batatas encontram-se ja empregadas para plantar batatas por outros investidores, a mao-de-obra e equipamentos especializados tambem. Para retira-los de seus respectivos postos eles terao de oferecer salarios mais altos e precos maiores do que os que vem sendo praticados no mercado, mas os seus atuais patroes e proprietarios, cientes da demanda latente de novos investidores, ja ajustaram esses valores, de modo que adiquiri-los nao e necessariamente vantajoso. Para entrar no mercado ou para expandir sua producao, os investidores deverao empregar terras, equipamentos e mao-de-obra que nesse exato momento estavam alocados em outras cadeias de producao, para as quais seriam mais apropriados do que para a producao de batatas. A rentabilidade esperada desses novos recursos nao sera identica a dos recursos ja empregados, mas significativamente menor.

Contudo, os custos desses novos recursos nao sao proporcionalmente menores em relacao a perda de sua produtividade para a producao de batatas. Eles sao determinados pela rentabilidade que teriam se fossem empregados em outras atividades economicas, ou seja, pelos precos e salarios estabelecidos pelos seus antigos proprietarios e patroes em funcao dos fins economicos que davam para eles. Ou seja, embora a renda que os investidores almejam ter com a expansao sejam afetadas pela diminuicao da capacitacao da mao-de-obra e capital recem adquiridos, os custos nao sao, pois sao determinados pela rentabilidade marginal (dada por todos os demais projetos economicos imaginaveis) desses recursos.

Alem disso, a expansao da producao de batatas tem por efeito aplacar o excesso de demanda, traduzindo-se numa baixa de precos, sendo esse mecanismo claramente conhecido por todos, e um dos mais basicos da economia.

Logo, se a contabilidade de capital e recursos humanos for realizada em termos de custos, ve-se que a expansao daquela producao, em quantias proporcionais, nao traz uma rentabilidade proporcional, mas necessariamente menor, considerando estaveis o estado de conhecimento tecnologico vigente e as rentabilidades dos demais projetos economicos. A quantidade e qualidade do trabalho e rendimentos da mao-de-obra contratada e capital mobilizado sao inferiores, pois foram adquiridos de outros setores ou do desemprego, embora seus custos sejam estabelecidos por outros fatores que nao sua produtividade em termos de batatas. A realidade de escassez de recursos refuta portanto a hipotese aproximativa de homogeneidade da producao, dentro do unico criterio possivel de contabilidade de recursos para efeitos de calculo economico, que e o da contabilidade monetaria.

Sobre a evolucao tecnologica e o progresso do conhecimento como exogenos a atividade produtiva, temos uma afirmativa muito pouco sustentavel. Pesquisa e desenvolvimento, sejam eles de carater basico e fundamental, ou plenamente aplicavel em metodos de producao de bens consumiveis, consomem muitos recursos fisicos e humanos. Muitos individuos capacitados, equipamentos sofisticados, insumos caros, terras bem localizadas precisam ser formados, fabricados, ou retirados da producao de bens de consumo para que a pesquisa possa se realizar.

A pesquisa, quando realizada apenas para satisfazer o interesse humano em descobrir os segredos da natureza, sem qualquer investimento preocupado em aumentar a disponibilidade de bens de consumo e recursos de capital no futuro, pode ser considerada como consumo. E o ser humano usando recursos disponiveis para satisfazer uma de suas necessidades na sua escala de valores. Quando a pesquisa e feita no sentido de aumentar a producao e consumo futuros, trata-se de poupanca, ou seja, da imobilizacao de recursos no presente visando a maior utilidade atribuida a uma producao maior de bens existentes ou latentes no futuro.

Existem descobertas cientificas de base que sao realizadas como consumo, motivadas pela curiosidade dos detentores de recursos, que mais tarde poderao ser empregadas em metodos de producao mais avancados e que aumentem a producao futura de bens e os padroes de consumo da humanidade. Os fenomenos do eletromagnetismo por exemplo, foram descobertos dessa maneira. Embora esses acidentes estejam ligados diretamente com a escalada do progresso material da humanidade, eles nao devem ser considerados como objetivos do homem ao empregar seus recursos escassos. Ninguem descobriu a eletricidade para que cem ou duzentos anos depois as pessoas pudessem ouvir radio e assistir televisao. A eletrecidade foi descoberta pelo interesse de cientistas em estuda-la, pela curiosidade que motivou o consumo de tempo e recursos para compreende-la, e apenas mais tarde outras pessoas perceberam que poderiam explora-la em niveis economicos superiores. Ou seja, o que antes era um bem de consumo, que divertia as pessoas com os seus fenomenos bizarros e anti-intuitivos, passou a ser empregado como bem de producao para outros bens de consumo que faziam o uso desses fenomenos.

De qualquer modo, tanto para a descoberta motivada pela curiosidade e consumo, quanto para a descoberta motivada pelo interesse em aumentar a producao e consumo futuros, existe o fato de que elas nao seriam possiveis ou identicas se as condicoes de producao fossem diferentes daquelas que permitiram os recursos caros utilizados na sua realizacao.

A ideia, de origens hegelianas e marxistas, de um progesso continuo e inabalavel da humanidade, independente das acoes e consideracoes dos individuos e das formas que escolhem para alocar sua producao, e completamente falsa e nao passa de pensamento mistico. Nao existem forcas ou fluxos historicos que aumentam sistematicamente o conteudo de conhecimentos humanos. O que existe sao seres humanos abrindo mao de outras formas de consumo e poupanca para investirem no aumento de seu conhecimento, motivados ou pela simples satisfacao trazida pela melhor compreensao dos problemas que os atormentam e dos fenomenos que os interessam, ou por ampliar sua capacidade de produzir outros bens que queiram consumir. Se ninguem investisse tempo e recursos humanos e fisicos na descoberta cientifica, essa nao se produziria automaticamente como lei historica.

Essa poupanca ou consumo nao tem qualquer relacao necessariamente estabelecida com o Estado. Os individuos podem faze-la tanto atraves de decisoes voluntarias no mercado, quanto podem ser coagidos a realiza-las pelo governo, que atraves de seus burocratas escolhera as quantidades e qualidades desses investimentos e consumos de recursos no mercado intelectual. Nada disso muda o fato de que o progresso tecnologico da humanidade so pode vir da mobilizacao de recursos para o futuro atraves de poupanca.

Qualquer hipotese adicional que escape dessas consideracoes e na verdade uma manifestacao disfarcada do misticismo marxista que atribuia o avanco ideologico e tecnologico as forcas irresistiveis do progresso historico, cuja acao se daria independentemente de circuntancias tais como a realidade dos recursos disponiveis e as valoracoes dos individuos que decidem como emprega-los.

Alem disso, existe o problema de que mesmo quando novos metodos sao desenvolvidos, para implanta-los na cadeia de producao e necessaria a poupanca de recursos necessarios para bancar o custo de sua fabricacao e da substituicao do capital parcialmente conversivel que pode ser adaptado, assim como os rendimentos do capital inconversivel que seria abandonado ou transformado em sucata. Assim, mesmo que novos e mais modernos metodos estejam disponiveis para a realizacao de uma producao mais barata, eficiente e de qualidade, pode ser que a valoracao atual dos individuos nao atribua tanta importancia as contribuicoes desses metodos, e preferiam gastar ou aplicar os recursos necessarios para realizar essa conversao em outras cadeias de producao mais atraentes.

No mais, negar que a acumulacao de capital per capta nao tem sido um fator relevante no crescimento economico e olhar pela janela do seu apartamento localizado no 17 andar de um edificio, ver os postes da rede eletrica, os automoveis nas auto-estradas, em meio a outros predios, arranha-ceus e pontes, fabricas e estradas de ferro, centros de lazer, escolas e universidades e afirmar que nada do que se esta vendo existe ou e relevante, pois trata-se tao somente de capital fisico acumulado que nao estava disponivel na epoca em que os homens habitavam cavernas e comiam carne crua. E simplesmente um grande esforco de negacao da realidade.

Sobre as taxas de crescimento populacional exogenas, essa tambem e outra falacia grotesca. Voltemos ao exemplo do nosso indio. Com o seu trabalho que lhe rende 10 peixes por dia, ele alimenta e compra recursos necessarios para a sobrevivencia da sua pequena familia, formada por ele, sua esposa, um filho mais velho, um filho mais novo, e uma menina cacula. Se mais uma crianca nascer antes do filho mais velho ser capaz de produzir, ela tera dificuldades para sobreviver pois a producao nao conseguiria suprir adequadamente as necessidades adicionais geradas pela sua existencia improdutiva de crianca. Caso sobreviva em meio a precariedade, seu consumo adicional trara dificuldades suplementares para a acumulacao de poupanca do velho indio, que nao podera guardar o suficiente para comprar uma vara de pescar para seu filho mais velho ou reduzir seu tempo de trabalho para dedicar-se a ensina-lo as tecnicas e artes de seu oficio corretamente.

Somente essas consideracoes simples ja mostram o quanto a taxa de crescimento populacional afeta a producao e acumulacao de capital. Mas pode-se alegar que elas sao derivadas da ma compreensao introduzida pelo fato de que a economia representada pelo indio e sua familia trata-se de uma precaria situacao de subisistencia, onde o impacto da populacao adicional sobre o consumo e significativo, algo que nao seria verdadeiro nas sociedades altamente produtivas do capitalismo moderno. Nessas economias, o excedente de producao seria tao grande que permitiria a sobrevida de praticamente todos os nascentes, sendo as taxas de mortalidade ligadas a fatores que nao sao diretamente afetados pela producao e consumo atuais, como doencas congenitas e geneticas ou acidentes na gestacao, parto ou primeira infancia. A taxa de crescimento vegetativo passaria entao a ser uma escolha das familias, que dentro de seus planejamentos particulares para os perfis de consumo e investimentos futuros, assim como outros aspectos de ordem de preferencia pessoais (tais como gostar ou nao de criancas, ou os efeitos e custos sociais de se ter uma familia numerosa), definiram em cada cultura o numero de filhos por casal.

Esse argumento de ordem psicologica pode ate ter alguma validade dentro de determinadas culturas e valores de certas epocas. Mas nada em si contem de fundamental para que possamos considerar, com certeza absoluta, que um nivel de crescimento vegetativo, abaixo do biologicamente admissivel pelo tempo de gestacao das femeas humanas, devera limitar o crescimento vegetativo das populacoes em situacoes de abundancia de recursos. E evidente que pessoas nao sao bacterias, mas nada a priori impediria uma cultura de valorizar extremamente familias numerosas, de modo que varios individuos se empenhassem em ter quantos filhos pudessem, se os niveis de producao fossem altos o suficiente para que as taxas de crescimento vegetativos maximais (biologicamente falando) nao prejudicassem o acumulo de capital.

Mas o mais importante e que e seguidamente desconsiderado e o fator imigracao. Economias em crescimento e com alta producao e consumo por individuo atraem pessoas de economias onde os niveis de vida sem considerados piores, pelas pessoas que migram. Se nenhuma barreira for estabelecida impedindo esses movimentos migratorios, aumentarao e diminuirao as taxas de crescimento populacional nas diferentes economias segundo os sucessos de e fracassos de suas economias. Nao ha a menor razao para se raciocinar em termos de Estados-nacoes nesse caso, esse e exatamente o caso onde barreiras sao estabelecidas para impedir total ou parcialmente esse fluxo. Se considerarmos os perfis de crescimento das cidades em virtude da industrializacao, que produziram o exodo rural dentro dos proprios paises, teremos uma clara evidencia de que o crescimento e desaparecimento da populacao em determinadas localidades estaria muito mais ligado a fatores economicos do que a escolhas de familias sobre taxas de natalidade.

