Acauan escreveu:zumbi filosófico escreveu: Num dos posts acima uma das distorções que mencionei era justamente sobre quando um cientista falava das dificuldades de previsão dentro de um período relativamente curto como uma década.
Isso, diferentemente do que se poderia intuir, não compromete previsões em prazo mais longo (assim como a fragilidade das previsões meteorológicas de prazo ainda mais curto). Essas não são simplesmente meio como um monte de previsões meteorológicas "enfileiradas". Uma analogia, talvez não muito boa, talvez seja a diferença entre previsão de uma jogada individual num cassino, e a previsão de lucros do cassino. É na verdade muito mais difícil prever os resultados "micro" - com exceção de truques como contar as cartas, dados viciados e etc - do que o padrão "macro", que é de que a "banca sempre ganha", sem precisar de quaisquer trapaças.
Sua analogia é pior do que "não muito boa", é completamente inaplicável para o caso em questão.
Em um cassino as variáveis são poucas, conhecidas e obedecem às leis da probabilidade estatística, o que garante que quanto maior o número de repetições de um evento maior será o grau de acerto da previsão sobre seus resultados.
No clima as variáveis são potencialmente infinitas, não se sabe se as variáveis conhecidas são mais influentes que as ainda desconhecidas e as interações entre elas não necessariamente obedecem a padrões matemáticos e se obedecem estes padrões podem ser tão complexos que resulte em indeterminismo.
Eventos hoje considerados dos mais influentes no clima global, como El Niño são estudados a relativo pouco tempo, sendo que pouco depois de passarem a considerar a influência das correntes do Pacífico nas equações sobre clima, tiveram que cogitar um segundo personagem denominado La Niña, para explicar o que os primeiros modelos não conseguiam. O número de eventos influentes derivados ou correlacionados pode se estender indefinidamente.
No mais, mal sabemos o que causou as eras glaciais. Mesmo as teorias mais aceitas tem lacunas especulativas enormes. Se não sabemos o que causou as eras glaciais não é possível certeza de que uma outra não esteja a caminho, apesar das aparências.
Prá quem não lembra, ou não era nascido na época, poucas décadas atrás esta possibilidade de caminharmos para uma nova era do gelo chegou a ser cogitada por grupos de especialistas, de quem ninguém mais fala, como de regra nestas polêmicas.
A explicação geralmente dada é algo mais ou menos nas linhas de que, ainda que as variáveis climáticas no sentido da "previsão do tempo" cotidiana para um dado local na Terra sejam muitas, em longo prazo, as pricipais variáveis determinantes da temperatura média da Terra são substancialmente menos numerosas, sendo as principais a radiação solar e o gás carbônico.
Isso não assim pensado por não ocorrer a eles a possibilidade de outras variáveis, mas sim pelo descarte das alternativas concebidas, por não se encontrar evidências de que realmente sejam significativas, ao menos especificamente como explicação para o aquecimento observado recentemente.
Os cientistas não afirmam, de qualquer modo, que não existem incertezas diversas; contudo existem variados graus de certeza e incerteza, não apenas certeza absoluta e incerteza; então mesmo com todas as ressalvas que se pode fazer sobre a incipiência desses estudos, a coisa não equivale a um palpitão, que qualquer um poderia fazer com igual valor preditivo, diferentemente do que algumas vezes é sugerido, ainda que acidentalmente, com esse tipo de ressalvas, muitas vezes colocadas como se os cientistas ignorassem completamente a complexidade envolvida nos próprios estudos, como se estivessem "viajando" e qualquer um soubesse mais do que eles.
Quanto especificamente a questão de previsões de era do gelo nos anos 70, em mensagens acima postei duas vezes sobre isso. Longe de ser algo do qual ninguém mais fala nessas polêmicas, é algo freqüentemente levantado pelos que defendem o "ceticismo", com a sugestão implícita da lógica de que, se uma vez as previsões estavam erradas, estarão erradas sempre, e então não há razão em se preocupar, podemos ignorar os confusos cientistas (ou ao menos os climatologistas, no caso), que a realidade será certamente o cenário mais favorável.
Não só essa lógica é falha e levaria ao descarte de praticamente todo conhecimento científico (criacionistas tentam usar polêmicas em biologia para sugerir a invalidade da evolução de forma bem parecida), na realidade não houve, como alardeado por algumas personalidades políticas e repetido pelos partidários, uma consenso de que caminhássemos para uma outra era do gelo.
