A falacia das garantias

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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Acauan escreveu:Ei Cabeça,

Como você vê a questão da segurança nacional neste contexto?
Forças armadas privadas?



Nobre guerreiro,

Pois e, a "geoestrategia" e talvez o problema mais espinhoso.

Existem solucoes possiveis, culturais e de mercado, que podem inclusive coexistir e mesmo cooperar. Algumas sao inspiradas em solucoes historicas, outras extendem alguns principios basicos ja aplicados em outras questoes similares:

- Uma milicia voluntaria tradicional: Os homens sao treinados para o combate (intensivamente durante um periodo, recebendo periodicas atualizacoes e promocoes na hierarquia militar), conservam seus fuzis com municao em casa para defender suas propriedades e se unir para compor a defesa da comunidade. Receber esse tipo de treinamento faz parte dos ritos tradicionais quase que mandatorios da comunidade (nao ser um miliciano conferiria um status de paria social a todos os adultos saudaveis que rejeitassem a tradicao).

Essa solucao foi adotada durante praticamente toda a Historia por diversos grupos sociais distintos. Foi a base do exercito revolucionario americano, que derrotou a maior potencia militar da epoca. E tambem tradicionalmente adotada na Suica.

- Tropas mercenarias com equipamentos militares pesados. Podem ser contratadas por grande empresarios para proteger propriedades e comboios, ou por condominios e podem atuar em cooperacao com milicianos locais (como articuladores ou fornecendo suprimentos para uma resistencia armada mais eficiente).

Essa solucao parece especialmente apropriada para o controle do espaco aereo sobre areas industriais (alvos preferenciais de ataques) e para a seguranca naval de cidades portuairas, plataformas de petroleo e escolta de navios mercantes.

- Condominios de defesa: Se uma regiao possuir particularidades tais que uma milicia tradicional voluntaria nao seja suficiente para assegurar sua supremacia, podem se desenvolver condominios de defesa, ou seja, um vinculo contratual entre as propriedades estabelecendo os criterios nos quais serao financiados os servicos de defesa daquela localidade, como de maneira similar a os demais tipos de "monopolios naturais".

Condominios nao sao Estados, pois eles se estabelecem atraves de vinculos legais voluntarios especificos de propriedade (como numa sociedade ou clube) [ver a mensagem acima para o Apate]. Condominios sao mecanismos eficientes para lidar com questoes de externalidades locais (pense nos regulamentos de ruido num edificio residencial) e monopolios naturais (pense nos elevadores e demais instalacoes coletivas) em situacoes de alta densidade populacional. Em principio, nao ha limite para o tamanho de um condominio, mas o mais natural, num regime de competicao de mercado, e que eles adquiram exatamente o tamanho optimal para o servico que eles desempenham.

- Empresas de seguro: existem razoes para se acreditar que numa sociedade de livre mercado floreca uma legislacao de restituicao de perdas e danos que permita toda uma enorme framework de seguros, para todos os tipos de situacao. A principal delas e que esse fenomeno ja e observado hoje em sociedades de maior intensidade capitalista. O funcionamento dessas empresas seria o usual: elas absorveriam danos sofridos ou causados por seus clientes (cobrando deles por esse servico, claro). Essas empresas de seguro entao teriam interesse de reduzir a probabilidade de danos de grande escala, como aqueles que ocorrem durante um conflito armado. Ela poderia entao fazer contratos com tropas mercenarias que se ocupariam de dissuadir eventuais ataques e insurgencias, assim como vigiar continuamente certas regioes de risco e propriedades estrategicas, como pontes, estacoes de trem, usinas eletricas, e etc.

Nao e dificil perceber que nenhuma dessas solucoes e auto-excludente (ainda que, naturalmente, possam competir comercialmente entre si). Eu acho que as milicias voluntarias dariam conta de certas areas rurais e cidades pequenas, como fazem os corpos de bombeiro voluntarios em diversos paises. As tropas mercenarias poderiam ser contratadas para proteger determinadas propriedades que figurariam como alvos preferenciais, assim como garantir a inviolabilidade das regioes ao redor, impedindo sitios. Nessas circunstancias, elas poderiam cooperar com milicianos em volta. Condominios de defesa me parecem adequados para cidades relativamente grandes e densamente povoadas, nas quais uma mobilizacao miliciana seria bastante complicada, assim como os limites entre as diferentes propriedades seriam bastante tenues. Empresas de seguro negociariam entre si a contratacao de dispositivos e contingentes de defesa para areas com muitos clientes (e muitos danos potenciais). A negociacao entre grandes coroporacoes de seguro e com certeza muito mais viavel do que entre os milhoes de individuos interessados.

Mas e preciso observar que a maior preocupacao com defesa existe apenas no cenario onde uma comunidade anarquica coexiste com Estados-nacoes hostis. Eu tenho duvidas se este cenario seria realista. Eu vejo uma sociedade sem Estado como um desenvolvimento coerente de uma sociedade de contratos calcada na etica capitalista. Aparentemente, as nacoes capitalistas ja deixaram de se hostilizar ha um bom tempo. Uma famosa teoria de prevencao de conflitos diz que dois paises com filiais do Mc Donald's nao entram em guerras entre si. Talvez essa teoria seja exageradamente otimista, ja que o Mc Donald's entrou penetrando em alguns paises bem instaveis geo-politicamente, mas ela guarda alguma sensatez assim mesmo.

Eu acredito que no momento em que a etica capitalista estiver suficientemente clara para uma determinada sociedade, cristalizada nas suas instituicoes e tradicoes de maneira tao profunda a ponto de prescindir qualquer mecanismo estatal, imagino que as questoes geo-estrategicas importantes ja estariam praticamente superadas, e todas essas solucoes que eu te apresentei sejam apenas lembradas como pitorescos exercicios de ficcao historica.
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Re: A falacia das garantias

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Apo escreveu:Gostaria de saber como a anarquia e o julgamento humano acerca do que é melhor ou do que é ameçador ( que não costumam ser questões de senso comum, e sim individual , dependendo dos valores e situação em que se encontram os grupos ) conseguiriam conviver.

Basta aplicar tal situação à pequenos grupos, como um condomínio ou uma corporação. Sem convenções ( baseadas na Lei e sem regulamento interno - que acaba por funcionar como força de coação ) , sem uma administradora, sem um síndico democraticamente eleito ( mas que se baseia em prícípios legais, para todos os efeitos ), parece inviável que se chegue a consenso que não seja através de luta entre as partes.

O Acauan falou em segurança nacional. Forças Armadas privadas são para defender quem de quem? E internamente? Tudo privado? Valeriam que critérios ( já que costumamos votar em representantes que "contratam" ,ou deveriam contratar, profissionais gabaritados para execução de tais tarefas).

Parece-me que os problemas sempre recaem sobre os mesmos pontos, que recaem sobre poder e sobre capital.


Receio nao ter acompanhado sua linha de raciocinio aqui. Poderia reformula-la?

O que voce entende por convivencia de julgamentos humanos acerca do que e ameacador e no que exatamente uma burocracia imposta (o Estado) seria necessaria para lidar com eles?

Sobre condominios e corporacoes, os contratos de propriedade estipulam a priori quais sao os mecanismos de solucao de conflitos. Podem ser mecanismos de democracia, de hierarquia ou de arbitragem por terceiras partes. (ou mistos, ou algo diferente, o que parecer mais acertado)

Sobre as forcas armadas privadas, elas defenderiam quem as contrata-se dentro dos criterios desse contrato, exatamente como as forcas armadas estatais, mas num regime de competicao de mercado e de contrato voluntario. Lembrando que um exercito estatal maior e mais ativo nao e garantia de seguranca (na maioria dos casos, vale ate o contrario, bastando comparar o numero de suicos com o numero de austriacos mortos nas guerras internacionais dos ultimos seculos.)
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Re: A falacia das garantias

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Darkside escreveu:Bom, primeiramente, perguntei a você quais seriam os problemas de uma sociedade anarquista na sua opinião justamente por já conhecer as respostas que você concede quando alguém lhe questiona sobre assuntos no qual o Estado é visto como necessário. Mesmo quando você propõe algo que eu não concordo, eu sei que a própria sociedade daria um jeito de cobrir qualquer demanda que aparecesse, como já acontece hoje.