Alias, o pensamento em Estado-nacoes como agentes economicos de importancia relevante e um dos fatores que mais obscurece o raciocinio e leva as conclusoes mais absurdas. Isso porque essas entidades sao justamente compostas de instituicoes cujo objetivo e restringir certas liberdades dos individuos de decidir como devem governar suas vidas. Se queremos raciocinar corretamente em termos de economia, devemos pensar em Estados-nacoes nao como agentes economicos, mas como dificuldades suplementares que os verdadeiros agentes economicos precisam considerar e superar nas alocacoes que pretendem dar a seus recursos.

O fato da taxa de crescimento vegetativo dos EUA, por exemplo, ser relativamente dissociada de seu desempenho economico nas ultimas decadas diz respeito apenas as politicas vigentes que impedem fluxos migratorios, e nao a qualquer natureza exogena do crescimento relativo a producao. Se os fluxos migratorios forem analisados dentro da America, onde essas barreiras inexistem ou sao menos intensas, ou em outras epocas em que a imigracao era menos combatida, as conclusoes obtidas serao consideravelmente diferentes.



Essas sao apenas algumas consideracoes que tornam a teoria que voce divulga inadequada para fornecer uma explicacao geral para o crescimento economico. As consideracoes e suposicoes feitas que permitiriam os teoremas derivados sao extremamente restritivas, quando nao sao de todo inadequadas, de modo que a teoria resultante de seu exame serve no maximo para uma descricao impropria de alguns casos particulares atraves da analise de dados que revelam realidades dos problemas apenas de um modo extremamente parcial. Podem servir de aproximacoes para situacoes posteriores a uma guerra, ou para condicoes especificas de restricoes institucionais impostas pelos Estados Nacoes, mas na medida em que nao se apresentem como tais, e nao assumam que estao assumindo uma serie de condicoes historicas como pressuposicoes, serao teorias economicas erradas, que levarao finalmente a conclusoes erradas.

O que existe aqui e um problema grave de natureza epistemologica. Ao criarmos objetos e construcoes mentais para melhor estudar uma determinada ciencia, propondo teorias para o comportamento desses objetos e construcoes, devemos ter sempre a preocupacao de bem estabelecer a relacao guardada entre essas construcoes de nossas mentes e os fenomenos reais e categorias fundamentais que nossa ciencia pretendia estudar a priori, assim como procurar estabelecer as limitacoes que os nossos conceitos impoem a amplitude de nossos raciocinios.

Ao estudar economia, deve-se antes de mais nada reconhecer que os unicos agentes economicos sao os individuos. Eles podem organizar-se em diferentes tipos de empreendimentos cooperativos, como empresas, sindicatos ou Estados-nacoes, mas permanece o fato basico de que individuos e apenas eles decidem e escolhem, preferem e preterem, agem ou nao agem.

Assim, ao criarmos conceitos coletivos abstratos para efeitos de estudo, tais como classes de individuos, tipos de capital e etc; deve-se haver uma preocupacao em se saber como devemos coletar e interpretar dados sobre esses coletivos de modo que eles nos digam algo sobre os verdadeiros agentes da economia, e como os modelos teoricos que criamos explicando o seu comportamento podem nos ajudar a decifrar os problemas ligados a realidade subjacente de individuos agentes, que possuem diferentes escalas de valores e preferencias, assim como respondem de formas diferentes aos incentivos produzidos pelas acoes dos demais individuos e condicoes da natureza que determinam a escassez dos recursos disponiveis.

Continua...
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Huxley
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por Huxley »

user f.k.a. Cabeção escreveu:

A nocao de que a producao depende de dois fatores, capital e trabalho, e que a relacao dessas duas quantidades com a producao e homogenea nao e nenhuma novidade para mim. Explicarei brevemente porque ela e adotada como uma aproximacao num primeiro momento, quais sao as hipoteses que fazem os economistas extrairem a funcao de Cobb-Douglas dessa condicao, e quais sao os problemas dessas hipoteses.

Por homogenea, entende-se toda a funcao que leva um vetor x em um numero f(x), e que obedeca a relacao f(a*x)= a*f(x).

Por que os economistas pensam entao que a funcao de producao e homogenea? Na relacao entre producao, capital e trabalho, o raciocinio e este: se um indio possui uma vara de pescar e consegue pescar dez peixes por dia, dois indios identicos com duas varas de pescar identicas conseguirao pescar vinte peixes por dia (se considerarmos despreziveis as acoes desses indios sobre as reservas totais de peixe do riacho). Ao dobrar o trabalho desempenhado pelo indio, e o capital empregado para a realizacao desse trabalho (as varas de pescar), dobra-se o produto (peixes). Ou numa formulacao "mais matematica", P(2K,2L)=2P(K,L), onde K e uma quantidade de capital fisico, L e uma quantidade de trabalho e P(K,L) e o produto realizado. Desse modo, se fizer algum sentido contabilizar trabalho, capital e producao, como nesse caso dos indios, fara sentido supor que ha homogeneidade da producao em relacao as quantidades de capital e trabalho contabilizadas.

Um resultado elementar de calculo diferencial consiste em demonstrar que todas as funcoes homogeneas e diferenciaveis de duas variaveis, supostas crescentes em relacao a cada uma delas, sao da forma P(K,L)=A*(K^p)*(L^(1-p)), onde p e um numero entre 0 e 1, e A e uma constante positiva arbitraria. Como estamos discutindo economia e nao matematica, deixarei essa demonstracao como exercicio para quem tiver algum interesse nesse aspecto.

Alguns economistas ansiosos por modelizar a economia com o auxilio de objetos matematicos simples apressaram-se em supor, a titutlo aproximativo, as hipoteses necessarias para que pudessem falar de producao em termos de funcao de Cobb-Douglas. Ou seja, supuseram que existe uma relacao contabil precisamente mensuravel entre capital, trabalho e produto, fazendo sentido falar em "dobro de capital", "dobro de trabalho" e "dobro de produto", assim como supuseram a regularidade (diferenciabilidade) da funcao de producao homogenea que determiaria a relacao dessas quantidades. Apresentarei aqui alguns argumentos de porque essas suposicoes sao questionaveis.

Primeiro, analisaremos a hipotese da regularidade propriamente dita. Para isso, faremos uso de um exemplo interessante, que pode ser ilustrado com a analogia dos indios e varas de pescar anteriormente empregadas. Suponhamos que nossa economia consista em um indio que trabalha para sustentar sua familia pescando com sua vara de pescar. Como anteriormente, o indio (trabalho) mais a sua vara de pescar (capital) produzem por dia dez peixes, que eles usam para alimentar-se e para trocar com outras familias de indegenas envolvidas em atividades diferentes.

Como vimos antes, dada a homogeneidade da producao, e suposta (a titulo de aproximacao) a regularidade, o indio usa a funcao de Cobb-Douglas para modelizar sua economia. Assim, suponhamos que o nosso amigo indio encontre uma vara de pescar identica a sua, abandonada na beira do riacho. Nosso indio neoclassico logo fica feliz, pois sabe que ao dobrar o seu capital, estara multiplicando sua producao por um fator de 2^p, e como p e positivo (e menor do que 1), ele sabe que isso significara uma expansao na producao de peixes de um fator maior que um, ou seja, um crescimento. Contudo, o pobre indio logo se decepciona ao perceber que nada mudou de verdade: ao se ver incapaz de se servir de duas varas de pescar simultaneamente, percebe que o capital adicional que agora possui nao representa qualquer diferenca na producao de peixes que e capaz.

Contudo, o indio nao se deixa abalar e ensina seu filho mais velho a pescar, para que este possa se servir. Para ter tempo e condicoes fisicas de ensina-lo a pescar, o indio precisa reduzir a sua produtividade diaria de peixes em 3 unidades. Como veremos mais tarde, pode-se dizer nesse caso entao que esta havendo uma poupanca de capital humano (trabalho), destinada ao aumento da producao futura representada pela capacitacao de uma mao de obra a fim de operar um certo tipo de capital (a vara adicional nao utilizada).

Apos alguns dias de restricao de consumo a 7 peixes por dia, o garoto finalmente aprende a pescar e rapidamente desenvolve sua habilidade ate equiparar-se ao seu pai. A producao da familia, apos o periodo de poupanca e reducao do consumo, atinge os vinte peixes diarios e todos estao felizes. A familia de indigenas ao fazer isso sacrificou os beneficios de uma parte do consumo no presente por um consumo ainda maior no futuro. A epoca de prosperidade segue ate que um dia, o filho da familia se envolve numa briga com um indio de outra tribo, e acaba quebrando sua vara de pescar na peleja. A vara se torna inutil, nao podendo ser consertada.

O pai fica furioso, mas tranquiliza-se pensando novamente na funcao de Cobb-Douglas: a capacitacao de uma forca de trabalho dobrada, num dado estado de conhecimento tecnologico e estoque de capital, rende necessariamente uma producao aproximadamente 2*(1-p) maior, e como p e menor do que 1, temos entao crescimento. Ou seja, ainda que os vinte peixes nao sejam mais possiveis devido a destruicao de parte do estoque de capital, a maior mobilizacao de mao-de-obra sera suficiente para que haja um significativo aumento de producao em relacao aos dez peixes diarios correspondentes ao trabalho de um indio equipado com uma vara.

Ledo engano. O seu filho, desprovido de vara de pescar, mal consegue capiturar um peixe por dia, mergulhando no riacho e tentando apanha-los com a mao. Sem fazer uso da vara de pescar, a contribuicao de seu trabalho para producao e praticamente nula, e a familia se ve de volta a realidade de escassez de 10 peixes diarios.

E o indio revoltado joga na fogueira todos os livros de economia de crescimento que comprou do homem branco por valiosos 8 peixes.


Esse exemplo ilustra bem um fenomeno conhecido em economia como complementaridade de fatores de producao. No que diz respeito a producao de peixes, a vara de pescar e inutil sem o indio que saiba usa-la, o indio e inutil sem a vara de pescar utilizavel. A regularidade da funcao de Cobb-Douglas consiste exatamente em negar (ou negligenciar a titulo aproximativo) essa que e uma caracteristica fundamental de praticamente todas as atividades produtivas que empregam capital fisico e humano simultaneamente. A capacidade de rendimentos de um estoque de capital em relacao a mao de obra pode se encontrar esgotada, ou proxima do esgotamento, de modo que aumentos adicionais na mao de obra nao trarao ganhos significativos de producao, e vice-versa. Alias, essa situacao de quase esgotamento e perfeitamente razoavel com a realidade, pois dentro da nocao de que os recursos sao escassos, de nada adianta ao indio manter um estoque de varias varas de pescar para servir seus filhos se estes nao existem em numero suficiente para dar uso a cada uma dessas varas. A racionalidade no emprego de recursos escassos faz com que a capacidade extraida de cada um deles seja proxima do maximo, de modo a evitar desperdicios. E claro que podem existir contra-exemplos, mas estes sao casos excepcionais derivados de calculos mal feitos ou destruicao de parte consideravel de um dos estoques complementares, onde ou o capital foi excessivamente ampliada, ou fluxos migratorios e crescimento vegetativo aumentaram excessivamente o numero de habitantes de uma regiao, ou guerras e pragas destruiram partes da populacao e do capital de forma nao proporcional. Supor que esse seja um estado normal da economia equivale a supor que as pessoas nao empregam racionalmente recursos escassos, ou seja, a negar o pressuposto basico da ciencia economica.

