
Explosão dos Rolling Stones fez história nas areias de Copacabana
Jamari França - Globo Online
RIO - Uma "bigger bang" explode no telão de 13 metros de altura, meteoritos coloridos voam, um "space shuttle" surge voando, guitarras e aparelhos de som passam, o ruído é quase ensurdecedor. Keith Richards entra em cena martelando o riff de ''Jumping Jack Flash'', Mick Jagger ataca "I was born in a crossfire hurricane...". Começara um dos shows mais memoráveis a passar pelo Brasil , a inquestionável maior banda de rock'n'roll do mundo na cidade conhecida internacionalmente, na sua praia mais famosa, com transmissão para os Estados Unidos, Canadá e México diante de uma platéia recorde de 1,2 milhão de pessoas. Vinte músicas em duas horas de show com uma precisão impressionante. Quando Mick Jagger, Keith Richards, Ron Wood e Charlie Watts fizeram seu agradecimento final e deixaram o palco eram 23h45m e o show começara, como combinado, às 21h45.
O set de 20 músicas foi quase todo de sucessos, um privilégio exclusivo de bandas com alta quilometragem. Mick Jagger cheio de simpatia e quase amor, como o bloco que desfilara horas antes em Ipanema, falou muitas frases em português ajudado por um teleprompter,o que lhe permitiu saudar o povo com um "Tudo bain? Boa noche galera" após a segunda música, "It's only rock'n'roll". Além das canções de "A bigger bang", os Stones pegaram uma única canção dos anos 90, "You got me rocking" (Voodoo Lounge, 1997) e se concentraram nos anos 60 e 70, incluindo desconhecidas por aqui como ''Get off of my cloud'', tocada quando um pedaço do palco se deslocou 60 metros para ficar a apenas três metros do povão.
Nas condições peculiares do show de Copa, com o público muito distante, eles podiam ter estendido os números dessa parte, mas ficaram no previsto, uma música no deslocamento para a frente, ''Miss you'', duas músicas lá, ''Get off'' e ''Rough justice'' e uma quarta na volta ao palco principal, ''Honky tonk women''. Executada pela primeira vez na turnê no palco B, praticamente dentro do público, ''Rough justice'' foi um belo presente para a galera. É um rockão de primeira à altura de mísseis como ''Rocks off'' e ''If you can't rock me''.
Outro presente foi a canção de Ray Charles "Night time is the right time", tocada apenas três vezes este ano. Trata-se de um bluesão que vai direto às origens da banda. Os Stones eram cinco moleques de classe média que se amarravam na música negra americana mais autêntica (os Beatles preferiam a diluição da Motown). A vocalista Lisa Fischer arrasou nesta música, de minissaia brilhante e pernas maravilhosas, lembrando a TinaTurner com quem os Stones excursionaram na virada dos 60 para os 70. Se eles tivessem tocado "Gimme Shelter", Lisa teria dado outro show. Ficaram devendo esta. Na balada ''Wild horses'', Lisa e o vocalista Bernard Fowler dançaram agarradinhos.
Quando pegou a gaita para uma maravilhosa interpretação de 12 minutos de ''Midnight rambler'', a melô do estrangulador de Boston, Jagger fez uns corinhos de ''uuuhum'' e a seguir disse ''John Lee Hooker'', numa alusão ao grande mestre do blues. Mais adiante fez um ''oh yeah'' gutural a la Muddy Waters ( vejam no nosso especial, Stones e Muddy cantando ''I'm a man'' ), duas homenagens aos influenciadores da banda.
Keith Richards, a ruína roquenrol em pessoa, arrasou no set de duas músicas, "This place is empty" e ''Happy''. "É bom estar de volta. É bom estar em qualquer lugar," disse Keith, numa prova de que não abre mão de um dos seus grandes vícios, a estrada. Seu companheiro de guitarra, Ron Wood, solou muito o show inteiro, especialmente no que faz de melhor, a slide guitar. Ele brilhou no set de Keith num violão e numa guitarra tipo weissenborn (havaiana) - e ainda em ''You got me rocking''.
Charlie Watts, que passou por um tratamento para câncer no pescoço, mostrou o vigor e a precisão de sempre, mandando umas viradas sempre que a banda fazia um pequeno intervalo entre uma música e outra para tomar água e trocar de guitarras. O baixista Daryll Jones, que andou se aventurando pela boate Help, fez seu solo em "Rain fall down" e segurou bem a cozinha com Charlie.
Outro veterano da banda de apoio, Chuck Leavell, se destacou nos pianos de ''Miss you'', ''Sympathy for the devil'' e no órgão de ''You can't always get what you want''. O naipe de sopros, com músicos de formação jazzística e o roqueiro Bob Keys, foi bem prejudicado na mixagem de som. Keys brihou apenas no solo de ''Brown sugar'', soltando os bichos no sax tenor.
Foi um show imperdível que pode ser o último da banda no Brasil, já que são velhotes que tiveram uma vida de excessos. Mas se o rock for mesmo o elixir da juventude, como diz a lenda, as pedras vão continuar a rolar.
SLIDES COM FOTOS NA MATÉRIA DO GLOBO, E ALGUMAS MÚSICAS. BEM LEGAL:
http://oglobo.globo.com/online/cultura/
E como sempre, têm coisas que não podem faltar em um show grátis no Brasil:

Na saída do show, dois homens começam a trocar socos

Na saída, os fãs dos Stones encontraram ônibus lotados e engarrafamentos

A Avenida Nossa Senhora de Copacabana ficou parada depois do show
http://oglobo.globo.com/online/cultura/ ... 836510.asp
Mick Jagger sofre para agradar VIPs e corre para os braços do povo. Mas volta

Rodrigo Pinto - Globo Online
RIO - Foi difícil esquentar os privilegiados que viram o show dos Rolling Stones bem de pertinho. Estranha mas previsivelmente, a platéia de VIPs se conteve e demorou a ceder aos incontáveis encantos de Mick Jagger, Keith Richards, Charlie Watts, Ron Wood e seus comparsas. Enquanto desfilavam seu colar de clássicos do rock, os Stones se remeteram sempre ao infinito, um lugar no horizonte onde todo mundo é igual - embora ouça e reaja ao som gerado pela máquina stoniana com bastante atraso, numa metáfora perfeita do que é a sociedade brasileira, com sua pequena quantidade de privilegiados e uma imensa massa à qual a informação chega incompleta e com injusto retardo.
Em "You got me rocking", Mick fez sua primeira tentativa de aquecer a turma da frente, correndo pela passarela que o levaria mais perto da platéia livre. Com sucesso moderado nas investidas, acabava se mostrando mais preocupado em agradar a multidão, erguendo os braços e o microfone e apontando para o "fundo do salão".
Sugestivamente, em "Miss you", a banda se reuniu na pequena parte móvel do palco principal e, deslizando por uma ponte, fez parecer que a falta sentida na letra da canção era a do povo. Os Stones são filhos do proletariado inglês, como boa parte do rock britânico que fez diferença. E foi entre o povo brasileiro, em meio à platéia aberta, de costas para a elite "very important", que Mick encontrou a resposta que buscava até então: calor e vibração sem medida da inconseqüência.
E soltou incontrolavelmente a franga, o que se queria dele.
O rock não pode prescindir deste contato íntimo, dessa bolinação irresistível que coloca todo mundo no mesmo patamar. Como disse Keith Richards a certa altura do concerto, "é bom estar em qualquer lugar". Mas, como o rock é também um gênero cheio de contradições e até mesmo bizarrices, a banda voltou a seu lugar no presente - afinal, trata-se de um punhado de ingleses célebres, ricos e, sim, incontestavelmente talentosos - e retrocedeu, pela mesma ponte, à frente da imensa área negra dos VIPs. E tocou "Simpathy for the devil". Fez o maior sentido.
'Simpathy for the devil', pseudo-samba no retorno aos VIPs
Jagger, de cartolinha e fraque, regeu a platéia, extraiu com poderosas poções de animação mais um pouco do morno sangue VIP. E cuspiu de volta - como tantas vezes durante a carreira - a vibração sedutora e sombria que cerca este hino, um pseudo-samba, composto depois de uma das incursões dele e de Richards pela densa cultura popular brasileira.
Na seqüência, "Start me up" incendiou definitivamente qualquer alma que não fosse sebosa. E, logo depois, no bis, veio "You can't always get what you want", cujo refrão diz, em resumo, que se você não pode ter tudo que quer, se tentar, pode ter tudo o que precisa. Ai, ai, ai.
Para fechar, Mick voltou com uma camisetinha com a bandeira do Brasil, uma legítima representante da moda do Saara, área de comércio popular no Rio de Janeiro. Quem sai aos seus não degenera, já dizia a avó da gente.
Depois do evento, a organização de uma das áreas VIPs (eram duas, uma à esquerda e outra à direita, tomando toda a frente do palco) soltou um comunicado sobre os presentes:
"Na área vip Claro Motorola, os quatro mil convidados, selecionados pela promoter Alicinha Cavalcanti, curtiram o show com muito entusiasmo. Entre os famosos que circularam por lá estavam Rodrigo Santoro e a namorada Ellen Jabour, Mariana Ximenez, Fernanda Lima, Thiago Lacerda e Vanessa Loes, Vanessa Camargo, Júnior, Priscila Fantin, Dado Dolabela, Vera Fisher, Rogério Flausino, Luis Fernando Guimarães, Malu Mader e Tony Belotto, Serginho Groisman, Debora Bloch e Olivier Anquier, Bruno Gagliasso, Murilo Benício, Cauã Raymond, Camila Pitanga Preta Gil, Supla, Alessandra Negrini e Otto, Felipe Dylon, Beth Lago, Beth Gofman, Christiane Torloni, Vitor Fasano, Tuca Andrada, Malvino Salvador e Ana Luiza Castro, Aline Moraes e Giovana Antonelli. O evento reuniu fãs de todas as tribos e idades, que cantaram juntos todos os hits da banda e dançaram sem parar. Malu Mader, Flávia Alessandra e Suzana Vieira, esta de pé quebrado, foram as mais animadas e deram um show na pista."
Muitos foram hostilizados, numa espécie de corredor polonês que aguardava, na saída, os célebres - não os da banda que se apresentou. Os VIPs não têm culpa. Não se trata de culpar ninguém, afinal é difícil encontrar um ser humano que renuncie a privilégios - inclusive, há os que gozam destes mesmos privilégios simplesmente para questioná-los depois, por escrito. Mas, ainda assim, em espetáculos como esse, há de se encontrar soluções menos ofensivas ao artista e seu público, que não usa abadás nem é escoltado por seguranças particulares para atravessar a rua e chegar ao show.
Eu particularmente gostei muito do show, em especial do organista da banda de apoio deles. O cara mandou muito bem no orgão Hammond!