Isso e bem importante, alias.

Os mecanismos de mercado que eu suponho que poderiam substituir certos servicos do Estado sao de carater especulativo variado. Embora eu procure sempre me servir de algum tipo de mecanismo ja desenvolvido, pode ser que outras formas inovadoras de contrato que nos nao conhecemos agora mostrem-se ainda mais eficazes.

Meu interesse nao e mostrar que o Estado pode ser substituido amanha pela propriedade privada, isso nao faz muito sentido para mim. Essa substituicao precisa so e coerente quando as pessoas percebem que existe uma vantagem substancial em optar pelo privado, e essa vantagem se produz atraves de mudanca cultural (as pessoas precisam exigir menos impostos e gastos governamentais, e nao mais) e de competicao de mercado subsequente.

O meu interesse com esses exemplos e hipoteses e mostrar que do ponto de vista logico nao existem questoes que necessariamente demandam um Estado para garantir uma ordem social, e que a propria natureza de uma solucao estatal e contraditoria com certos principios morais e economicos fundamentais.


Darkside escreveu:Creio que o livre mercado só não funcionaria onde há algo prejudicando algum dos seus aspectos, e o monopólio existente em alguns serviços básicos prestados a toda população, como o fornecimento de energia elétrica ou o saneamento básico, possuem esta característica. Não há usinas hidroelétricas sobrando pra que nós possamos escolher a que nós quisermos. Isso não significa que essas empresas precisam ser dirigidas pelo estado, elas podem perfeitamente ser privatizadas, mas precisam ser devidamente fiscalizadas pra que não cometam abusos, já que não há concorrentes a quem se possa recorrer.



Sim essa e uma crenca bastante comum.

Mas nao foi assim que surgiu o Estado. Ele nao inventou esses servicos, mas os tomou do mercado (e nesse sentido, a natureza "coletiva" aparente desses servicos talvez tenha colaborado para essa tomada).

O fato de nao haver um grande numero de usinas hidreleticas diz respeito apenas a escala dessa atividade. De fato, nao precisamos de trinta usinas hidreletricas concorrentes. Mas nao precisamos que alguem aponte um fuzil para que nos tenhamos energia eletrica tampouco. Existem diversas maneiras de negociar essa questao.


Darkside escreveu:Outro problema no qual eu simplesmente não vejo solução é a lei. Uma sociedade teria que possuir um esforço em conjunto maior do que eu considero provável pra manter a ordem e a justiça. Existem muitas pessoas sem moral em qualquer lugar, infelizmente coisas como a ganância e a corrupção fazem parte da natureza humana também.



Nao sao burocratas que fabricam leis. Isso e um engano tao bobo quanto acreditar que foram os gramaticos que construiram o nosso idioma.

Leis e idiomas emergem espontaneamente, das interacoes entre as pessoas. Sao produtos da razao, mas nao do desenho espontaneo e pre-meditado.*

O servico dos burocratas legisladores nao e elaborar leis corretas, mas uniformiza-las, formata-las e adequa-las entre si para que possam ser assimiladas e difundidas entre as pessoas, na medida em que essas leis, de uma forma bruta ou localizada ja se fazem presentes. Essas leis servem como regras de conduta abstratas e comuns, que permitem que um individuo preveja as possiveis reacoes do outro e ajuste assim seu comportamento em face a isso. Desse processo de interacao e cooperacao eventualmente acabam emergindo novas leis gerais e abstratas, que sao em seguida uniformizadas, formatadas e etc. por burocratas.

Quando um legislador resolve desenhar leis para atingir certos objetivos especificos o que ele faz normalmente e produzir um monte de incentivos errados. Pense na lei de salario minimo por exemplo. O objetivo dela e fazer o trabalhador ganhar mais. Talvez ela ate faca, se voce se guiar por estatisticas espertinhas que consideram como trabalhador apenas quem estiver empregado. Porque o escolio obvio dessa lei e colocar fora do mercado todos cujo valor da mao de obra for considerado inferior ao minimo estabelecido.

O primeiro servico, de formatacao das regras abstratas de conduta, pode ser desempenhado por firmas juridicas privadas. Elas formalizariam as legislacoes para todo tipo de contrato e regulamentos para propriedades de acesso publico, com base nas leis gerais e abstratas que os envolvidos compreendem. Isso e um servico vendavel (e ja e comercializado inclusive por diversas firmas legais privadas).

O servico de prevencao contra violacao de regulamentos tambem e ele mesmo vendavel, naturalmente. Pode ser atraves de qualificacoes negativas dos violadores (SPC ou o esquema de ratings de usuarios em sites como e-bay), pode ser atraves de metodos policiais mais "tradicionais" (que teriam sido previamente acordados no contrato).


Darkside escreveu:Não me referi a "perfeição" no sentido de uma utopia, e sim em algo sem defeitos por si mesmo, foi isso que eu quis dizer. Embora o anarquismo seja apenas a ausência de um Estado e não uma política, ele pode ser uma situação na qual uma sociedade se encontra e não é imune a críticas.


Criticas podem ser feitas a qualquer coisa se nos escolhermos o ponto de vista oposto. Para Heloisa Helena e para o usuario Aranha o que eu estou dizendo esta cheio de defeitos, a comecar pelo fato de que eles nao teriam os empregos atuais deles.


Darkside escreveu:Pois é. Pare de insinuar que eu sou socialista, isso é uma ofensa.


Pode deixar. Eu nao acho que voce ou outros nao anarquistas sejam socialistas por ter certas ressalvas com relacao a possibilidade de uma sociedade sem Estado.

Eu ja pensei durante muito tempo de maneira similar. Que alguma instancia de Estado seria necessaria para preservar certos pressupostos necessarios para existencia de uma ordem social baseada num imperio das leis, da responsabilidade e da consequente liberdade real dos individuos.

Hoje eu sou tao conservador-pro-imperio-das-leis quanto eu era antes, ate muito mais eu diria. So nao vejo mais o Estado como um elemento necessario ou mesmo adequado, mas sobretudo como um substancial obstaculo para um legitimo imperio das leis.

Quando eu me referi a socialistas, nao falava de voce, mas daqueles que acreditam que o Estado sirva a um interesse coletivo de produzir uma sociedade perfeita de acordo com algum pressuposto que eles tenham aderido, seja ele utilitario/hedonista, cientificista/racionalista ou o que mais ja tiver sido empregado para justificar suas experiencias sociais bizarras.


Darkside escreveu:A lei é um serviço como qualquer outro?


A lei nao e um servico. As vezes a palavra lei e usada, ate por mim, de maneira a abranger os inumeros servicos legais que se organizam em torno dessa entidade abstrata.

Eu nao sei se eu tenho conhecimentos filosoficos suficientes para definir precisamente o que seria uma lei, alias, nem tenho certeza se faria sentido definir a lei em si.

O que eu penso e que em algum plano de abstracao existe um codigo universal de conduta moral, uma expressao ideal do Bem, mais ou menos como podemos dizer que em algum plano de abstracao existe uma lista de numeros primos, ainda que nos nao sejamos capazes de conhece-la completamente dada nossa razao limitada.

A tradicao nos transmite o conhecimento moral acumulado pelos antigos, que obviamente nao e perfeito, mas traduz uma expressao mais correta do Bem do que aquela que poderiamos chegar refletindo sozinhos (se e que poderiamos chegar a alguma coisa). A tradicao nos ensina quais sao as leis, e a experiencia pode nos indicar o que pode ou nao ser melhorado para se aproximar o Bem.

Uma outra forma analoga de ver isso e perceber que a evolucao da moral e das leis nao e completamente arbitraria, mas que converge para determinados conceitos ideais especificos.

Nao vemos uma quantidade igual de pessoas concordando e discordando, por exemplo, com a escravidao e com o estupro de bebes. E em geral as mudancas de mentalidade se dao num mesmo sentido, embora nem sempre.