Ate aqui examinados os problemas da hipotese da regularidade dentro de um contexto de possibilidade contabil de fatores e homogeneidade da producao, mas a propria nocao de contabilidade dos fatores e a homogeneidade da producao sao questoes que merecem um exame mais cuidadoso.

E bem verdade que quando pensamos em termos de indios pescadores ou de centrais de energia eletrica, e bem verdade que o dobro de capital fisico mais o dobro de capital humano, supondo equivalencia nas qualidades de ambos, significarao o dobro de peixes ou de energia eletrica (negligenciando novamente os efeitos que os indios tem nas reservas de peixe e que o consumo de uma usina adicional teria no custo dos fatores de producao que emprega).


Analogia sem pé nem cabeça, já que o sistema de produção de uma aldeia indígena não cumpre o requisito da existência de uma função de produção bem-comportada. Retornos marginais decrescentes para os fatores existem no mundo real porque existem funções de produções com uma imensa quantidade de técnicas alternativas ordenáveis em termos das proporções estritamente físicas em que os diversos fatores são utilizados. No mundo capitalista, existem funções de produção bem-comportadas. Na adeia indígena, não.

Não importa se a teoria de crescimento convencional parte de hipóteses não muito realistas. O que importa é se ela faz predições testáveis. A partir do modelo de Solow, tornou-se comum tentar se estabelecer a contribuição de cada fator de produção ao processo de crescimento dos países a partir de estimativas econométricas. Contudo, há um problema: é muito difícil medir a contribuição da evolução tecnológica para o crescimento econômico diretamente. Para contornar o problema, propõe-se contabilizar inicialmente a contribuição ao crescimento decorrente do aumento da oferta de fatores (capital e trabalho), de mais fácil mensuração. A parcela do crescimento econômico não correlacionada ao crescimento da oferta dos fatores de produção – normalmente, uma parcela ampla do crescimento - é chamado na literatura de “resíduo de Solow”. O resíduo de Solow é atribuído por hipótese ao crescimento da Produtividade Total dos Fatores (PTF); A PTF capta o impacto de aspectos intangíveis do progresso humano que permitem que tanto o capital quanto o trabalho melhorem sua produtividade; o fato de ele ser empiricamente significativo na maioria das estimativas é considerado uma corroboração do modelo de Solow.

E qualquer teoria de crescimento que diga que a acumulação de capital é um fator muito importante estará negando a lei dos rendimentos marginais decrescentes.

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Mas o mundo real e um mundo um pouco mais complicado.

A mao-de-obra, tanto quanto o capital, nao possuem um carater equivalente. Nem mesmo aproximadamente. Um empregado pode ser indolente ou dedicado, capacitado em uma determinada especialidade ou incompetente na sua execucao. Uma porcao terra pode ser, para uma determinada cultura, fertil ou improdutiva, assim como pode estar proxima ou distante dos mercados consumidores. O mesmo vale para instalacoes industriais, que podem ser adequadas para um tipo de producao, mas parcial ou completamente inconversiveis para outros tipos e escalas de producao. Os meios disponiveis para ampliar a producao dos produtos demandados sao escassos e diferenciados, e o mecanismo de precos de mercado permite aos empresarios empregar tais meios de maneira a melhor satisfazer os interesses manifestados pelos consumidores, produzindo bens de consumo, ou bens de producao de segunda, terceira, ou n-esima ordem.

Imaginemos que devido a um crescimento rapido da demanda, o preco da batata esteja alto, de modo que mais investidores sintam-se tentados comprar mais terras, mais equipamentos e contratar mais mao-de-obra para ampliar a producao de batatas. Assim, um economista de crescimento neoclassico rapidamente se apressaria em dizer que os aportes de capital humano e fisico traduzirao-se em crescimentos proporcionais de producao.

Mas esses investidores logo se deparam com a dura realidade da escassez dos fatores. As boas terras para o plantio de batatas encontram-se ja empregadas para plantar batatas por outros investidores, a mao-de-obra e equipamentos especializados tambem. Para retira-los de seus respectivos postos eles terao de oferecer salarios mais altos e precos maiores do que os que vem sendo praticados no mercado, mas os seus atuais patroes e proprietarios, cientes da demanda latente de novos investidores, ja ajustaram esses valores, de modo que adiquiri-los nao e necessariamente vantajoso. Para entrar no mercado ou para expandir sua producao, os investidores deverao empregar terras, equipamentos e mao-de-obra que nesse exato momento estavam alocados em outras cadeias de producao, para as quais seriam mais apropriados do que para a producao de batatas. A rentabilidade esperada desses novos recursos nao sera identica a dos recursos ja empregados, mas significativamente menor.

Contudo, os custos desses novos recursos nao sao proporcionalmente menores em relacao a perda de sua produtividade para a producao de batatas. Eles sao determinados pela rentabilidade que teriam se fossem empregados em outras atividades economicas, ou seja, pelos precos e salarios estabelecidos pelos seus antigos proprietarios e patroes em funcao dos fins economicos que davam para eles. Ou seja, embora a renda que os investidores almejam ter com a expansao sejam afetadas pela diminuicao da capacitacao da mao-de-obra e capital recem adquiridos, os custos nao sao, pois sao determinados pela rentabilidade marginal (dada por todos os demais projetos economicos imaginaveis) desses recursos.

Alem disso, a expansao da producao de batatas tem por efeito aplacar o excesso de demanda, traduzindo-se numa baixa de precos, sendo esse mecanismo claramente conhecido por todos, e um dos mais basicos da economia.

Logo, se a contabilidade de capital e recursos humanos for realizada em termos de custos, ve-se que a expansao daquela producao, em quantias proporcionais, nao traz uma rentabilidade proporcional, mas necessariamente menor, considerando estaveis o estado de conhecimento tecnologico vigente e as rentabilidades dos demais projetos economicos. A quantidade e qualidade do trabalho e rendimentos da mao-de-obra contratada e capital mobilizado sao inferiores, pois foram adquiridos de outros setores ou do desemprego, embora seus custos sejam estabelecidos por outros fatores que nao sua produtividade em termos de batatas. A realidade de escassez de recursos refuta portanto a hipotese aproximativa de homogeneidade da producao, dentro do unico criterio possivel de contabilidade de recursos para efeitos de calculo economico, que e o da contabilidade monetaria.


Ok, fatores são heterogêneos e os recursos são especializados.

Fatores de produção (capital, trabalho e terra) são heterogêneos: Equipamento de capital de diferentes idades/safras tecnológicas; Trabalhadores desigualmente capacitados;Terras com diferentes graus de fertilidade e a diferentes distâncias. Contudo, por hipótese os fatores NÃO são remunerados proporcionalmente à sua eficiência no curto prazo. Então, os empresários contratarão primeiramente os trabalhadores mais qualificados, já que possuem maior produtividade, e menor custo unitário. Utilizarão em primeiro lugar as máquinas mais novas e as terras mais férteis e/ou menos distantes: possuem maior velocidade e/ou qualidade; e menor custo unitário. Porém, conforme a produção aumenta (em decorrência de um aumento da demanda agregada, por exemplo), novos trabalhadores (menos qualificados) precisam ser contratados, novas máquinas (mais antigas) precisam ser utilizadas e novas terras (menos férteis e/ou mais distantes) precisam ser aproveitadas. A produtividade média do trabalho portanto tende a cair conforme aumenta a produção, e vice-versa.

Observação-> No longo prazo microeconômico, este efeito desapareceria: no caso dos trabalhadores, por exemplo, os recém-contratados, em ordem decrescente de produtividade, receberiam salários também decrescentes, proporcionais a essa produtividade; argumentos similares valem para os fatores capital e terra.

Os recursos são especializados: recursos normalmente utilizados para um determinada atividade NÃO podem ser alocados para outras sem perda de eficiência e, portanto, queda de produtividade do trabalho. Exemplos: Pneus de automóveis são produzidos com borracha sintética; na falta desta, pode ser usada borracha natural, a qual contudo é mais cara; Um agricultor familiar não pode ser transformado em motorista de tratores de alta tecnologia sem treinamento custoso e demorado; Uma máquina especializada na produção de um certo tipo de mercadoria não pode ser adaptada para a produção de outro tipo sem perda de produtividade (se é que pode ser adaptada).

Ademais, os vários setores da economia não atingem todos seus níveis de produção potencial ao mesmo tempo. Conseqüência: os vários setores alcançarão sua ocupação ótima da capacidade para diferentes valores de Q; pode haver escassez de capacidade produtiva em alguns setores (chamados de “gargalos” ou “estrangulamentos” setoriais), e, ao mesmo tempo, ociosidade não-planejada em outros setores; Devido à especialização acima referida, contudo, os recursos ociosos em um setor não podem ser deslocados para outro setor onde haja escassez sem perda de eficiência e, portanto, queda de produtividade. Quanto maior o grau médio de ocupação de capacidade da economia, maior o número de setores que apresentam “gargalos” de oferta para a expansão da produção. Maior portanto o número de setores que precisa deslocar recursos especializados de outros setores para ampliar a produção. Maior a perda de eficiência e, portanto, a queda da produtividade.

Observação: no longo prazo microeconômico, este efeito também tenderia a desaparecer, pois os setores com gargalos ampliariam sua capacidade produtiva, e os setores com ociosidade não-planejada a reduziriam; coeteris paribus (isto é, se neste intervalo de tempo não ocorresse nenhuma outra mudança na economia além dessa), no ponto de produção potencial todos os setores estariam com capacidade ótima.

No curto prazo microeconômico, o estoque de capital e o grau de evolução tecnológica são dados. Para aumentar a produção, é necessário associar um maior número de empregados a um dado estoque de capital, gerando então o conhecido fenômeno da produtividade física marginal decrescente do trabalho no curto prazo. Este, por sua vez, gera um custo marginal crescente conforme o nível de produção. No longo prazo microeconômico, como o estoque de capital é variável, este fenômeno não ocorreria.

Observação: a teoria de crescimento de Solow é uma teoria de LONGO PRAZO microeconômico, isto é, descreve o que acontece numa economia em aproximadamente 50 anos ou mais. No prazo deste modelo, a produtividade média do trabalho é insensível a variações no nível de produção.

user f.k.a. Cabeção escreveu:


Sobre a evolucao tecnologica e o progresso do conhecimento como exogenos a atividade produtiva, temos uma afirmativa muito pouco sustentavel. Pesquisa e desenvolvimento, sejam eles de carater basico e fundamental, ou plenamente aplicavel em metodos de producao de bens consumiveis, consomem muitos recursos fisicos e humanos. Muitos individuos capacitados, equipamentos sofisticados, insumos caros, terras bem localizadas precisam ser formados, fabricados, ou retirados da producao de bens de consumo para que a pesquisa possa se realizar.

A pesquisa, quando realizada apenas para satisfazer o interesse humano em descobrir os segredos da natureza, sem qualquer investimento preocupado em aumentar a disponibilidade de bens de consumo e recursos de capital no futuro, pode ser considerada como consumo. E o ser humano usando recursos disponiveis para satisfazer uma de suas necessidades na sua escala de valores. Quando a pesquisa e feita no sentido de aumentar a producao e consumo futuros, trata-se de poupanca, ou seja, da imobilizacao de recursos no presente visando a maior utilidade atribuida a uma producao maior de bens existentes ou latentes no futuro.

