30/04/2009 - 19:37 - Atualizado em 30/04/2009 - 23:45
Um parto quase comumNascem os gêmeos do casal de lésbicas que sonham com o reconhecimento de ambas como mãesFrancine Lima
AMOR MATERNO
O casal Munira e Adriana antes e depois do parto. Elas lutam para se tornar mães com direitos iguais
Eduardo e Ana Luíza ainda nem tinham nascido e já tinham status de celebridade. Dentro da barriga de Adriana Tito Maciel, eram acompanhados passo a passo por câmeras de TV e jornalistas interessados em seu nascimento. O parto em si não teria nada de especial. Seria uma cesariana como outra qualquer, numa sala de cirurgia normal. A novidade no Hospital Santa Joana na noite da quarta-feira, em São Paulo, era a família de que esses bebês fazem parte. Em vez de uma grávida e um pai ansioso, havia ali uma grávida e uma “segunda mãe” ansiosa. Adriana e sua companheira, Munira Khalil El Ourra, a dona dos óvulos que deram origem aos gêmeos, querem ser legalmente reconhecidas como mães do casal de bebês. O caso foi revelado na reportagem
“Estou grávida da minha namorada”(ÉPOCA 565). A cesariana tinha sido marcada para as 21 horas, depois que um exame confirmou a necessidade de fazer o parto um pouco antes de a gestação completar 38 semanas. Na sala de espera estavam a mãe de Adriana, irmãos e irmã, cunhada, sobrinha e padrasto, a mãe e um irmão de Munira. “Essa família já é diferente, fundamentada no amor, e estou adorando a ideia”, disse Maria de Fátima Alves, mãe de Munira. “A Dri já não dorme há dias”, dissera Munira na véspera. “Esta é nossa última noite sozinhas. Depois, seremos quatro.”
No telão da maternidade, o nome de Munira, a doadora dos
óvulos, figurava no campo “nome do pai”
A equipe do hospital não precisou abrir exceções para aceitar Munira como responsável pela parturiente e acompanhante na sala de cirurgia. Era direito de Adriana escolher quem estaria a seu lado. Um documento registrado em cartório foi apresentado para comprovar a união estável, o que a rigor nem era necessário.
Às 21h25, Adriana estava na maca, acordada e já anestesiada. Munira sentou-se numa banqueta ao lado da maca e tratou de acalmar a companheira com carícias e sussurros. Adriana não sentia dores, apenas a movimentação do bisturi e dos dedos dos médicos. Cerca de dez minutos depois, Munira se levantou para ver a saída do primeiro bebê. Às 21h41, apresentou-se Eduardo, com 2.415 gramas e 47 centímetros. No minuto seguinte, veio Ana Luíza, com 2.750 gramas e 46 centímetros. Os olhos de Munira, em lágrimas, viam os filhos através da lente do celular até então com a enfermeira. Adriana, ainda sem ver os bebês, chorava também.
Foi tudo muito rápido. Pouco depois de pegar os bebês no colo, Munira já saía da sala, com o rosto vermelho. Do lado de fora, os parentes procuravam os donos de câmeras para ver as imagens em primeira mão. No telão da sala de espera, a ficha dos recém-nascidos só tinha uma peculiaridade: o nome de Munira aparecia no espaço reservado ao nome do pai – um indício de que algumas coisas talvez precisem mudar daqui para a frente.