Essa nao arbitrariedade da moral e o Bem, ou a moral absoluta.


Darkside escreveu:Uma legislação precisa ter uma abrangência definida e ser soberana, ou a situação seria caótica.


Correto. Basta ela ser reconhecida e compreendida pelas partes envolvidas.

Darkside escreveu:Como uma empresa poderia ser considerada a fornecedora desse serviço para a população sem ser igual a um estado? Aqui não é mais a questão de um serviço privatizado, e sim em como uma empresa, sem a existência de um Estado, seria a criadora e mantenedora da lei em uma sociedade.



Catalogar, formalizar, interpretar e assegurar certos regulamentos, que sao as funcoes legais necessarias do Estado, empresas nao so podem fazer como ja fazem.

Ja para "criar leis" para a sociedade, que e o que os burocratas arrogantes do Estado tentam fazer muitas vezes, realmente, as empresas privadas nao seriam melhor sucedidas, exceto pelo fato de que elas nao teriam porque tentar.
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Re: A falacia das garantias

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Apo escreveu:Os condôminos competiriam entre si?

Imagino que tal (microcelulização - inventei agora, mas acho serve..) iria até níveis de debate e questionamento inimagináveis e tornaria a quase totalidade das decisões praticamente uma rede "burocrática" muito pior do que a tal tão criticada.

Cabeção, esta idéia pode ser inovadora em termos documentais e organizados por ti, mas é um formato facilmente imaginável, basta seguir uma lógica de inversão dos modelos vigentes.
A questão é que o que é ideal em termos hipotéticos não consegue se tornar aplicável de fato, pois a heterogeneidade dos condomínios e seus condôminos - e isto em qualquer esfera humana, inclusive dentro de uma família, um condomínio, uma corporação ou uma Nação ( eu disse Nação, não Estado) é tão díspara que clama por uma organização a quem delega tais poderes, pois que não se sustenta por 5 minutos.

Se fosse fácil, já se teria obervado atuando eficientemente em pequenas organizações. E o que se vê é guerra, disputa, anarquia e contra-ordens , senão a criação óbvia de facções. É assim na História da Humanidade.

Acho isto uma utopia ainda mais romântica do que o oposto.
Há de haver sempre um equilíbrio entre regras e negociação, mas dentro de algo previamente organizado, e podendo contar com estruturas eficientes que respondam eficazmente para coisas que demandariam uma vida para serem decididas o tempo todo através de negociação e concorrência ( que eu aposto que é uma palavra muito linda para conflito de idéias e interesses).



Aqui voce apresentou ideias parecidas as do seu ultimo post (pelo menos eu entendi assim), que eu ja comentei acima.

Quanto aos condominios em si, nao sei o quanto a ideia e original. Ela e bem simples, reconheco, so nao a encontrei numa literatura citavel nem a peguei emprestado de ninguem.

Quanto ao fato de voce afirmar que num condominio existem diferencas de opiniao, eu sei. Exatamente por isso que eles criam um contrato que estabelece criterios de votacao e coisas do tipo. Para tomar decisoes.

Exatamente como numa sociedade anonima ou num clube. Qual e o problema com isso? O que impediria de existir um condominio onde voce mora que fosse responsavel por fornecer a sua agua e luz, por exemplo?

O fato de existir um vinculo contratual exclusivo com o condominio nao quer dizer que vai haver exploracao. Se fosse assim, os sindicos de predios explorariam todos os moradores o quanto quisessem.


Apo escreveu:Ah, sim, cabeção...tal "equilíbrio" seria o tempo todo contaminado por novas questões e regra alguma levaria mais do 5 segundos para ser colocada em xeque.

O que seria um equilíbrio e quem determinaria isto? Até o mercado é caótico por si só.
Imagine o caos de um mercado($) num pandemônio destes. Provavelmente moedas de troca pululariam até que se instalasse o caos total.

PS: não, não é papo de esquerdista, você sabe disto. Eu penso com neutralidade em termos organizacionais, logística e engenharia.


Nao entendi seu argumento.

O meu conceito de equilibrio era simplesmente reservado a tendencia que os condominios teriam de atingir proporcoes optimais para cada servico do qual se ocupassem.

Por exemplo, se o fornecimento de agua atinge um otimo de custos globais para aproximadamente 10 mil clientes, eu estou afirmando que os condominios de agua teriam aproximadamente esse tamanho.


Apo escreveu:Quem faria este papel? Tecnocratas, burocratas? Esqueça a ligação disto com o estado que você tem em mente. O meu é outro tipo de Estado.



Voce fala coisas vagas demais, eu nao sei se entendo tudo o que voce sugere implicitamente com suas mensagens.

O que e o seu "outro tipo de Estado"?

Eu apenas disse ao Fernando Silva que liderancas sao de fato coisas naturais, emergem em qualquer grupo.

Nao sao apenas os nao-civilizados que precisam de lideres que batam neles. Gente civilizada pode escolher lideres por outros mecanismos, mecanismos de gente civilizada.
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Tarcísio »

Já que saimos completamente do tópico e entramos na linha "Pergunte ao user f.k.a. Cabeção", vou tentar juntar as duas coisas:

Cabeção, numa sociedade anarquista não valem as organizações mais eficientes em todas as situações. Existem também as organizações mais persuasivas. Não quero entrar no ônus de justificar que uma organização mais persuasiva pode prevalecer sobre as mais eficientes, então parto da garantia que você aceite a premissa.

Uma organização pode ser mais persuasiva e criar dependência através de complexos mecanismos morais, a citar clãs, religiões, ideologias. Como a história nos ensina, organizações como essas podem crescer até os limites da própria subsistência, ou seja, o mínimo para sua manutenção. Como o estado anarco-capitalista garantiria que organizações como essas não o corromperiam?

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Tarcísio escreveu:Power Block ou Grande Berta é o que entendo por associações que tenham todas as seguintes propriedades:

1) Interesses autônomos(Os membros/sócios/acionistas são apenas engrenagens sólidas e substituíveis do maior ao menor)
2) Maioria no sistema(A maioria dos que articulam na esfera de influência da organização são membros da organização ou tem sua "sobrevivência" assegurada por eles)
3) Auto-tutela(Embora moralidade, regras e costumes estejam presentes na estrutura interna, fora se usa o mais próximo possível da auto-tutela. O objetivo é destruir todas as demais organizações presentes na área de influência ou expulsá-las para outras)
4) Dependência(Cria dependencia no sistema onde atua, entre os membros e nos não-membros)
5) Ódio(A desconfiança é geral e funciona de duas formas: como uma peneira contra "elos fracos" e como chama perpétua que transfigurada em competição retira do sistema a idéia inerente de estagnação.


Foi voce que desenvolveu esses conceitos?
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Re: A falacia das garantias

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Aranha escreveu:
Acauan escreveu:Ei Cabeça,

Como você vê a questão da segurança nacional neste contexto?
Forças armadas privadas?



- Parece que ele não viu.

Abraços,


Calma, eu sou um so, e com menos tempo livre do que gostaria...
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Apate escreveu:Mas de qualquer forma não teríamos uma espécie de yoctoestado? Parece um jogo onde não se pode definir esta sociedade com Estado...



Sem burocratas pressupondo algum poder sobre voce = Sem Estado

O que nao quer dizer sem leis. O Estado nao e a Lei, esse e o ponto importante. Voce deve ser livre exceto pela sua obediencia a Lei, que, a despeito do que eles proprios acreditam, nao sao excressencias da mente de burocratas do governo.

Uma sociedade sem burocratas e governos centrais teria suas proprias formas de fazer prevalecer a Lei.


Apate escreveu:Não acabei de ler o outro tópico (se estiver explicado lá, apenas passe o link), mas a questão dos condomínios me deixou curioso. Na esfera legal eu poderia me associar à empresa que eu quiser? A priori, a única sanção que eu receberia ao não ser sócio da mesma empresa de legislação que o meu vizinho seria não comercializar com ele? Ou eu naturalmente adotaria a mesma da comunidade porque isso seria lucrativo pra mim? Veja bem, não estou dizendo que com burocratas legisladores temos garantia de uma boa legislação, só achei confuso este ponto.