Existem descobertas cientificas de base que sao realizadas como consumo, motivadas pela curiosidade dos detentores de recursos, que mais tarde poderao ser empregadas em metodos de producao mais avancados e que aumentem a producao futura de bens e os padroes de consumo da humanidade. Os fenomenos do eletromagnetismo por exemplo, foram descobertos dessa maneira. Embora esses acidentes estejam ligados diretamente com a escalada do progresso material da humanidade, eles nao devem ser considerados como objetivos do homem ao empregar seus recursos escassos. Ninguem descobriu a eletricidade para que cem ou duzentos anos depois as pessoas pudessem ouvir radio e assistir televisao. A eletrecidade foi descoberta pelo interesse de cientistas em estuda-la, pela curiosidade que motivou o consumo de tempo e recursos para compreende-la, e apenas mais tarde outras pessoas perceberam que poderiam explora-la em niveis economicos superiores. Ou seja, o que antes era um bem de consumo, que divertia as pessoas com os seus fenomenos bizarros e anti-intuitivos, passou a ser empregado como bem de producao para outros bens de consumo que faziam o uso desses fenomenos.

Alem disso, existe o problema de que mesmo quando novos metodos sao desenvolvidos, para implanta-los na cadeia de producao e necessaria a poupanca de recursos necessarios para bancar o custo de sua fabricacao e da substituicao do capital parcialmente conversivel que pode ser adaptado, assim como os rendimentos do capital inconversivel que seria abandonado ou transformado em sucata. Assim, mesmo que novos e mais modernos metodos estejam disponiveis para a realizacao de uma producao mais barata, eficiente e de qualidade, pode ser que a valoracao atual dos individuos nao atribua tanta importancia as contribuicoes desses metodos, e preferiam gastar ou aplicar os recursos necessarios para realizar essa conversao em outras cadeias de producao mais atraentes.

No mais, negar que a acumulacao de capital per capta nao tem sido um fator relevante no crescimento economico e olhar pela janela do seu apartamento localizado no 17 andar de um edificio, ver os postes da rede eletrica, os automoveis nas auto-estradas, em meio a outros predios, arranha-ceus e pontes, fabricas e estradas de ferro, centros de lazer, escolas e universidades e afirmar que nada do que se esta vendo existe ou e relevante, pois trata-se tao somente de capital fisico acumulado que nao estava disponivel na epoca em que os homens habitavam cavernas e comiam carne crua. E simplesmente um grande esforco de negacao da realidade.


À medida que um país cresce, é claro que ele aumenta a sua taxa de capital por trabalhador. Em nenhum momento se considera a "evolução tecnológica e o progresso do conhecimento como exógenos a atividade produtiva".O que se diz é que o aumento da produtividade CAUSA o aumento da quantidade de capital por trabalhador. E que, mais cedo ou mais tarde, a taxa de crescimento do estoque de capital se adaptará a taxa de crescimento da produtividade. Isso não quer dizer que o aumento de estoque de capital não altere o produto no curto prazo microeconômico (mesmo um prazo de 10 anos é considerado "curto" na microeconomia).


user f.k.a. Cabeção escreveu:

Sobre as taxas de crescimento populacional exogenas, essa tambem e outra falacia grotesca. Voltemos ao exemplo do nosso indio.


Realmente, eu cometi um deslize (já corrigi). São duas assertivas. O crescimento do produto total no longo prazo microeconômico (que dura aproximadamente 50 anos ou mais) depende tão somente da taxa de crescimento da disponibilidade de trabalho (= taxa de crescimento da produtividade média do trabalho - taxa de crescimento da força-de-trabalho). Já o crescimento do produto per capita depende tão somente do progresso técnico e nada mais, caso o crescimento da força-de-trabalho acompanhe o da população . A invalidade da segunda assertiva não invalida a primeira. Essa alteração não mudaria a conclusão de que o modelo de Solow e suas variantes consideram a taxa de crescimento da produtividade um fator muito mais importante para o crescimento que a acumulação de capital.
“A boa sociedade é aquela em que o número de oportunidades de qualquer pessoa aleatoriamente escolhida tenha probabilidade de ser a maior possível”

Friedrich Hayek. “Direito, legislação e liberdade” (volume II, p.156, 1985, Editora Visão)

"Os homens práticos, que se julgam tão independentes em seu pensar, são todos na verdade escravos das idéias de algum economista morto."

John Maynard Keynes

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Continuando (as consideracoes seguintes se referem ainda a mesma postagem, e nao a resposta da primeira parte)...

Se nao levarmos em conta os efeitos da acao individual que produzem os fenomenos agregados que procuramos observar, o que teremos e uma teoria que trata de objetos mentais ficticios, mas que muito pouco ou nenhuma relacao guarda com a realidade dos fatos. A teoria pode ser razoavelmente sofisticada na sua descricao matematica, e guardar alguma coerencia com o comportamento observado dos agregados naquela conjuntura especifica dos fatos, mas enquanto nao for deduzida das categorias mais simples e dos fenomenos mais basicos admissiveis a priori, sera incompleta, e no maximo oferecera um estudo de casos locais e particulares de que pouco compreendemos as causas fundamentais. Sera uma forma pedante de ignorancia, e se chamarmos a isso de teoria geral, e procurarmos atribuir os resultados calculados para os casos em que fizemos nossas medicoes arbitrarias para o caso geral, o que produziremos nao passara de asneira revestida de soberba.

E comum que os economistas adeptos a essas "inovacoes" da conceptualizacao economica se refiram as descobertas da fisica estatistica, com seus conjuntos micro-canonico, macro-canonico e grand-canonico, e o sucesso das teorias sobre os fenomenos agregados identificados nesses conjuntos.

O que parece lhes escapar, e que para fundamentar a fisica estatistica, desenvolveu-se uma teoria de micro-estados baseando-se nas ideias e axiomas da fisica quantica, para entao poder se assegurar como casos limites, a validade dos conjuntos "macro" e "grand", cujas variaveis sao agregados tais como "temperatura", "entropia" ou "potencial quimico".

Nao que a termodinamica desenvolvida experimentalmente antes da fisica quantica e estatistica a fundamentarem estivesse errada. Mas nela a temperatura e mesmo a entropia nao sao quantidades agregadas, mas dados fundamentais dos sistemas. Elas derivam de uma compreensao limitada dos fenomenos, ja que nao podiamos ter uma ideia dos micro-estados baseados na fisica valida na epoca. A correcao de seus resultados se deve sobretudo a capacidade existente na fisica termodinamica de se realizar experimentos controlados de modo a produzir e reproduzir resultados apreciaveis e deles extrair conclusoes e fazer previsoes testaveis.

Nada disso ocorreu na "economia macro". A priori ja existia uma conceptualizacao dos agentes economicos individuais, de como eles agiam. Algumas teorias, como as teorias de valor dos economistas classicos, nao estavam corretas. Algumas leis, como as do rendimento decrescente, estavam incompletas, pois nao encapsulavam conceitos derivados da divisao do trabalho como o capitalismo de escala, que permitia a certos ramos industriais rendimentos mais que proporcionais dentro de certas circunstancias. Mas nada disso impedia de formalizar uma teoria da acao economica com individuos, e foram isso que fizeram os economistas classicos, com um grau de correcao substancial. Mais tarde veio a teoria do valor subjetivo, que permetia a formulacao de uma teoria economica com base na acao de individuos sem incorrer nos erros que nublaram os raciocinios de Adam Smith ou David Ricardo e levaram mais tarde a algumas conclusoes absurdas, embora bastante difundidas, como a teoria de valor trabalho marxista.

A teoria de valor subjetivo era um grande obstaculo para os "economistas matematicos", pois sua ambicao de modelar a economia nos moldes da mecanica ou da termodinamica exigia o pressuposto de que as valoracoes dos individuos fossem constantes ou determinaveis atraves de equacoes e dados imutaveis, ou pelo menos de uma descricao estatistica estavel desses dados. Caso contrario, o maximo que produziriam, se agissem criteriosamente na escolha de seus dados, seria oferecer um panorama aproximado de uma situacao conjuntural na qual se conjectura que as valoracoes dos individuos permaneceriam estaveis e poderiam ser estimadas, atraves das tais "funcoes de utilidade". Essas analises poderiam ser uteis para a interpretacao de mercado de uma empresa, num determinado local e num determinado momento, dependendo da competencia do economista e dos estatisticos que a formularam em escolher e interpretar os dados conjunturais corretamente, calcando-se sempre numa teoria correta da acao dos individuos, para a seguir estabelecer modelos matematicos coerentes para aquela situacao especifica. Seria uma ferramenta do calculo economico empresarial portanto, como as ferramentas altamente sofisticadas no emprego da matematica usada pelos financistas atuais para ampliar sua compreensao dos dados do mercado. No mais, quando utilizadas dessa forma, essas descricoes matematicas tem a pretencao apenas de auxiliar os empresarios a melhor realizar seus investimentos, otimizando os custos e maximizando os ganhos. Se forem insatisfatorias nessa tarefa, o proprio mercado as rejeitara.

Mas qualquer tentativa de modelizar completamente a economia a partir dessas ideias, extraindo teorias gerais matematicas do comportamento humano e totalmente desqualificada. Parece lhes escapar que, diferentemente da fisica, temos que individuos nao sao iguais uns aos outros, tal qual eletrons e fotons, nem sua acao e reacao esta sujeita a leis constantes e mensuraveis, em relacoes expressas em equacoes diferenciais conhecidas. Se afirmar qualquer coisa do tipo na esfera de um individuo e um completo despauterio, dizer o mesmo no ambito de grandes agregados sociais e um absurdo maior ainda, a comecar pelo modo de definicao desses agregados, que nao passa de arbitrariedade completa, que simplesmente suprime da analise dados de importancia fundamental para a descricao dos fenomenos de interesse.

Alem dessa dificuldade fundamental intransponivel, esses economistas ainda se deparavam com a realidade de que em economia nao se podem reproduzir condicoes, nem isolar sistemas, de modo a testar rigorosa e repetidamente as hipoteses e poder entao estabelecer "leis". Nao ha como fazer uma teoria baseada apenas em dados coletados, pois os dados em si nao diriam nada, sem que houvesse uma teoria pronta para interpreta-los, e que descrevesse como eles deveriam ser coletados. Os indices de precos, os salarios medios, as taxas de juros reais, os indices de desemprego, e o crescimento economico sao todos apanhados de dados que sao mineirados e processados segundo alguma orientacao teorica, dando ao teorico um resultado, se o fossem segundo alguma outra teoria, dariam outro. Utiliza-los como demonstracoes da veracidade dos teoremas, sem antes estabelecer a fundametnacao teorica das tecnicas utilizadas e simplesmente inverter a ordem do processo epistemologico, e o que se produzira pode ser tudo, menos ciencia seria.

Nada disso os impediu de apresentar suas analises conjunturais sobre dados parciais e mal compreendidos de teorias gerais de economia. Para desvencilhar-se das responsabilidades decorrentes das falhas inerentes a esses metodos de raciocinio falaciosos, inventaram prazos longos e curtos (arbitrariamente estipulados), dentro dos quais as suas teorias produziriam resultados validos, prazos esses ajustaveis enquanto os dados conjunturais ainda faziam sentido com os previstos pelos modelos "gerais" de crescimento e evolucao economica. Enquanto seus metodos forneciam informacoes consideradas corretas, eles se sentiram impelidos a emprega-los na conducao de politicas economicas infames, que repousavam sobre as limitacoes de seus proprios metodos, donde tiravam conclusoes que permitiam, por exemplo, eliminar a escassez atraves de medidas monetarias, algo que faria rir qualquer economista serio. Nao e preciso nem dizer que os estragos dessas politicas foram enormes, mas a conta nao foi cobrada de seus reais responsaveis, que sempre estiveram prontos a apelar para algum argumento cosmico de irracionalidade de longo prazo dos agentes, decorrentes de defeitos inerentes ao sistema capitalista, e nao as suas teorias fraudulentas, para justificar porque o mundo as vezes nao funcionava segundo seus "modelos corretos".