Na verdade, apesar de ter havido resfriamento na época (e por menor atividade solar, se não me engano), a maior parte dos estudos publicados em periódicos científicos já previa o aquecimento para as próximas décadas. Não apenas isso, mas o principal artigo científico citado pelos céticos como exemplo é sobre como a temperatura pode ser resfriada por aerossóis, e que o seu aumento poderia desengatar uma nova era do gelo. Talvez até houvesse a previsão explícita de que é o que os autores do artigo supunham que fosse ocorrer, mas ainda era condicional às taxas de emissão de aerossóis, não um erro grosseiro, como geralmente sugerido, uma espécie de previsão profética de algo que iria acontecer de qualquer forma. Não sei se as conclusões gerais, de que o grau de resfriamento sugerido de fato ainda é visto como potencialmente suficiente para desengatar uma era do gelo, ainda se mantém; mas sso é de qualquer forma pouco relevante, não é o caso onde um artigo, mesmo que completamente refutado (e/ou exagerado em suas alegações), invalidaria toda a pesquisa da área.
E segundo um dos vídeos, mesmo a mídia não especializada aparentemente tinha predominantemente matérias sobre aquecimento, sendo essa polêmica mais fabricação ideologicamente motivada e aceitação crédula do que uma descrição acurada das incertezas cientificas das últimas décadas, menores do que uns tentam fazer parecer.
Se tem algo de mais relevante sobre essa questão, se não é apenas essa aparente tentativa de minar aconfiabilidade sobre essa área da ciência (acompanhado da conclusão ilógica de que o clima então provavelmente continuará mais ou menos ideal, sem razão para preocupações), eu gostaria de saber. Não acompanho tanto esse assunto todo, mas me parece que se limita a isso.
Acauan escreveu:zumbi filosófico escreveu: Também calha de ser algo sobre o qual houveram muitas notícias nos anos 80, e do qual hoje se fala muito menos do que já se falou, não tendo havido nenhuma catástrofe que se esperaria ser decorrente de uma disseminação maior do vírus, como alardeado por aqueles que apontavam essa necessidade de contenção; as estimativas de incidência também foram admitidamente acima do que agora se avalia ter sido o caso; e finalmente, há infecção por HIV sem o desenvolvimento de AIDS, sendo isso a até regra em espécies próximas das quais se supõe ter vindo o vírus.
Sim. AIDS é outro caso notório de manipulação de informação, cujas campanhas não forneciam os dados científicos e estatísticos conhecidos sobre a doença, mas os filtravam com o objetivo de conter discriminação aos grupos de risco e incentivar o sexo seguro.
Um exemplo claro é que nos primeiros dez anos AIDS era uma doença predominantemente de homossexuais. Nos anos 90 ampliou-se a divulgação de dados mostrando que a AIDS se disseminava entre a população hétero, mas omitiam convenientemente que esta disseminação era predominante entre mulheres heterossexuais, mais vulneráveis ao contágio.
Nenhuma campanha pública destaca o fato científico de que a concentração de HIV na mucosa vaginal é muito pequena, o que reduz muito o risco de contágio do homem em uma relação vaginal.
O grande risco reside no sexo anal, quando há microrupturas dos vasos sanguíneos.
As autoridades de saúde decidiram que a divulgação deste fato desestimularia os homens ao uso do preservativo e daria à AIDS a conotação discriminatória de doença de sodomitas, enquanto a versão oficial era que o risco se aplicava igualmente a todos.
E sim, houve alarmismo no caso da AIDS.
Embora ninguém seja estúpido para negar os riscos da disseminação da AIDS, suas probabilidades epidêmicas foram tremendamente exageradas na época, uma vez que DST's seguem padrões de disseminação muito diferentes de uma gripe.
Nota: Antes que reclamem, outras formas de transmissão, como as transfusões de sangue, foram controladas com os testes sistemáticos e hoje as ocorrências se restringem às várias possibilidades de erro clínico.
O ponto todo é que a polêmica e mesmo argumentavel histeria sobre uma coisa não faz dela fundamentalmente errada. A relação AIDS e HIV é comprovada, e novamente, a "histeria anti-histeria" é que traz pontos mais fúteis. Gostam de levantar o ponto de "doença dos homossexuais", levantando a menor possibilidade dos homens contraírem aids no sexo vaginal, não apenas ignorando que as mulheres não tem a mesma sorte no sexo heterossexual (ou mesmo homens, se for sexo anal), como ignorando as mulheres homossexuais totalmente (o grupo de menor risco), bem como negligenciando talvez o ponto principal, de que a maior parte dos homossexuais é bissexual. Ou seja, é uma política de saúde pública mais segura dizer basicamente que o risco é independente de se ser hetero ou homossexual, em vez de tentar expor todas as minúcias epidemiológicas, especialmente se vão aumentar as chances de fazer com que homossexuais "no armário" disseminem mais a doença em relações heterossexuais. E esse não é p único lado da questão, como na questão climática, há também o negacionismo pleno, motivado por ambas ideologias, pró e anti-capitalista. Como na questão climática, se colocam como céticos, vão denunciar alarmismo e fraudes, e muitas vezes acabam usando como aliados membros respeitados dentro da comunidade científica.