Voce compraria um contrato de locacao ou de propriedade com clausulas.

Essas clausulas determinariam quais sao os condominios aos quais a sua propriedade se encontraria vinculada, quais sao as obrigacoes e direitos que voce teria como proprietario associado a esses condominios, assim como qual seriam as condicoes para que voce pudesse aderir a outros condominios ou se desvincular daqueles aos quais voce se encontra atualmente vinculado.

Seria analogo ao tipo de entidade juridica existente num edificio de moradores, mas sem a necessidade de um predio fisico que os encapsule.

O seu "condominio de agua" seriam todas as casas que partilham com voce uma determinada rede de tubulacoes de agua gerenciada por uma (ou mesmo mais de uma) empresa (ou associacao de moradores, ONG, tanto faz na verdade).

As pessoas hoje se associam a condominios privados quando compram ou alugam apartamentos e casas dentro dessas condicoes especificas. Aparentemente essas pessoas nao precisam pensar em aberracoes como "utilidades coletivas" quando tomam essas decisoes: o condominio oferece a melhor opcao para elas mesmas.

E essa e a ideia.


Apate escreveu:ps: Não tem a ver com o debate mas até onde essa teoria é original sua?


Nao lembro de ter encontrado nos (nao tantos) livros e artigos que eu li sobre o assunto uma abordagem que se ocupasse de generalizar a ideia de condominio da maneira como estou fazendo aqui, mas nao duvido nada que ela ja possa ter sido feita anteriormente (alias, espero que tenha sido, para que eu possa ler possiveis refutacoes).

De qualquer forma, a ideia em si nao e muito diferente do que normalmente se discute, a unica coisa que eu julgo interessante e que ela ja se encontra aplicada em condominios privados e aparentemente pode ser generalizada segundo os mesmos principios.
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Tarcísio
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Tarcísio »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Tarcísio escreveu:Power Block ou Grande Berta é o que entendo por associações que tenham todas as seguintes propriedades:

1) Interesses autônomos(Os membros/sócios/acionistas são apenas engrenagens sólidas e substituíveis do maior ao menor)
2) Maioria no sistema(A maioria dos que articulam na esfera de influência da organização são membros da organização ou tem sua "sobrevivência" assegurada por eles)
3) Auto-tutela(Embora moralidade, regras e costumes estejam presentes na estrutura interna, fora se usa o mais próximo possível da auto-tutela. O objetivo é destruir todas as demais organizações presentes na área de influência ou expulsá-las para outras)
4) Dependência(Cria dependencia no sistema onde atua, entre os membros e nos não-membros)
5) Ódio(A desconfiança é geral e funciona de duas formas: como uma peneira contra "elos fracos" e como chama perpétua que transfigurada em competição retira do sistema a idéia inerente de estagnação.


Foi voce que desenvolveu esses conceitos?

Eu não posso dizer que criei, mas percebi e juntei essas propriedades de três sistemas: simulação de vida biológica, jogos políticos massivos e as relações dos itens anteriores com sistemas reais e fictícios de organização humana, indo da comparação com sistemas mais caricatos, como 1984, URSS, Coréia do Norte até Brasil, Economia Americana X Mundial...

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Re: A falacia das garantias

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Tarcisio escreveu:Cabeção, numa sociedade anarquista não valem as organizações mais eficientes em todas as situações. Existem também as organizações mais persuasivas. Não quero entrar no ônus de justificar que uma organização mais persuasiva pode prevalecer sobre as mais eficientes, então parto da garantia que você aceite a premissa.

Uma organização pode ser mais persuasiva e criar dependência através de complexos mecanismos morais, a citar clãs, religiões, ideologias. Como a história nos ensina, organizações como essas podem crescer até os limites da própria subsistência, ou seja, o mínimo para sua manutenção. Como o estado anarco-capitalista garantiria que organizações como essas não o corromperiam?



A resposta e facil: o "Estado" anarco-capitalista nao garantiria nada porque ele nao existe.

Se uma imensa maioria se convertesse a Igreja Petecostal Trombetas do Apocalipse (acho que e disso que voce esta falando) e tentasse impor seus valores sobre os demais, nao haveria garantia alguma de que eles seriam impedidos (o que e diferente de dizer que nao haveria ninguem para lutar contra eles).

Mas o mesmo ocorre com o Estado. Nao e porque uma constituicao diz que o Estado e laico que nos podemos tomar tal fato por "garantido" eternamente. Isso e uma visao animista completamente equivocada.

Garantias sao coisas que nao existem de forma absoluta. Nossos valores nao estao garantidos contra o Mal apenas porque um grupo de burocratas transcreveu uma parte deles num documento oficial. Esse era o meu ponto no comeco do topico.

Quem deve conservar os valores tradicionais da nossa civilizacao sao os individuos, nas suas acoes. Enquanto acreditarmos que eles estao garantidos, aqueles ocupados em destrui-los (ou seja, toda a vasta fauna de coletivistas) estarao livres para agir.

A burocracia, ao induzir a ideia dessas garantias, produz na verdade um efeito contra-produtivo, pois as pessoas passam a diminuir sua atencao aos valores em si, e comecam a adorar meros simbolos e rituais, como uma constituicao, uma bandeira ou o "processo democratico".

Isso induz um transe hipnotico que constituiu a ocasiao ideal para todas as manobras de sabotagem linguistica e cultural que a estrategia esquerdista empregou depois que eles perceberam que nao poderiam destruir os valores do ocidente na marra, como inicialmente o flagelo coletivista pretendia.

Assim, eles se ocuparam de preservar certos simbolos enquanto se empenhavam em redefinir todos os significados subjacentes (atraves da sua penetracao ubiqua nos meios de comunicacao e educacao massificados), sem que ninguem percebesse o que se passava, ate mesmo ganhando o apoio daqueles muitos que prestavam mais atencao as formas do que aos conteudos. (Hoje a coisa chegou num tal ponto que um professor pode falar para o aluno que o pai dele e um membro da classe meRdia alta, culpado de todos os males do mundo, que ninguem vai se espantar, mas a coisa levou um certo tempo para chegar ao ponto que chegou)

Esse programa de sabotagem ainda esta em curso atraves de varias frentes, a mais evidente e denunciada delas e o "politicamente correto". Mas eles se infestaram em niveis muito mais preocupantes, tais como o desconstrucionismo, tendo inclusive contaminado politicamente ate a nossa concepcao de Ciencia.

Enquanto os individuos acreditam nao ser responsaveis e terem seus valores garantidos, a horda de barbaros trabalha dia e noite para desconstruir a nossa civilizacao debaixo dos nossos narizes. E os burocratas que nos acreditamos estarem la para nos defender apenas aceleram o trabalho desses hunos.
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Aranha
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Aranha »


Caro Cabeção,

- Sobre Condomínios.

- Alguns teóricos de Teoria Geral do Estado alegam que o poder e a autoridade surgiram de seleção natural, ou seja, grupos que organizaram-se em torno de uma autoridade central (constituída via valores consensuais do grupo tipo experiência e/ou inteligência e/ou liderança) sobrepujaram grupos anárquicos que foram se extinguindo.

- Dentro desta perspectiva, a formação do poder é um fato decorrente da natureza humana, uma vez que grupos conflitantes sempre ocorrerão, grupos estes que não sobrevivem sem o princípio do poder.

- Dito isto, pergunto: - Como estes condomínios que voce defende não evoluiriam para estruturas de poder cada vez mais complexas e grandiosas até se transformarem em estados constituídos?

Abraços,
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Mucuna
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Mucuna »

Sei não...

Ainda tenho uma visão muito clássica da anarquia, aquela coisa utópica. Algo que viria de um nível de consciência e comprometimento tão elevados que também faria a propriedade privada perder sentido.

Nesse modelo de anarcocapitalismo o sistema monetário seria o mesmo ou parecido?