Huxley escreveu:O que se mede é o PIB real, não o PIB nominal. O aumento da renda nacional não inclui o aumento do nível geral de preços. É por isso que existem os números-índice: http://en.wikipedia.org/wiki/Price_index . O nível de preços relativos é uma questão que depende conjuntamente do custo de produção e da utilidade atribuída aos bens pelos demandantes. O nível de preços relativos define o valor de troca que os bens têm uns sobre os outros. Se uma maçã vale duas vezes mais que uma banana, isso aconteceu porque os ofertantes e demandantes de ambos os bens definiram isso. Não há outro modo de calcular riqueza que não seja desta maneira. Em economia, trabalha-se com aproximações e abstrações. O mesmo vale para a confecção de mapas. Não há como ser diferente, pois, de outra forma, para que teríamos mapas?




Eu concordo com voce com relacao a toda ciencia ter um carater aproximativo. Mas podemos sempre avaliar a qualidade de um mapa quando o empregamos para encontrar os pontos geograficos nele representados e quanto melhor ele nos previnir a respeito das estruturas e acidentes localizados na regiao que ele descreve. Dessa forma podemos separar os bons mapas daqueles que sao inadequados, atraves desse criterio epistemologico simples e intuitivo, cuja falsificacao ideologica e quase impossivel para qualquer um atento a realidade de que um rochedo nao e uma planicie, ou que uma ilha nao e um cabo.

No ambito da teoria economica, ao procurarmos descrever o comportamento dos agentes racionais diante de determinados disponibilidade de recursos escassos, poderemos separar uma teoria economica boa de uma ruim naquilo em que elas ofertariam como possibilidades de acao desses agentes e aquilo que podemos traduzir da realidade, desde que nos assegurassemos de que consideramos todos os dados relevantes, e nao analisamos apenas uma parte.

Ao analisarmos uma parte, podemos chegar a silogismos bizarros. Frederic Bastiat usou o exemplo da vidraca quebrada para ilustrar as falacias economicas decorrentes de modos de pensar que ignoram a realidade economica global ("o todo") para se concentrar em meros fenomenos locais ("a parte"), dos quais extraem conclusoes gerais absurdas. A ideia de que quebrar uma vidraca, ou seja, destruir uma parte do capital, engendra uma serie de fenomenos de producao visando substitui-la que tardarao por tornar a sociedade mais rica ainda e uma falacia muito popular, mesmo que as vezes ela seja desnecessariamente complexificada no numero de relacoes causais estudadas. O erro banal esta no fato de que os fatores de producao empregados na producao da nova vidraca encontrariam outro emprego se ela tivesse sido poupada, e dessa forma se transformariam em produtos que deixaram de ser produzidos para que ela fosse substituida. Se alguma afirmativa pode ser feita nesse sentido ela seria a de que a sociedade ficou mais pobre porque perdeu uma vidraca, nao interessando quantos empregos foram gerados e quanta renda foi distribuida para todos aqueles que se envolveram no processo de producao da nova vidraca.

Alem dessas consideracoes a respeito da realidade geral dos fenomenos, e preciso estar ciente de que, antes de mais nada, numa economia de mercado, quem age, escolhe, prefere, sao sempre seres humanos individuais e distintos, e nao classes sociais, racas, nacoes ou outros coletivos abstratos. Nao existem "metas da sociedade", "bem estar geral", e outras manifestacoes e apreciacoes coletivas que nao sejam apenas um catalogo de cada um dos sentimentos e acoes individuais separados, dos quais uma medida geral ou coletiva e simplesmente absurda.

Assim, se quiserem abordar comportamentos de agregados, os cientistas devem ter sempre em mente a obrigacao de demonstrar que o comportamento individual pode ser estudado corretamente dentro daquela escolha de agregados e das informacoes extraidas deles. Apos um cuidadoso raciocinio nesse sentido, que defina corretamente esses agregados, apresentando as conveniencias e inconveniencias do uso desses conceitos, e que poderia-se emprega-los numa analise teorica da economia em carater aproximativo. Sabendo-se quais sao os fenomenos abstratos que afetam esses objetos abstratos, atraves da forma que os fenomenos reais correspondentes afetam os individuos reais, poderia-se realizar uma descricao correta da acao humana segundo tais formalismos.

Mas nao e esse o caso. Esses agregados sao fabricados como a prioris da "nova economia", e encarados como os verdadeiros objetos de interesse. As regras que os governam passam a ser dados irredutiveis, independentes das contradicoes e problemas existentes com o que se sabe do comportamento dos individuos. Nessa realidade distorcida, a riqueza de um pais poderia aumentar se houvesse um saldo positivo da balanca comercial ou um PIB em alta, mesmo que concomitantemente (ou mesmo em funcao disso) a grande maioria dos individuos desse pais tivesse seu poder de consumir reduzido.

Assim, a ideia do valor ajutado que orienta a nocao de PIB real precisa ser coerente com a teoria correta de valor subjetivo. Voce tem razao ao dizer que a relacao que determina a troca (e nao "valor de troca", mas tudo bem) entre macas e bananas sao definidas por ofertantes e demandantes de bananas e macas tendo em vista suas utilidades marginais, ou seja, a preferencia por uma unidade a mais de banana em relacao a uma unidade a menos de maca (e vice-versa), dados os respectivos estoques. Em outras palavras, tem-se o preco de mercado uma mercadoria (maca) em funcao de outra mercadoria (banana). Contudo, mesmo que uma dessas mercadorias fosse usada como parametro, os precos que ela definiria ainda estariam vinculados a sua escassez particular, e sua variacao nao poderia expressar um crescimento economico.

Por exemplo, digamos que temos os precos de todas as mercadorias e servicos expressos em bananas. Poderia a variacao desses precos, ou dos valores totais das quantidades de mercadorias calculadas sobre esses precos, exprimir algo de necessariamente valido sobre a realidade de crescimento economico?

E a resposta e negativa. Se o estoque de todos os itens crescesse, exceto o de bananas, de modo que no momento futuro seguinte tivessemos o dobro de bens, houve certamente um crescimento economico de aproximadamente duas vezes (desconta-se o efeito da estagnacao da oferta de bananas). Ainda assim os precos em termos de bananas, se somados, de todos os bens permaneceria identico, se fizermos a suposicao adicional de que as pessoas nao pretendem nem aumentar nem reduzir seu estoque de bananas particular. Se fosse o estoque de bananas que crescesse em duas vezes, essa soma daria aproximadamente o dobro (se as pessoas novamente nao resolvessem afetar seus estoques de banana). E mesmo assim, a economia certamente nao teria crescido o dobro, apenas teria sido acrescida de uma quantidade adicional de bananas e nada mais.

Para alem desses efeitos monetarios simples, qualquer tentativa de mensurar a utilidade extraida de macas e bananas por toda a sociedade e frustrada, pelo fato de que essa e uma entidade que so faz sentido na esfera de valoracoes do individuo. Mesmo para o individuo, a utilidade nao e algo que ele possa calcular e operar aritimeticamente. Ele apenas estabelece ordens de preferencia em relacao a todas as coisas que tem ou que almeja ter, dizendo a si mesmo o que valeria a pena sacrificar afim obter algo (ato de preferir). Expressoes do tipo "preferir intensamente" so fazem sentido de forma figurada, querendo dizer que estaria disposto a fazer sacrificios consideraveis de modo a obter o bem. Mas nada disso permite extrair expressoes numericas cardinais, com as quais pudessemos operar e calcular e extrair medias. Para exemplificar isso, podemos notar que alguem poderia preferir uma banana a duas macas, e, ao mesmo tempo, dentro da mesma escala de preferencias, preferir, quatro macas a duas bananas, sem que com isso se crie qualquer tipo de inconsistencia. Isso quer dizer que numa determinada configuracao de seu estoque de macas e bananas, o sujeito aceitaria sacrificar duas macas para obter uma banana, mas nao aceitaria sacrificar quatro macas para obter duas bananas. Ou seja, apos ter feito a primeira operacao, ele nao a faria novamente dado seu novo estoque, pois nesse caso ela seria considerada como uma diminuicao da sua satisfacao. O que seria inconsistente seria o sujeito, simultaneamente, preferir uma banana a uma maca, uma maca a uma laranja, e uma laranja a uma banana.

Feitas essas observacoes temos que o estabelecimento desses precos indices tendo por base a utilidade geral de bens e servicos e inconsistente, pois nao ha um metodo correto de calcular tais coisas.

Podemos contudo procurar formas mais adequadas, ainda que aproximativas e limitadas, de avaliar e observar tal fenomeno de crescimento da economia no metodo que os antigos analistas economicos utilizavam. Para eles, o quadro de crescimento de uma nacao ou regiao estaria expresso na variacao dos perfis de producao e consumo total de bens de producao industriais de ordem elevada, como aco ou acido sulfurico, ou outros insumos basicos da economia. Quando avaliadas evidentemente dentro dos contextos de cada situacao economica de emprego de bens de producao, essas informacoes seriam preciosas nas estimativas reais de crescimento economica, ja que tais insumos estariam na base dos processos industriais e comerciais subsequentes. Progressos nos processos produtivos demandariam por maiores quantidades desses insumos, que seriam entao produzidos mais intensamente, com a instalacao de novas usinas e polos de extracao, ou com a importacao dos mesmos. Como essas empresas exigem pesados investimentos em capital e o seu retorno costuma ser de longo prazo, elas estariam mais imunes a qualquer disturbio monetario (como politicas de "credito barato") provocado pelo governo e que causasse euforias efemeras nos setores errados da economia. Apenas o crescimento sustentado, unicamente atraves da poupanca de capital, motiva o desenvolvimento desses setores, e um dos sintomas caracteristicos de booms causados por politicas monetarias seria a formacao de enormes filas de empresas esperando avidamente pelos insumos dessas industrias, que por sua vez nao ampliaram as suas producoes nesses surtos de euforia. Afinal, apesar do que dizem os "calculos de mercado" desses empresarios afobados pelo boom inflacionario, o capital nao cresceu com a expansao monetaria ou crediticia, logo a realidade de escassez permanece la, ate que alguem resolva se dar conta disso e todos perceberem que nesse periodo estavam perdendo dinheiro, e nao ganhando. Mesmo que indices como PIB ou o saldo da balanca comercial digam o contrario. Tratarei dos aspectos mais sutis desses processos inflacionarios mais adiante, esta foi apenas uma digressao para explicar a conveniencia de metodos de avaliacao de produca reais, ao inves de simples analises de transacoes monetarias, que podem sofrer falsificacoes governamentais em processos de inflacao.

E claro que a escolha dos itens base para estimar o crescimento economico de um pais dependera do papel que esse se prestara na divisao internacional do trabalho. Se um pais tem poucas industrias pesadas desse genero, outros bens de producao de ordem elevada, ou outros dados quantitivos reais relativos a producao e o consumo em niveis nacionais poderiam ser empregados para essa analise, sempre apos de uma cuidadosa observacao de suas caracteristicas particulares dentro daquela conjuntura. E um metodo aproximativo e sujeito a erros tambem, alem de ter a necessidade de ser adaptado com o tempo as mudancas ocorridas nas tecnologias de producao. Mudancas nos cenarios de fontes energenticas preferenciais, aparecimento de novos insumos importantes (como os materiais plasticos e os demais derivados do petroleo no ultimo seculo), metodos industriais mais eficientes e que aproveitem melhor os insumos disponiveis ou reciclem aqueles que ja teriam sido consumidos de forma economica tambem deveriam ser considerados. A interpretacao historica sera sempre necessaria para se ter uma ideia correta dos fenomenos de crescimento de riqueza, sem incorrer em erros de natureza contabil decorrentes de uma moeda que porta uma informacao viciada sobre a realidade de escassez de recursos economicos e a forma como os agentes os valorizaram na economia de mercado.