Acauan escreveu:zumbi filosófico escreveu: Se isso é ser bobo e pedante, bem, estou aberto a sugestões de como fazer os mesmos pontos, corrigindo o que me parece errado, sem parecer pedante e bobo.
O pedantismo bobo, como disse, está em achar que um gráfico decide polêmicas complexas, tanto do ponto de vista científico quanto do político.
Um gráfico exibe correlações que não necessariamente evidenciam nexo de causa e efeito entre as variáveis. Não raro a correlação é apenas circunstancial, o que em estatística é chamado correlação espúria.
Como cita com alguma frequência os criacionistas, eles são peritos na arte de exibir gráficos com as variáveis que lhes interessam enquanto omitem os gráficos com as variáveis que não lhes convém. Isto pode ser feito em qualquer discussão envolvendo dados empíricos, uma prática muito comum nas polêmicas sobre economia.
A postura mais prudente nestes casos é esperar. Tomar posição em polêmicas nas quais os dados são fornecidos justamente por quem está litigando em um dos lados é um risco intelectual que se deve evitar. O tempo, sempre ele, acaba mostrando quem é quem e o que é o que.
O buraco na camada de ozônio continua lá, tão grande ou maior do que diziam que estaria por esta época, mas os casos de cancêr não explodiram como diziam que aconteceria. Mostrar gráficos sobre produção de CFC's é bobagem pois esta era apenas uma das variáveis envolvidas no problema.
Outra, a destruição do ozônio pelas turbinas dos aviões a jato é convenientemente omitida, pois teriam que explicar porque o tráfego aéreo aumentou tremendamente nos últimos vinte anos, nenhuma iniciativa foi feita para restringi-lo visando proteger a ozonosfera e ninguém mais milita por esta causa.
A comunidade científica está perfeitamente ciente da possibilidade de existência de correlações espúrias, sendo que esses gráficos não são suspeitos disso. O gráfico das observações traz o que a vasta maioria dos estudos não refutados sugerem ser os principais fatores, enquanto o outro é sobre modelos que visam reproduzir as influências desses fatores, conforme o estudado. O primeiro caso poderia ser até ter alguma correlação espúria, mas não é o que os estudos indicam, e o segundo no máximo mais tautológico do que exatamente espúrio, se negligenciassem um hipotético misterioso fator ou soma de fatores que realmente determinam tudo enquanto passa(m) completamente desapercebido por todos. Não digo que não é uma possibilidade em hipótese alguma, só não é o que parece ser mais provável.
De fato a postura mais prudente é esperar, mas não acho exatamente sadio o "ceticismo" exagerado, geralmente ideologicamente motivado, que é comum ver nesse e em outros assuntos citados. Também penso que essas especulações vagas, superficiais e não devidamente informadas como as que feitas sobre a questão da camada de ozônio, subestimam e caricaturam a pesquisa científica.
A militância ou sua ausência é um processo social praticamente independente do conhecimento e da pesquisa científica, é influenciado por ela, possivelmente influente sobre ela, mas essa influência ou sobreposição me parece muito exagerada, e ironicamente, exagerada justamente pela militância antagônica da causa em questão. Por exemplo (além de quase tudo que é comumente citado como controverso nessa área), um dos e-mails roubados recentemente, e completamente negligenciado, era uma reclamação do diretor do CRU quanto a distorções que julgava ser um desserviço, enviado não a alguma entidade de céticos, mas a uma ONG ou grupo que fazia um abaixo-assinado em favor de restrições mais fortes nas emissões de carbono. É algo que passa uma imagem dos cientistas como bem mais imparciais, diferentes dos pilantras como estão sendo retratados, mas as chances são de que você não verá muitos como o Olavo de Carvalho, Júlio Severo, Diogo Mainardi, ou qualquer comentarista ou personalidade política de ideologia similar no país ou fora dele chamando atenção para esse e-mail (nem para muitos mais dos milhares dos treze anos de e-mails roubados com debate científico trivial e mais difícil de distorcer).