Um exemplo de problema simples: Se uma empresa, uma empreiteira por exemplo, dá calote em milhares de pessoas que prestaram serviço (como muitas fazem hoje em dia), a quem essas pessoas poderiam recorrer? A alguma outra empresa? Como se essa não tem autoridade nenhuma sobre aquela?

Outra questão: "leis" continuariam existindo, assim como contratos. Os burocratas iam existir do mesmo modo. Poderia diminuir a princípio, pois não existiria um Estado exigindo certos regulamentos, impostos, etc, mas poderia ser questão de tempo até incharem novamente o campo da burocracia. Todos estudando, interpretando, renegociando as "diretrizes gerais" que já norteavam as relações daquelas duas ou mais instituições e fazendo o mesmo a cada contrato específico.

Uma pendenga surgida disso seria resolvida nas mesas de reunião. OK. Caso não conseguissem, um tribunal legitimado por um Estado não existiria para resolver isso (abro este parênteses para admitir que os tribunais não são necessáriamente garantia, como colocou no início, de justiça por inúmeros fatores, inclusive corrupção, mas como eles "já não existem", não tem porque discuti-lo. Quero só ver se outros modelos seriam de fato mais eficientes ou, eu diria, até mesmo diferentes em sua natureza do que temos hoje).

Então vamos lá. Ninguém se entendeu na mesa de reunião. Acontece. Um ou mais lados sentem-se com prejuízos consideráveis e injustos de acordo com seu entendimento. Como fica?

Uma opção é simplesmente não realizarem mais nenhum tipo de negócio dali em diante, não se relacionarem mais. Isso se a não for amargado nenhum prejuízo que comprometa seriamente a saúde financeira de dada pessoa jurídica (o termo não faz mais sentido, tudo bem). Onde resolver então se não der para simplesmente "deixar para lá" e absorver o prejú?

Pensei que poderia existir uma espécie de empresa de consultoria que seria então contratada e que após análises daria um parecer. Como nenhuma empresa está abaixo hierarquicamente desta hipotética empresa de consultoria, pois se houvesse isso, seria apenas uma forma de Estado com outro nome e forma, o lado que tivesse parecer contrário ao que estava alegando entender, não seria obrigado a pagar nada.

Aí você poderia dizer "Ah, mas se esta assim procedesse, cairia em descrédito no mercado e poderia estar garantindo sua extinção!". Sim, poderia. Logo ela se sentiria "obrigada" a acatar decisões de uma outra "empresa", formando uma hierarquia velada cuja a consequência da desobediência seria ser exinta do mercado. Generalizo dizendo que isto seria um tribunal meio que nos moldes como temos hoje.

Outras opções podem ser pensadas. Eu que no momento não vejo nenhuma opção muito diferente disso.

Há outras questões que me ocorrem agora mas não vou aprofundar como:

Existe dinheiro ainda? Quem "faz" o dinheiro e decide sobre?

Drogas recreativas e/ou medicinais (ou pretensamente medicianais ou em testes ainda) seriam totalmente liberadas e fáceis de serem encontradas. Digamos que muitos hoje tem problemas com este cenários.

Claro que na prática, a sociedade resolveria os seus problemas, nem que seja na "porrada" como é feito tradicionalmente, mas o exercício é procurar uma forma "melhor" de sociedade e que não haja Estado mas empresas privadas. O caso é que, na minha imaginação e entendimentos, um anarcocapitalismo com o que temos hoje, acabaria se desenvolvendo meio que parecendo um feudalismo high-tech.
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carlo
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por carlo »

O cabeção é Reaganomic puro sangue, estudioso de John Willianson, e deve concordar com o que está enumerado abaixo, acertei?


Disciplina fiscal, através da qual o Estado deve limitar seus gastos à arrecadação, eliminando o déficit público;
Focalização dos gastos públicos em educação, saúde e infra-estrutura
Reforma tributária que amplie a base sobre a qual incide a carga tributário, com maior peso nos impostos indiretos e menor progressividade nos impostos diretos
Liberalização financeira, com o fim de restrições que impeçam instituições financeiras internacionais de atuar em igualdade com as nacionais e o afastamento do Estado do setor;
Taxa de câmbio competitiva;
Liberalização do comércio exterior, com redução de alíquotas de importação e estímulos á exportação, visando a impulsionar a globalização da economia;
Eliminação de restrições ao capital externo, permitindo investimento direto estrangeiro;
Privatização, com a venda de empresas estatais;
Desregulação, com redução da legislação de controle do processo econômico e das relações trabalhistas;
Propriedade intelectual.

:emoticon4:
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Tarcisio escreveu:Eu não posso dizer que criei, mas percebi e juntei essas propriedades de três sistemas: simulação de vida biológica, jogos políticos massivos e as relações dos itens anteriores com sistemas reais e fictícios de organização humana, indo da comparação com sistemas mais caricatos, como 1984, URSS, Coréia do Norte até Brasil, Economia Americana X Mundial...


Nao sei se entendo aonde voce esta tentando chegar. Talvez fosse melhor elaborar uma descricao mais detalhada dessas suas ideias para que eu enxergue no que elas se contrapoem ao que eu disse.
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Aranha escreveu:
Caro Cabeção,

- Sobre Condomínios.

- Alguns teóricos de Teoria Geral do Estado alegam que o poder e a autoridade surgiram de seleção natural, ou seja, grupos que organizaram-se em torno de uma autoridade central (constituída via valores consensuais do grupo tipo experiência e/ou inteligência e/ou liderança) sobrepujaram grupos anárquicos que foram se extinguindo.

- Dentro desta perspectiva, a formação do poder é um fato decorrente da natureza humana, uma vez que grupos conflitantes sempre ocorrerão, grupos estes que não sobrevivem sem o princípio do poder.

- Dito isto, pergunto: - Como estes condomínios que voce defende não evoluiriam para estruturas de poder cada vez mais complexas e grandiosas até se transformarem em estados constituídos?

Abraços,


Cite mais especificamente os teoricos e as ideias aos quais voce estaria se referindo. Dito dessa forma nao poderia soar mais vago.

Sobre os condominios, eles poderiam evoluir para Estados? Nao creio, nunca vi nenhum sindico perpetrar um coup d'état na vida, mas quem sabe?

Os condominios nao seriam entidades territoriais totalmente excludentes, nem teriam poder sobre ninguem a priori. As pessoas escolheriam se associar a diversos condominios e esses, por gerirem receitas e custos e precisarem agradar seus condominos, nao teriam condicoes de crescer muito alem da escala otima dos servicos que prestam.

Um condominio que crescesse demais se tornaria demasiado caro, o que acabaria forcando as pessoas a vender suas propriedades (que diminuiriam de preco consequentemente). Esse condominio logo se tornaria inviavel, ja que ele nao poderia contar com uma capacidade ilimitada de explorar seus condominos.

O mais provavel e que os contratos de condominio ja viessem com dispositivos que limitassem esse tipo de situacao.
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Tarcísio »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Tarcisio escreveu:Eu não posso dizer que criei, mas percebi e juntei essas propriedades de três sistemas: simulação de vida biológica, jogos políticos massivos e as relações dos itens anteriores com sistemas reais e fictícios de organização humana, indo da comparação com sistemas mais caricatos, como 1984, URSS, Coréia do Norte até Brasil, Economia Americana X Mundial...


Nao sei se entendo aonde voce esta tentando chegar. Talvez fosse melhor elaborar uma descricao mais detalhada dessas suas ideias para que eu enxergue no que elas se contrapoem ao que eu disse.


Um dos objetivos de um Power Block é criar dependência. Dessa forma ele passa a ser verdadeiramente um garantidor de maneira que se você tentar se desvecilhar totalmente de sua influência perderá as garantias no nível que as possui, independente de qual seja.

Quando a pessoa usa a fórmula "o que garante que nao acontecerá... ?" ela faz sua pergunta de modo a abranger "o que garante que valho em mercado as garantias que tenho sob o Estado?". Você mesmo responde _ nada _ e vai além. "Você sempre precisará confiar na discreção e no bom-senso dos" seus contratantes e contratados tanto quanto acredita agora nos burocratas.