Somada a essas informacoes gerais da economia de base, poderiam ser feitas estatisticas sobre as modificacoes do perfil e poder de consumo e poupanca dos individuos, e com base nelas e em suas variacoes calcular (ou ao menos estimar) o real crescimento economico. O que normalmente acaba sendo feito e o contrario: metodos espurios de contabilidade sao empregados para gerar um saldo de crescimento ficticio, dado numa moeda falsificada, e cuja realidade de crescimento se manifesta de forma completamente oposta. E tais metodos espurios de crescimento meramente contabil determinam proposicoes completamente fantasiosas, como por exemplo quando voce propos que o acumulo de capital por poupanca nao teria um papel fundamental no crescimento economico, quando o proprio e, na pratica, o crescimento economico em si.

O que vemos sao situacoes ridiculas, como a da Venezuela atualmente, onde o enorme "crescimento economico" de quase dois ou mais de dois digitos por ano do PIB do pais, durante anos a fio nao aumentou em nada o nivel de vida da populacao e seu poder de consumo (mesmo com as politicas de distribuicao do governo tendo reduzido as "desigualdades sociais", que de outra forma seriam acusadas de usurpar tal riqueza adicional), sendo mesmo escassas mercadorias basicas como alimentacao geral. Fenomenos de "crescimento" similares foram registrados na URSS, e na epoca levaram inclusive a inumeras especulacoes sobre o inevitavel momento onde os russos superariam os americanos economicamente. No final, deu no que deu, e continuara dando no que costuma dar.




Huxley escreveu:Esse raciocínio que você colocou não é válido num mundo onde exista equilíbrio geral walrasiano, como é o caso do modelo de Solow e suas variantes.

Se um governo tentasse manter o estoque nominal de moeda constante diante de um contexto de veloz crescimento do produto potencial, a demanda agregada e o nível geral de preços iriam cair de forma absurda. No longo prazo, um nível de produção efetiva abaixo do nível potencial significa um excesso de oferta de mão-de-obra no mercado de trabalho. Isso faz diminuir o salário nominal de equilíbrio. A diminuição da massa salarial faria diminuir a demanda transacional por moeda, e como a oferta de moeda é tida como dada, o estoque REAL de moeda - estoque nominal de moeda dividido pelo nível geral de preços - aumentaria. Esse fato traria como conseqüência a diminuição da taxa de juros real. Isso aumentaria o investimento, a demanda agregada, a produção, o nível de emprego (com efeito multiplicador, etc.) até que a produto efetivo se iguale ao produto potencial. Em equilíbrio geral, o sistema de preços sempre garante que, no longo prazo, o nível de produto efetivo atinja o nível de produto potencial SEM DEFLAÇÃO.


Huxley escreveu:Idem ao caso anterior. Se o governo dobrasse o estoque nominal de moeda, ele geraria uma baita inflação, levando a um AUMENTO na taxa real de juros, gerando uma recessão que abortaria o processo de duplicação de preços pretendido. Você está partindo do pressuposto totalmente errado que o equilíbrio no mercado de bens e serviços e o equilíbrio no mercado monetário NÃO SÃO interdependentes.


Huxley escreveu:Realmente necessita de comprovação empírica é a sua afirmação de que o equilíbrio no mercado de bens e serviços e o equilíbrio no mercado monetário NÃO SÃO interdependentes.



Um mundo em equilibrio geral walrasiano e uma economia uniformemente circular, onde os recursos disponiveis encontraram seus empregos mais eficazes tendo em vista a estrutura da oferta e da demanda. Nao ha alocacao alternativa superior, nao ha poupanca que nao vise repor os recursos consumidos durante o processo de producao, logo nao ha aumento de capital, as proprias pessoas nao se reproduzem mais do que morrem nem mudam suas escalas de preferencia individual que definiriam a estrutura de oferta e demanda.

Um mundo em equilibrio geral walrasiano e o estado para o qual o mercado converge a cada momento, mas o unico lugar onde esse mundo existe e na imaginacao do economista. A economia real nao esta em equilibrio, e jamais alcanca tal equilibrio pois os dados mudam a todo momento, e essas mudancas implicam em novas situacoes de equilibrio assintotico. E evidente que meu argumento nao dizia respeito ao equilibrio geral, e sim a uma economia onde os recursos disponiveis podem ser poupados para o emprego em futuras alocacoes que melhorem a satisfacao dos individuos, de modo a existir o fenomeno de crescimento economico.

Sobre suas consideracoes acerca de meu exemplo, percebera que eu nao fiz hipoteses extras desnecessarias sobre um hipotetico mercado de credito, que poderia ou nao existir, nao afetando os resultados de meu raciocinio. Poderiamos considerar, que para efeitos praticos, o credito so poderia ser oferecido em especie ou em certificados de moeda, ou seja, notas bancarias que estivessem seguradas cem porcento por um deposito em especie, de forma que nenhum meio fiduciario (substitutos de moeda que nao estariam cobertos por um deposito em especie) poderia ser emitido ou destruido, e nenhuma inflacao ou deflacao poderia se produzir. A ideia era de simplesmente contestar a validade de uma analise exclusivamente monetaria do crescimento economico. Mas a sua resposta contem um apanhado de incompreensoes e falacias populares e exige uma desmistificacao atenciosa.

Nestas hipoteses, suponhamos que a moeda seja o ouro, para evitar qualquer tipo de abstracao desnecessaria. Quais seriam os efeitos de uma perda fisica de ouro (um navio carregado com metade do estoque de ouro de uma economia inteira afunda)? As perdas sofridas pelos proprietarios do ouro afundado seriam compensadas pelos ganhos em poder de compra daqueles que nao tiveram suas reservas afetadas pelo acidente. Simplesmente pelo ajustamento da oferta pela demanda. Menos dinheiro competindo num mercado de bens que permanece fixo em quantidades disponiveis.

E claro que as consideracoes dos individuos beneficiados pela perda alheia afetariam o mercado de maneira assimetrica: alguns produtos, num primeiro momento, teriam seu preco em ouro reduzido mais que proporcionalmente enquanto outros menos, pois alguns produtos perderiam mais consumidores que outros. Mas, de um modo geral, o poder de compra da unidade monetaria dobraria.

Consideracoes analogas sao validas, num sentido inverso, caso um carregamento de ouro duplique o volume de moeda de uma economia. Alias, tal fenomeno se produziu na Europa, quando Espanha e Portugal, influenciados pelas doutrinas mercantilistas vigentes na epoca, iniciaram seus processos de exploracao metalista e inundaram os mercados europeus com ouro e prata extraidos das colonias. O poder de compra desses dois metais sofreu substancial queda. As pessoas nao ficavam mais ricas porque havia mais ouro na sociedade, o ouro e que passava a ser menos escasso e podia ser trocado por menos coisas. E claro que o processo nao se deu de forma homogenea, na verdade a riqueza foi transferida dos que possuiam encaixes em ouro antes dessas exploracoes, para os exploradores que aportaram com o ouro adicional (os donos das minas, os proprietarios dos navios mercantes, assim como os prototipos de Estado representados pela aristocracia iberica).

A sua analise da sequencia de eventos que sucederia caso o estoque de moeda se mantivesse livre da intervencao estatal (seja ela de carater inflacionario ou deflacionario) demonstra a tipica confusao mental que acomete todos que manuseiam agregados economicos sem fazer a devida atencao a realidade que eles deveriam estar representando, ou seja, a acao e decisao dos individuos na economia de mercado.

A comecar por atribuir o nome de deflacao a queda geral de precos decorrente da manutencao do estoque de moeda numa realidade de crescimento do numero de bens disponiveis. A queda de precos existe, mas a ela nao se pode chamar deflacao, pois deflacao e o nome da politica empregada pelos governos de contrair a moeda atraves do recolhimento e supressao de meios fiduciarios emitidos previamente. Ela pode ser feita atraves de pagamentos dos valores de face desses meios, como por exemplo, a Inglaterra fez ao tentar reverter as politicas inflacionarias que empregou nos periodos das guerras napoleonicas e da primeira guerra, restaurando a paridade entre a libra-esterlina e o ouro, uma medida consideravelmente cara para os cofres publicos, ou pode ser feita simplesmente atraves do calote puro e simples, como no governo de Gorbachev, na extinta URSS, quando a cupula sovietica considerou que o "excesso de rublos" poderia ser reduzido substancialmente se num dado momento as notas bancarias acima de um determinado valor passassem a ser consideradas ilegais e nao mais pudessem ser aceitas como meios de troca. Essa medida deflacionaria, por sua vez, nao custou nada para os cofres publicos num primeiro momento, e nos faz lembrar do nosso "tao bem fadado" plano Collor.

Mas nao e disso que estamos tratanto. Estamos tratando de uma economia que cresce em bens mas cujo estoque de moeda se ve estagnado, e os efeitos que se produziriam na producao geral e na taxa de juros.

Antes de mais nada, convem salientar que o fenomeno de juros originarios nada tem de monetario. Ele nada mais e do que a diferenca de valoracoes que um individuo da a uma mesma disponibilidade de consumo ou poder de compra, caso ela exista no presente momento ou se manifeste apenas numa determinada data no futuro. A esse fato os economistas chamam de preferencia temporal. Ter uma banana, ou a possibilidade de adquirir uma banana agora e diferente de saber que tera tal banana ou tal possibilidade de adquiri-la amanha. Ao abrir mao de uma banana hoje, esperamos que a remuneracao futura em termos de banana seja superior a diferenca que atribuimos entre possuir uma banana no presente e uma banana no futuro.

Essa e uma categoria fundamental da acao humana, e uma consideracao que todo agente faz leva em conta o fator tempo. Uma elevada preferencia pelo presente traduziria-se numa alta taxa originaria de juros, pois as pessoas trocariam o consumo presente apenas por substanciais aportes no poder de consumo futuro. Existe uma correlacao intuitiva, embora nao seja categorica, entre a preferencia pelo presente e a nocao de grau de satisfacao das necessedidades imediatas: quanto mais um individuo estiver satisfeito em relacao as suas necessidades imediatas, mais tempo ele aceitara esperar, privado de um determinado poder de consumo, por um aumento no seu poder de consumo futuro. Isso pode ser traduzido na frase: quanto maior o poder de consumo, maior a propensao de destinar uma parte desse poder para aumentar o consumo futuro sob a forma de poupanca. Esse fenomeno explicaria a tendencia dos paises mais desenvolvidos de possuirem taxas basicas de juros menores que os paises menos desenvolvidos, onde as carencias dos individuos fariam com que as pessoas destinassem maior atencao a satisfacao das necessidades presentes.

Essa e a origem do fenomeno juro real que e percebido pelo mercado. Existe ainda a componente empresarial do juro, que decorre da avaliacao feita pela empresa de credito do risco que ela corre de nao receber, na data estabelecida para o vencimento, o montante emprestado.