A partir desse ponto acho que o desenvolvimento é mais claro:

Se não existem garantias a longa distância, porque abandonarei as que tenho por agora?

Pensando a partir da confiança que devo depositar na discreção e no bom-senso de alguém em quem minha sobrevivência está atrelada, é preferível estar imerso num oceano de outros associados que lutarão ao meu lado contra o inadimplente ou sozinho?

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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Mucuna escreveu:Ainda tenho uma visão muito clássica da anarquia, aquela coisa utópica. Algo que viria de um nível de consciência e comprometimento tão elevados que também faria a propriedade privada perder sentido.



Nao se ofenda, mas isso e resultado da massificacao da ideia mistica marxista de que a propriedade privada e algo a ser superado.

Contudo, quando partimos do principio de que seres humanos pensam e decidem individualmente visando objetivos particulares, e que os meios existentes para se alcancar esses objetivos sao escassos, ou seja nao podem atender a todos os fins que todos os individuos possuem, o desenvolvimento continuo de uma etica da propriedade privada e aparentemente a solucao mais logica.

Essa nao so e uma teoria sensata, mas e um padrao que pode ser observado nos mais distintos e primitivos grupos sociais humanos, ainda que cada caso possa ter apresentado suas particularidades.

A principio, nao ha como saber se a etica capitalista seria um dia substituida, se as pessoas mudariam sua forma de pensar e entrariam na "era de aquario" marxista. O fato e que os seres humanos que nos conhecemos hoje nao parecem funcionar dessa forma. Eles estao dispostos a aderir e respeitar a principios eticos e ordens sociais mas a pressao evolutiva dessa moral e produzida pelo interesse de cada individuo em atingir seus proprios objetivos.



Mucuna escreveu:Nesse modelo de anarcocapitalismo o sistema monetário seria o mesmo ou parecido?


O sistema monetario seria gerido pelo livre mercado. Competicao entre bancos.

Hoje, o sistema monetario de cada pais e um unico cartel de banqueiros encabecado pelo Estado.


Mucuna escreveu:Um exemplo de problema simples: Se uma empresa, uma empreiteira por exemplo, dá calote em milhares de pessoas que prestaram serviço (como muitas fazem hoje em dia), a quem essas pessoas poderiam recorrer? A alguma outra empresa? Como se essa não tem autoridade nenhuma sobre aquela?



Em ultima instancia, a ninguem. Em ultima instancia nunca ha ninguem a quem recorrer. A unica substancia que sobra e a confianca, uma vez que nao existem garantias 100% garantidas.

Pessoas que fazem negocio com uma empreiteira precisariam confiar nela, uma vez que sao responsaveis por seus proprios investimentos. A empreiteira poderia se mostrar no final das contas um esquema de escroquetagem? Sim. As pessoas entao perderiam seu dinheiro? Sim.

"Que droga, entao esse anarquismo e uma merda nao? Com Estado isso nunca aconteceria!"

O Estado nao elimina a corrupcao, ele apenas transfere a confianca que voce precisaria ter na empresa para os fiscais estatais. A menos que voce acredite no mito de que um fiscal do Estado tem menos propensao para ser escroque que um empresario, o Estado nessa situacao e uma mera entidade superflua, uma vez que seus proprios fiscais precisariam ser fiscalizados.

A solucao para os dois problemas e uma so: reputacao. Tanto empresarios quanto burocratas tem suas reputacoes a zelar, e esquemas de corrupcao revelados deterioram essa reputacao, prejudicando a eficacia de suas futuras empreitadas (sejam elas licitas ou nao).

Mas no mercado a reputacao funciona melhor, porque o consumidor e um eleitor melhorado. Ele pode trocar imediatamente suas escolhas, novas opcoes podem surgir a cada dia, e ele nao depende da opcao dos outros consumidores para conseguir mudar. Alem disso, ele pode votar quantas vezes quiser, se gostar muito de alguma coisa (seu voto mede a intensidade de sua vontade). Isso da muito mais poder e responsabilidade para o consumidor, que se sentira mais disposto a checar a reputacao daqueles que fazem negocio com ele.

Ja o eleitor politico depende dos demais eleitores para eleger seu candidato, possui apenas um voto a oferecer, nao importando se a questao e para ele de vida ou morte ou completamente superficial, e tem que esperar anos para tentar trocar seus candidatos e escolhas. No final, ele nao tem muito incentivo para pensar antes de votar, o custo de se informar sobre o historico dos politicos e refletir sobre as melhores propostas e maior do que o valor que ele da para seu voto.

Por isso que existem tantos politicos corruptos e incompetentes sendo eleitos, mas poucos empresarios de sucesso possuem historicos tao imundos (exceto quando sao filiados a politicos, o que nao e incomum).

A instituicao da democracia e um mercado muito defeituoso. Nada mais. Ela tambem nao te da nenhuma garantia contra esquemas corrupcao.


Mucuna escreveu:Outra questão: "leis" continuariam existindo, assim como contratos. Os burocratas iam existir do mesmo modo. Poderia diminuir a princípio, pois não existiria um Estado exigindo certos regulamentos, impostos, etc, mas poderia ser questão de tempo até incharem novamente o campo da burocracia. Todos estudando, interpretando, renegociando as "diretrizes gerais" que já norteavam as relações daquelas duas ou mais instituições e fazendo o mesmo a cada contrato específico.



Eu nao estou chamando de burocratas os profissionais ocupados de certos servicos administrativos, contabeis e juridicos, que de certo existem dentro e fora do Estado.

Os burocratas sao os funcionarios do Estado burocratico.


Mucuna escreveu:Uma pendenga surgida disso seria resolvida nas mesas de reunião. OK. Caso não conseguissem, um tribunal legitimado por um Estado não existiria para resolver isso (abro este parênteses para admitir que os tribunais não são necessáriamente garantia, como colocou no início, de justiça por inúmeros fatores, inclusive corrupção, mas como eles "já não existem", não tem porque discuti-lo. Quero só ver se outros modelos seriam de fato mais eficientes ou, eu diria, até mesmo diferentes em sua natureza do que temos hoje).


Pois e, voce aqui ja comecou a pensar como eu.

O Estado nao e garantia de solucao. Ainda que os mecanismos juridicos estatais de certa forma funcionem, eles nao garantem absolutamente nada.

Contudo voce apresenta ceticismo saudavel sobre a "funcionalidade" das solucoes alternativas.

Mas pense da seguinte maneira: pessoas assinam contratos porque veem vantagens mutuas nos termos ali estabelecidos. Contudo, elas temem que a outra parte nao cumpra com o que prometeu. Elas esperam assim que alguma justica seja feita nesses casos de violacao.

Duas pessoas que se conhecem bem quase sempre dispensam contratos formais para definir suas trocas, pois elas confiam uma na outra, ate um certo ponto (ou entao sabem que nao devem confiar, e nesse caso nao ha troca). Se uma das partes faltar com a outra ela sabe que perdera sua reputacao.

Duas partes que se desconhecem talvez tenham interesse em estabelecer um contrato, mas nesse caso e arriscado. Elas podem recorrer a uma terceira parte (uma empresa) que medie o contrato. Essas pessoas conhecendo e confiando nessa terceira parte vao aceitar fazer contratos com estranhos se eles forem mediados por essa empresa (que certamente cobrara por esse servico). Qualquer desentendimento sera arbitrado por nos termos definidos pelo mediador, e se alguma parte nao aceitar o que for deliberado, ela perde reputacao (com o mediador, dificultando futuros contratos).

O mediador nao pode ser sempre parcial: as duas partes tem que confiar no mediador antes de assinarem um contrato. A reputacao do proprio mediador para com relacao a todas as partes que ele vai mediar depende da sua imparcialidade e objetividade juridica.