Na economia onde nao ocorresse expansao monetaria financiada pelo governo, a taxa de juro iria expressar corretamente essa preferencia pelo presente. Assim, as pessoas teriam perfeitas condicoes de calcular a viabilidade dos projetos, a partir das inclinacoes dos consumidores e poupadores (que sao as mesmas pessoas) e menos desperdicios seriam feitos. Sem alteracoes de carater monetario, o juro seria exatamente o que cada um estaria aceitaria receber a mais para esperar um pouco mais, alem da componente de risco empresarial. Isso permitiria um calculo economico correto para os empresarios que contraem dividas, e a economia se desenvolveria sem sobressaltos, ainda que preservasse uma tendencia natural de queda de precos decorrente do aumento da quantidade de bens disponiveis, que aumentariam a satisfacao dos individuos, que diminuiriam a taxa de preferencia pelo presente, e que aumentariam a inclinicao dos mesmos para investir no futuro. O ciclo gerado seria virtuoso, e a queda dos precos e das taxas de juro nos seus valores nominais seria apenas a demonstracao do crescimento economico num ambiente de estabilidade monetaria.

A queda dos precos nao seria extremamente "rapida ou lenta", mas inversamente proporcional a preferencia pelo presente. E de nada valem as consideracoes a respeito da rigidez para baixo dos salarios e precos, essas sao condicoes institucionais decorrentes de uma situacao que no geral e contraria, onde prevalece a tendencia do governo de aumentar a massa monetaria, atraves da expansao do credito.

Elas decorrem de uma situacao completamente diferente e do decorrente ajustamento do comportamento das pessoas, sindicatos e patroes a essa logica inflacionaria. Alem disso, tanto numa dinamica de queda de precos quanto de alta de precos, as pessoas interessam-se apenas pela conservacao e ampliacao de sua capacidade de consumo. Pode ate acontecer, como previu Lorde Keynes, que num dado momento de recessao decorrente de salarios reais muito altos, uma politica inflacionaria permita corrigir essa diferenca real entre o salario nominal das pessoas, que permaneceria fixo num primeiro momento, e o nivel de precos, sem que isso incomodasse os sindicatos que se posicionam sempre contra reducao de salarios. Essa estrategia pode enganar os sindicatos uma vez, mas logo eles aprendem que nao devem apenas impedir a queda dos salarios, mas exigir a correcao monetaria do valor dos salarios correspondente a inflacao, de modo a conservar o poder de compra dos trabalhadores. A grande sacada de Maynard Keynes para aumentar o emprego foi apenas uma forma de subestimar a perspicacia dos sindicalistas na requisicao e exigencia de privilegios, uma forma de fazer alguns ajustes necessarios sem lidar com o verdadeiro problema, que e sempre o excesso de poder que os sindicatos tem para brutalizar a propriedade privada dos patroes, os clientes e os outros trabalhadores que furam suas greves e nao aderem a suas reivindicacoes.

Terminada a digressao, quando o governo afeta o mercado de credito de forma inflacionaria, num primeiro momento, pode haver queda na taxa bruta de juros, simplesmente porque o mercado de credito foi o primeiro a contar com a liquidez monetaria injetada na economia. As pessoas passam a considerar que a queda na taxa de juros representa uma preferencia pelo presente menor, que as pessoas estao mais satisfeitas com sua condicao presente e por isso existe mais capital que seria investido em projetos futuros.

Contudo, nada disso nao quer dizer que ao reduzir a taxa de juros artificialmente, um governo estaria tornando seu pais mais desenvolvido. Isso decorre de uma ma compreensao do fenomeno de juro e de como ele se relaciona com a realidade de escassez da maneira como ela e percebida pelos agentes economicos reais, os individuos. O ato de alterar a taxa de juros mediante expansao de credito tem como efeito apenas falsificar a moeda, que nao traduz corretamente as relacoes de escassez e os precos da economia, sobretudo a taxa de preferencia pelo presente que decorre deles, de modo que o emprego de metodos de calculo efetuados pelos empresarios em termos dessa moeda passam a ser gravemente distorcidos. Projetos ruins do ponto de vista dos consumidores passam a ser considerados lucrativos e interessantes, do ponto de vista do calculo errado dos produtores. Maiores tempos de producao sao admitidos, pois paira uma compreensao equivocada da preferencia pelo presente atraves de uma taxa de juros falsa. As pessoas, por sua vez, continuam a consumir de acordo com a sua preferencia normal pelo presente, pois esta nao pode ser alterada por medidas monetarias governamentais, de modo que nao existe poupanca que banque os investimentos nos novos projetos, que sao feitos, sem que haja percepcao disso num primeiro momento, por meio do consumo do capital existente ja empregado ou que seria empregado em outros processos produtivos, que caso os calculos dos empresarios nao estivessem viciados pela inflacao, seriam considerados mais vantajosos pelos consumidores. Os relatorios contabeis e monetarios revelam crescimentos ficticios, assim como os relatorios da economia nacional nesse periodo. Todos falam de prosperidade, quando na verdade, apesar dos recursos fisicos e humanos estarem sendo empregados, o estao de forma a consumirem-se a si proprios em projetos errados, que nao se pagarao. As pessoas estao ficando pobres e consumindo seu capital, mas acham que seu modo de vida esta aumentando. Essa maquina de prejuizo continua rodando enquanto a expansao de credito seguir, mas num dado momento ocorre a percepcao de que na verdade nao se esta criando riqueza, que os relatorios estao viciados, que os precos estao mais altos e que as pessoas estao mais pobres. Ocorre o "crack". As pessoas se deparam com a realidade na qual consumiram capital e agora nao ha poder de compra para os estoques criados nos precos que tornariam sua venda economicamente viavel. Precos despencam, pessoas sao demitidas de seus trabalhos, capitalistas arruinados se jogam das janelas de seus enormes e perdularios arranha-ceus. Ninguem compreende exatamente porque os precos estariam caindo tanto, qual e a origem do crack, mas apenas sabem que nao conseguirao pagar os recursos que empregaram nos seus projetos e por isso precisam fazer cortes substanciais ou mesmo encerrar suas atividades. A recessao ajusta os calculos economicos de modo que eles reflitam melhor a realidade do mercado, mas isso nunca se da sem traumas.

Essa e a explicacao da teoria dos ciclos economicos para a dinamica inflacionaria que gera periodos de aparente crescimento e euforia e alta de precos seguidos de depressoes profundas. Nao e necessario apelar para nenhum fenomeno mistico, tal qual a irracionalidade subita dos agentes. Os agentes sao racionais, mas os dados que eles utilizam para calcular e raciocinar a producao sao fraudulentos. A moeda e o juro foram falsificados pelo governo de modo a parecerem mais atrativos para determinados projetos, mas projetos nao se pagam com papel, mas com recursos humanos, fisicos, com tecnologia e com confianca geral na sua viabilidade em termos de custos e interesse dos consumidores. O governo nao tem poder sobre nada disso realmente, a unica coisa que ele pode fazer, num sistema de atividade bancaria centralizada, e alterar unilateralmente o valor dos documentos e falsificar as taxas que, numa economia desobstruida, traduziriam esses dados e permitiriam as pessoas o calculo economico, ou seja, compreender e escolher corretamente os projetos em que devem se engajar. E claro que empresarios podem errar seus calculos economicos mesmo quando alimentados com dados de boa qualidade, derivados de um ambiente institucional serio, numa economia de mercado desobstruido. Eles podem porque todo empresario especula quais serao as valoracoes futuras dos individuos, e nesse processo eles podem errar e podem acertar. Mas quando todos os empresarios estao errando, so resta duas possibilidades: todos ficaram irracionais ou existe algum problema nos dados que empregam nos seus calculos. Uma delas consiste em negar completamente a economia e a racionalidade dos agentes, a outra consiste em enxergar o problema real.

Vou terminar essa resposta longa resposta com breves comentarios sobre a atividade bancaria livre, e o porque da sua superioridade. Um banco e, a principio, uma empresa que oferece os servicos de deposito monetario. Sao procurados por pessoas que querem transformar sua quantidade de dinheiro em especie (moedas e barras de ouro, no padrao-ouro), por notas bancarias ou contas-corrente sacaveis mediante cheques. O banco assegura ao portador da nota bancaria ou do cheque a correta conversao pelos valores de face, caso seja interesse deles realizar saques em especie. Mas, na medida em que suas notas bancarias ganham maior aceitacao no mercado e passam a ser admitidas como substitutos de moeda, e seus cheques nao sao descontados em especie, mas depositados em contas correntes, os bancos percebem que boa parte do seu estoque em ouro nao precisa ser empregada nas operacoes de reembolso que garantiriam sua solvencia. Ele entao utiliza esse excedente em relacao as operacoes diarias para "lastrear" suas operacoes de credito e investimento: o banco emite notas bancarias sem qualquer correspondente em ouro, ou cria contas correntes, para oferecer credito mais barato para outros clientes, ou para realizar seus proprios investimentos. Faz isso pois sabe que, mesmo assim, a quantidade adicional de saques em especie podera ser garantida pelo suprimento ja existente e nao utilizado de seus cofres. A confianca na propria solvencia permite ao banco realizar esse tipo de operacao, mas ao fazer isso ele assume um risco consideravel. Isso porque os estoques em nota bancaria guardados pelos individuos no mercado, ou seja, a proporcao de seus encaixes que corresponde as notas emitidas pelo banco, so aumentara mediante um aumento na confianca geral da solvencia daquela instituicao. Caso contrario, se houvesse suspeita de que o banco estaria operando atividades inflacionarias e comprometendo seriamente sua solvencia, as pessoas que receberiam as notas bancarias adicionais as descontariam depressa, e o banco veria o risco de perder sua solvencia se realizar. Essa tendencia de desconto ja estaria inerte na propria conduta das pessaos que receberiam as notas adicionais em virtude das operacoes comerciais realizadas, pois elas nao necessariamente seriam clientes do banco e teriam interesse em guardar essas notas.

Esse e o meio que o mercado encontra para controlar os bancos. Era a isso que J. P. Morgan se referia quando dizia que o seu negocio era a "confianca". Esse sistema permitiria, por exemplo, numa economia onde a producao crescesse, que os meios fiduciarios acompanhassem tal crescimento naturalmente, escorados na tendencia das pessoas de nao diminuir seus estoques monetarios. Isso manteria os precos relativamente altos, mas se os bancos nao aumentassem suas reservas, com ouro adicional, eles teriam que estar bastante seguros de que a confianca na sua solvencia permitiria essas expansoes de credito.

Nada disso e verdade num sistema de bancos centrais, onde uma agencia estatal controla a atividade bancaria e o credito, de modo que os banqueiros capitalistas sejam apenas subordinados as suas politicas. Se for conveniente para a politica central emitir dinheiro ou liberar credito, numa epoca de guerra ou para evitar o desemprego, sem se preocupar com a sua solvencia, ela fara. E obrigara as pessoas a usarem seus meios fiduciarios adicionais injetados na economia, proibindo saques em ouro, determinando uma moeda fiat de curso legal, a qual elas poderao alterar a seu bel-prazer. Podem isso simplesmente porque tem poder para coagir as pessoas, a faze-las aceitar as leis que determinam, que de outro modo, elas nao aceitariam por saber que seria em seu prejuizo. Essa e a maquina de inflacao estatal, que esta na origem do processo de ciclos economicos descrito acima.

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Huxley
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Re: Distribuição de riquezas e pagamento de Impostos

Mensagem por Huxley »

user f.k.a. Cabeção escreveu:Por exemplo, digamos que temos os precos de todas as mercadorias e servicos expressos em bananas. Poderia a variacao desses precos, ou dos valores totais das quantidades de mercadorias calculadas sobre esses precos, exprimir algo de necessariamente valido sobre a realidade de crescimento economico?

E a resposta e negativa. Se o estoque de todos os itens crescesse, exceto o de bananas, de modo que no momento futuro seguinte tivessemos o dobro de bens, houve certamente um crescimento economico de aproximadamente duas vezes (desconta-se o efeito da estagnacao da oferta de bananas). Ainda assim os precos em termos de bananas, se somados, de todos os bens permaneceria identico, se fizermos a suposicao adicional de que as pessoas nao pretendem nem aumentar nem reduzir seu estoque de bananas particular.



Cada vez que você tenta desmerecer os agregados estatísticos, mais você se complica. Essa agora, então, foi o cúmulo. Não existe preço em “termos de bananas” por uma razão muito simples: ninguém vive só de banana! Quando os economistas vão calcular o salário real médio de um grupo de trabalhadores, ele calcula seu valor dividindo o salário nominal pelos preços de uma cesta de mercadorias, não pelos preços de uma mercadoria em particular.


user f.k.a. Cabeção escreveu:Para exemplificar isso, podemos notar que alguem poderia preferir uma banana a duas macas, e, ao mesmo tempo, dentro da mesma escala de preferencias, preferir, quatro macas a duas bananas, sem que com isso se crie qualquer tipo de inconsistencia. Isso quer dizer que numa determinada configuracao de seu estoque de macas e bananas, o sujeito aceitaria sacrificar duas macas para obter uma banana, mas nao aceitaria sacrificar quatro macas para obter duas bananas. Ou seja, apos ter feito a primeira operacao, ele nao a faria novamente dado seu novo estoque, pois nesse caso ela seria considerada como uma diminuicao da sua satisfacao.


Esse “problema” do preço em um contexto onde a utilidade só pode ser mensurada cardinalmente já foi demonstrado irrelevante por Stanley Jevons. O valor da soma total de utilidades de um estoque de mercadorias de mesma espécie é dado pela soma total das utilidades marginais de cada mercadoria, não pela utilidade marginal da última mercadoria adquirida multiplicada pela quantidade de mercadorias, como pensava Menger. Se eu tenho cinco maçãs compradas, e supondo que a utilidade da primeira será 5 da segunda será de 4, e assim por diante, então a soma total das utilidades será de 15 (diferentemente de Menger, que diria que seria 5). Pegue um exemplo onde as utilidades marginais das bananas sejam de, respectivamente, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 e a utilidades marginais das maçãs sejam de, respectivamente, 5, 4, 3, 2, 1. O paradoxo “aceitar sacrificar duas maçãs para obter uma banana, mas não aceitar sacrificar quatro maçãs para obter duas bananas” pode acontecer na teoria de Menger, mas não na de Jevons. É só fazer os cálculos.

Ainda na teoria de Jevons e Marshall, o indivíduo não recebe apenas o bem que compra, mas ganha de brinde o chamado “excedente do consumidor”, que corresponde à diferença entre o montante que o consumidor estaria disposto a pagar por um bem e aquele que paga na realidade.

Tanto Jevons, Marshall e Walras entendiam a utilidade como portadora de uma característica subjetiva, mas que nem por isso deixa de poder ser traduzida matematicamente, já que utilidade acaba por ser refletida no preço. Praticamente todos os economistas pensam da mesma maneira que eles.

user f.k.a. Cabeção escreveu:O que vemos sao situacoes ridiculas, como a da Venezuela atualmente, onde o enorme ‘crescimento economico’ de quase dois ou mais de dois digitos por ano do PIB do pais, durante anos a fio nao aumentou em nada o nivel de vida da populacao e seu poder de consumo (mesmo com as politicas de distribuicao do governo tendo reduzido as ‘desigualdades sociais’, que de outra forma seriam acusadas de usurpar tal riqueza adicional), sendo mesmo escassas mercadorias basicas como alimentacao geral. Fenomenos de ‘crescimento’ similares foram registrados na URSS, e na epoca levaram inclusive a inumeras especulacoes sobre o inevitavel momento onde os russos superariam os americanos economicamente. No final, deu no que deu, e continuara dando no que costuma dar.



Está errado o que você postou. A Venezuela recentemente apresentou crescimentos de 7 a 8%, mas durante a queda do preço do petróleo chegou a ter contrações superiores a 10% do PIB. Ela só está se recuperando da caída para o fundo do poço que atingiu em 2003. Com a taxa de inflação superior a 40%, é claro que as coisas funcionam com se tamanho crescimento não existisse para a maior parte da população pobre (quer dizer, ou não, as estatísticas oficiais de lá falam em redução da pobreza de 2003 para cá). Mas os recursos reais não somem, eles ficam concentrados nas mãos daqueles que podem se proteger da inflação, como os capitalistas. A taxa de inflação também mede o nível de bem-estar.

E o crescimento da União Soviética de 1917 até a década de 80 nunca foi uma maravilha, haja vista a discrepância do PIB per capita da mesma em comparação ao dos EUA. E também não se deve esquecer que o tamanho da carga tributária e a forma de distribuição dos tributos num país socialista torna inadequado a comparação do nível de bem estar da população a partir de tal indicador.




user f.k.a. Cabeção escreveu:Mas nao e disso que estamos tratanto. Estamos tratando de uma economia que cresce em bens mas cujo estoque de moeda se ve estagnado, e os efeitos que se produziriam na producao geral e na taxa de juros.

Antes de mais nada, convem salientar que o fenomeno de juros originarios nada tem de monetario. Antes de mais nada, convem salientar que o fenomeno de juros originarios nada tem de monetario. Ele nada mais e do que a diferenca de valoracoes que um individuo da a uma mesma disponibilidade de consumo ou poder de compra, caso ela exista no presente momento ou se manifeste apenas numa determinada data no futuro. A esse fato os economistas chamam de preferencia temporal. Ter uma banana, ou a possibilidade de adquirir uma banana agora e diferente de saber que tera tal banana ou tal possibilidade de adquiri-la amanha. Ao abrir mao de uma banana hoje, esperamos que a remuneracao futura em termos de banana seja superior a diferenca que atribuimos entre possuir uma banana no presente e uma banana no futuro.


Não há absolutamente NENHUMA maneira pela qual a economia pudesse duplicar a produção de bens e o estoque de moeda permanecesse estagnado. Se a economia cresce, as pessoas demandarão mais moeda por motivo transação, e os bancos acomodarão tal demanda. Caso não saiba, essa é conclusão de teóricos neoclássicos da Teoria Quantitativa da Moeda, que também acreditavam na idéia que a taxa de juros era determinada pela preferência intertemporal dos indivíduos. E nem adianta citar a teoria dos ciclos de Mises-Hayek porque, caso não saiba, ela é inspirada na teoria de Knut Wicksell, onde a taxa natural de juros é definida como o preço de equilíbrio entre a oferta e demanda por poupança (mercado de fundos emprestáveis) e onde a única função essencial da moeda é servir como meio de troca.

Essa é uma questão simplesmente de aritmética:

MV PT
M = estoque nominal de moeda
V = velocidade de circulação da moeda
P = índice de preços doméstico
T = número de transações.

É muito comum, porém, encontrar uma versão ligeiramente diferente:

MV = PQ, onde Q é o PIB real e onde V passa a significar agora a velocidade-RENDA de circulação da moeda. Para passar da primeira à segunda versão, admite-se que o volume de transações T seja proporcional ao PIB real Q.

V é dado como aproximadamente estável no longo prazo (como mostram os trabalhos de Friedman e de outros monetaristas), então o que você pôs não faz o menor sentido. Basta citar um exemplo hipotético para compreender isso. Veja que se M. V= P.T for “60. 2 = 4. 30” e se o T passar para de 30 para 60, como M é dado como estável no seu exemplo, então, obrigatoriamente o P deverá cair para 2.

Ok, o estoque nominal de moeda ficou estável. Mas o que interessa numa análise econômica é o estoque REAL de moeda e não o estoque nominal. Isto é, o que interessa é o M/P, não o M. E no meu exemplo, o M permanece em 60, mas o M/P salta de 15 (60/4) para 30 (60/2). A única forma de seu raciocínio se tornar crível seria se alguém demonstrasse que a identidade contábil mais conhecida e aceita da economia monetária alguma vez fracassou por uma margem incrivelmente grande. Se isso acontecesse, seria uma novidade análoga a demonstrar num experimento que a força gravitacional é inversamente proporcional ao cubo da distância.


user f.k.a. Cabeção escreveu:Alem dessas consideracoes a respeito da realidade geral dos fenomenos, e preciso estar ciente de que, antes de mais nada, numa economia de mercado, quem age, escolhe, prefere, sao sempre seres humanos individuais e distintos, e nao classes sociais, racas, nacoes ou outros coletivos abstratos. Nao existem "metas da sociedade", "bem estar geral", e outras manifestacoes e apreciacoes coletivas que nao sejam apenas um catalogo de cada um dos sentimentos e acoes individuais separados, dos quais uma medida geral ou coletiva e simplesmente absurda.



Deixei esta citação para o final para enfatizar a minha insatisfação com a esterilidade intelectual ao qual estão submetidos os seguidores desse individualismo que simplesmente ignora aspectos valiosos da vida humana que não sejam “utilidades” (satisfações, direitos, oportunidades reais etc.) e acham que aspectos sociais não têm relevância em discussões de economia normativa. Um exemplo fictício que impõe um paradoxo a essa vertente de pensamento poderia ser imaginado no caso de um país com só dois habitantes, onde os mesmos moram perto de dois oásis distantes um do outro. No primeiro, a sua fonte de água seca e o segundo só aceita fornecer água para o primeiro a preço barato se o mesmo se sujeitar a trabalhar como escravo. No individualismo ingênuo, isso seria legítimo porque a desutilidade do trabalho escravo se iguala a utilidade que o indivíduo atribui em manter-se vivo. Claro que esse é um exemplo extremo e exagerado. Mas isso é para abrir os olhos daqueles que acham que essa coisa de “bem-estar social” é balela.

É claro que o indivíduo deve tomar lugar de destaque na obtenção do equilíbrio social. No entanto, o papel dos fatores sociais não é deixado de lado. A prova disso pode ser encontrada na leitura recente de Kenneth Arrow (o pai da economia neo-walrasiana), onde é discutida a pertinência dos fatores sociais nas estruturas metodológicas individualistas:

Arrow, K. (1994). Methodological individualism and social knowledge. The American Economic Review, v. 84, n. 2. [2] Box, Geo.

Willian Shakespeare, em “Troilus and Cressida”, Ato 2, Cena 2, já havia realizado tal discussão:

Hector: She is not worth what she doth cost the keeping.
The hothead, Troilus: What's aught save as 'tis valued?
Hector: But value resides not in particular will.

Por outro lado, um economista austríaco já disse que o laissez-faire significa: “deixem os indivíduos escolherem de que maneira desejam cooperar na divisão social do trabalho.”

Porém, na abordagem de Arrow, é uma ilusão não acreditar que o coletivo não pode ter regras próprias de funcionamento e uma racionalidade diferente das individuais. Gustavo Franco já deu um exemplo disso num artigo onde citava o Teorema da Impossibilidade de Arrow:

“Se um indivíduo vê uma árvore carregada de frutos e outra quase vazia, a racionalidade individual diz que este indivíduo subirá na árvore carregada; no entanto, na racionalidade coletiva não há como prever se todos subirão na árvore carregada, já que a decisão coletiva prejudica o indivíduo.”

É com esta citação que encerro esta rodada de discussões.
“A boa sociedade é aquela em que o número de oportunidades de qualquer pessoa aleatoriamente escolhida tenha probabilidade de ser a maior possível”

Friedrich Hayek. “Direito, legislação e liberdade” (volume II, p.156, 1985, Editora Visão)

"Os homens práticos, que se julgam tão independentes em seu pensar, são todos na verdade escravos das idéias de algum economista morto."

John Maynard Keynes

Trancado