Esses mediadores privados nao sao entidades que eu inventei. Um exemplo obvio sao os bancos comerciais. Eles "mediam" os contratos de emprestimo entre os credores e os devedores. Voce nao precisa conhecer a pessoa que a quem o seu banco vai emprestar o seu dinheiro, voce apenas precisa conhecer e confiar no seu banco.

Mas esse e um principio bem mais geral. Ja existem empresas de arbitragem mediando desde contratos de emprego de baixo escalao ate grandes parcerias empresariais. Principalmente na America. As pessoas la ja perceberam que nao podem contar com a lentissima, cara e incerta justica estatal, e varias solucoes privadas ja se desenvolveram e funcionam.

Os membros dos poderes legislativos e judiciarios nao fazem nada mais do que um servico bem porco de elaboracao de criterios para mediacao e analise de reputacao. E esse servico e ruim e caro porque eles sao monopolistas. Pelo menos na parte de direito civil.

Mas mesmo solucoes privadas podem emergir para o direito criminal, baseadas em ideias similares.


Mucuna escreveu:Então vamos lá. Ninguém se entendeu na mesa de reunião. Acontece. Um ou mais lados sentem-se com prejuízos consideráveis e injustos de acordo com seu entendimento. Como fica?

Uma opção é simplesmente não realizarem mais nenhum tipo de negócio dali em diante, não se relacionarem mais. Isso se a não for amargado nenhum prejuízo que comprometa seriamente a saúde financeira de dada pessoa jurídica (o termo não faz mais sentido, tudo bem). Onde resolver então se não der para simplesmente "deixar para lá" e absorver o prejú?

Pensei que poderia existir uma espécie de empresa de consultoria que seria então contratada e que após análises daria um parecer. Como nenhuma empresa está abaixo hierarquicamente desta hipotética empresa de consultoria, pois se houvesse isso, seria apenas uma forma de Estado com outro nome e forma, o lado que tivesse parecer contrário ao que estava alegando entender, não seria obrigado a pagar nada.

Aí você poderia dizer "Ah, mas se esta assim procedesse, cairia em descrédito no mercado e poderia estar garantindo sua extinção!". Sim, poderia. Logo ela se sentiria "obrigada" a acatar decisões de uma outra "empresa", formando uma hierarquia velada cuja a consequência da desobediência seria ser exinta do mercado. Generalizo dizendo que isto seria um tribunal meio que nos moldes como temos hoje.



Seu raciocinio e quase que impecavel, com ressalvas para a conclusao.

Voce mesmo deduziu o mecanismo de reputacao e mediacao entre partes que eu descrevi acima.

Ele seria similar, porem nao analogo ao Estado, pois as empresas de mediacao nao sao "hierarquicamente" mais poderosas, num sentido de obrigarem as partes a obedecerem suas deliberacoes. Sua primazia ocorre pelo interesse das partes em nao estragarem suas reputacoes para futuros negocios, um interesse de mercado.

As empresas mediadoras sao escolhidas pelos contratantes, e por essa razao elas proprias precisam ser confiaveis. Hoje, nos nao escolhemos os tribunais que nos julgarao, pois o Estado tem, pelo menos em principio, o monopolio da justica. Se o Estado resolver ser parcial, ele sera, sem que sofra perdas de mercado. Firmas juridicas atuando como mediadoras deveriam prestar bastante atencao a observacao de principios de justica e imparcialidade de maneira a serem reconhecidas pelos seus clientes como confiaveis.

Por exemplo, o Mc Donald's dificilmente seria associado a uma empresa juridica que desse ganho de causa a qualquer pessoa obesa que resolvesse processa-lo. Mas tambem os clientes do Mc Donald's nao teriam nenhum ganho de confianca no Mc Donald's se a empresa juridica associada a ele sempre fosse parcial a seu favor, mesmo em casos de negligencia sanitaria e intoxicacao alimentar onde estivesse comprovada a falha da empresa. Pelo menos, do ponto de vista dos consumidores, essa empresa seria superflua, pois nao aumentaria sua seguranca no contrato de servico que estabelecem com McDonald's.

O mesmo para os contratos de trabalho. Patroes nao aceitariam ser mediados por empresas "pro-funcionarios". Funcionarios nao reconheceriam mediadores "pro-patroes". As empresas que fossem mediar esses contratos precisariam aumentar a expectativa de justica para ambas as partes.

Evidentemente, nao e o que ocorre com a justica estatal, que possui parcos incentivos para ser parcial e fortissimos incentivos para ser imparcial, ora para um lado, ora para o outro.


Mucuna escreveu:Outras opções podem ser pensadas. Eu que no momento não vejo nenhuma opção muito diferente disso.


Estou de pleno acordo. Nao e possivel prever todas as possibilidades na teoria.

Mucuna escreveu:Há outras questões que me ocorrem agora mas não vou aprofundar como:

Existe dinheiro ainda? Quem "faz" o dinheiro e decide sobre?



Dinheiro e o tema mais interessante de economia, e talvez o menos compreendido, na minha opiniao.

A ideia basica e que o dinheiro nao e um papel que uns burocratas inventaram que tem um valor, mas e um meio de troca que surgiu por adocao espontanea de determinadas mercadorias mais apropriadas para tal fim (metais preciosos por exemplo). A moeda fiat moderna surgiu do interesse dos burocratas em produzir inflacao para financiar seus gastos correntes e suas guerras esporadicas.

Num mundo sem burocratas o dinheiro voltaria a ser uma commodity de troca que teria seu valor atrelado a algo real e nao ao (muito escasso) bom-senso dos banqueiros centrais e governantes. E claro que as pessoas nao andariam mais por ai com sacos de ouro, algo que ja nao existia mesmo antes de inventarem a moeda fiat. Mas uma miriade de titulos lastreados em ouro, prata, petroleo, gas, kilowatts*hora, mogno, carvalho, granito, fibra-optica, e acoes de todas as empresas existentes poderiam ser (e de fato sao) produzidos pelos bancos e servir de meio de troca. O mercado escolheria aquele(s) que parecesse(m) mais conveniente(s), como por varios milenios foi o caso do ouro.

Eu ja escrevi uns textos sobre dinheiro e historia monetaria aqui no forum, mas nao estou com tempo de procurar por todos. Nesse topico eu postei alguns comentarios sobre teoria monetaria, talvez te interesse ler.


Mucuna escreveu:Drogas recreativas e/ou medicinais (ou pretensamente medicianais ou em testes ainda) seriam totalmente liberadas e fáceis de serem encontradas. Digamos que muitos hoje tem problemas com este cenários.


Quem disse?

Eu nunca disse que a ausencia de Estado implicaria na ausencia de leis e de ordem, e que "tudo estaria permitido".

Em principio as drogas poderiam acabar sendo liberadas em certos casos, se as pessoas nao estivessem dispostas a impedir isso. Mas isso nao e diferente da situacao com Estado, onde elas sao liberadas pelos proprios Estados em alguns paises, e em outros e feita vista grossa, ou o Estado e incompetente demais para proibir.

Mas eu nao acho que uma sociedade sem Estado seria necessariamente mais drogada que uma com Estado, ou que nao poderia estabelecer suas proprias leis privadas contra a posse e comercializacao de narcoticos. Alias, acho que esse tipo de lei vigoraria na maioria delas, pelo menos contra as drogas mais pesadas, como ocorre hoje, com o Estado.


Mucuna escreveu:Claro que na prática, a sociedade resolveria os seus problemas, nem que seja na "porrada" como é feito tradicionalmente, mas o exercício é procurar uma forma "melhor" de sociedade e que não haja Estado mas empresas privadas. O caso é que, na minha imaginação e entendimentos, um anarcocapitalismo com o que temos hoje, acabaria se desenvolvendo meio que parecendo um feudalismo high-tech.


Feudalismo high-tech e de fato uma expressao bastante feliz. Ainda nao tinha me ocorrido.

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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Darkside »

Você tem razão Cabeção.

Uma pena que a maioria dos países desenvolvidos ocidentais optam pela dependência ao Estado em várias áreas da sociedade, assim não podemos ver como uma sociedade verdadeiramente livre se desenvolve na prática, o que eu considero requisito final pra aprovar o anarco-capitalismo.
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Herf »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Mucuna escreveu:Um exemplo de problema simples: Se uma empresa, uma empreiteira por exemplo, dá calote em milhares de pessoas que prestaram serviço (como muitas fazem hoje em dia), a quem essas pessoas poderiam recorrer? A alguma outra empresa? Como se essa não tem autoridade nenhuma sobre aquela?


Em ultima instancia, a ninguem. Em ultima instancia nunca ha ninguem a quem recorrer. A unica substancia que sobra e a confianca, uma vez que nao existem garantias 100% garantidas.

Pessoas que fazem negocio com uma empreiteira precisariam confiar nela, uma vez que sao responsaveis por seus proprios investimentos. A empreiteira poderia se mostrar no final das contas um esquema de escroquetagem? Sim. As pessoas entao perderiam seu dinheiro? Sim.

"Que droga, entao esse anarquismo e uma merda nao? Com Estado isso nunca aconteceria!"

O Estado nao elimina a corrupcao, ele apenas transfere a confianca que voce precisaria ter na empresa para os fiscais estatais. A menos que voce acredite no mito de que um fiscal do Estado tem menos propensao para ser escroque que um empresario, o Estado nessa situacao e uma mera entidade superflua, uma vez que seus proprios fiscais precisariam ser fiscalizados.

Ademais, calote por calote, não há lugar no mundo nem época na história onde o maior caloteador não tenha sido justamente o estado.

O grande problema é que o calote estatal se dá de forma muito mais indireta do que o calote praticado por um agente privado, e por isso nem sempre é reconhecido como tal por suas vítimas.

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Re: A falacia das garantias

Mensagem por carlo »

cabeção, pode tirar o cavalinho da chuva este treco que vc tá falando aí o Mucuna nunca vai concordar! Nem com o capeta 70!
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NOSSA SENHORA APARECIDA!!!!

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Re: A falacia das garantias

Mensagem por carlo »

carlo escreveu:cabeção, pode tirar o cavalinho da chuva este treco que vc tá falando aí o Mucuna nunca vai concordar! Nem com o capeta 70!


Ihhh, cara!!! E nem eu, eu vou mais é tomar umas a mais, a não ser que vc me explique tintim, por tintim, quem emite moeda nos EUA, se for for o FED, quem manda no FED?
Abraços!!!!
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por Aranha »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Cite mais especificamente os teoricos e as ideias aos quais voce estaria se referindo. Dito dessa forma nao poderia soar mais vago.


- Amanhã.

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Sobre os condominios, eles poderiam evoluir para Estados? Nao creio, nunca vi nenhum sindico perpetrar um coup d'état na vida, mas quem sabe?

Os condominios nao seriam entidades territoriais totalmente excludentes, nem teriam poder sobre ninguem a priori. As pessoas escolheriam se associar a diversos condominios e esses, por gerirem receitas e custos e precisarem agradar seus condominos, nao teriam condicoes de crescer muito alem da escala otima dos servicos que prestam.

Um condominio que crescesse demais se tornaria demasiado caro, o que acabaria forcando as pessoas a vender suas propriedades (que diminuiriam de preco consequentemente). Esse condominio logo se tornaria inviavel, ja que ele nao poderia contar com uma capacidade ilimitada de explorar seus condominos.

O mais provavel e que os contratos de condominio ja viessem com dispositivos que limitassem esse tipo de situacao.



- Condomínios podem crescer por associação, aqui em bsb mesmo isto ocorre em quadras, cada prédio tem seu condomínio a associação de todos condomínios da quadra forma uma prefeitura, a administração regional lida com prefeitos de quadra e não com síndicos.

- Não vejo porque este tipo de coisa não aconteceria em sua sociedade anárquica.

- Além disso você idealiza demais esses condomínios, vejo neles apenas um cenário em branco de onde pode sair qualquer coisa, até um bando de re-estatistas montando arsenais para dar fim à anarquia cor-de-rosa.

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Ben Parker

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user f.k.a. Cabeção
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Isso porque voce ainda esta achando que condominios sao analogos a Estados so que em miniatura.

Nao se trata disso.

Condominios sao meros prestadores de servicos locais. Eles concorrem entre si para atrair moradores.

Essa concorrencia os levaria a assumir a dimensao que minimizasse os custos operacionais, e nao um tamanho infinitamente grande.

Alem disso o condominio que opera sua energia eletrica nao necessariamente seria o mesmo do fornecimento agua ou de esgoto.

Nao ha problemas na aparicao de associacoes de condominios, assim como nao ha em associacoes de empresas. Desde que o condominio nao passe a achar que e o seu dono, como o Estado faz, ele podera agir dentro dos termos contratuais que voce e ele definiram.
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Re: A falacia das garantias

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Darkside escreveu:Você tem razão Cabeção.

Uma pena que a maioria dos países desenvolvidos ocidentais optam pela dependência ao Estado em várias áreas da sociedade, assim não podemos ver como uma sociedade verdadeiramente livre se desenvolve na prática, o que eu considero requisito final pra aprovar o anarco-capitalismo.



Nao e assim que eu vejo as coisas.

Eu nao defendo o anarquismo como um experimento politico a ser aprovado. Nada seria mais contraditorio do que tentar planejar uma sociedade livre. Esse tipo de arrogancia racionalista eu prefiro deixar a cargo dos socialistas.

Eu acredito que a sociedade evolui atraves do lento e gradual aprimoramento das suas tradicoes e instituicoes, que sao mecanismos extremamente complexos e impossiveis de serem completamente compreendidos e previstos pelos individuos.

A evolucao das instituicoes nao se produz atraves do plano consciente de homens que visam uma sociedade melhor. Nossa sociedade nao foi desenhada pelos lideres politicos e intelectuais do passado, a despeito da arrogancia dos nossos eminentes intelectuais e politicos atuais que creem piamente nisso.

Pelo contrario, a ordem social emerge das milhoes de decisoes espontaneas que os milhoes de individuos tomam no curso de suas vidas, decisoes quase sempre dizendo respeito apenas aos seus interesses, mas que contribuem para a formacao de uma coisa muito maior e que lhes escapa a primeira vista.

Um dos escolios do racionalismo cartesiano e do iluminismo frances (mas nao o unico) foi o cultivo da ideia arrogante de que a tarefa do intelectual era elaborar a sociedade do futuro com base na razao pura. Essa arrogancia racionalista e cientificista produziu os experimentos mais letais da historia humana.

Outros intelectuais foram muito mais humildes nos seus objetivos. Eles nao queriam ser arquitetos do futuro, mas compreender quais sao os mecanismos importantes, como eles se formam e como eles podem evoluir. Essa era a postura dos iluministas escoceses (Ferguson, Smith e Hume), assim como Kant e Hayek, contraposta ao impeto de reconstruir o homem incorporado em Voltaire, Russeau, Comte, Nietzsche e Marx.

Quando eu "proponho" uma sociedade anarquista, eu sei do risco que corro de ser tomado como sectario da mesma arrogancia racionalista desses ultimos. Mas nada poderia estar mais errado.

A minha "proposta" nada tem de revolucionaria. Locke ja tinha uma compreensao muito ampla da contradicao entre a liberdade individual e a instituicao do Estado. Eu apenas acompanho os passos seguintes que foram dados por outros pensadores que lentamente perceberam o quao redundantes eram as instituicoes estatais, o quanto a sociedade se estruturava em mera confianca e o quanto a valorizacao das instituicoes de liberdade individual contribuia para a ampliacao dessa confianca, ainda que a primeira impressao seja o contrario.

Nao creio que qualquer tentativa de expulsar o Estado baseando-se nos protocolos genocidas que guiaram os experimentos sociais dos seculos passado (Revolucoes Francesa, Russa, Alema, etc.) possa ser considerada razoavel. O Estado, por ser contraditorio com nossos valores mais caros, seria banido, nao pela violencia revolucionaria, mas por um triunfo da percepcao, conservacao e ampliacao, conscientes ou nao desses valores.

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Re: A falacia das garantias

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