Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Tapando o Sol com peneirinha de chá...
[center]Derretimento de geleiras deve provocar o desaparecimento de cidades[/center]
ECOLOGIA : 8/3/2006 Vindas das mais variadas fontes, as notícias sobre o futuro da humanidade não são nada boas. Não há mais volta: mesmo que mudemos radicalmente nossa forma de relação com o planeta a partir de hoje, o prejuízo causado por nossas ações predatórias já atingiu um nível tamanho que o derretimento das geleiras deve provocar o desaparecimento de todas as cidades ao nível do mar no máximo até o final deste século. Essa triste previsão está num artigo publicado há pouco mais de um mês pelo cientista britânico James Lovelock, autor da famosa Teoria de Gaia (segundo a qual a Terra assemelha-se a um organismo vivo, com mecanismos para auto-regular suas funções).
Ainda segundo Lovelock, a elevação da temperatura em até 8ºC nas regiões temperadas e 5ºC nos trópicos vai provocar também, antes de 2100, impactos desastrosos no equilíbrio ecológico, como a extinção maciça de espécies vegetais e animais e o desaparecimento de vastas áreas selvagens como a Floresta Amazônica, decretando o fim da maior parte da vida na Terra, com a morte de milhões, talvez bilhões de pessoas. Na opinião do cientista, governos sérios e responsáveis deveriam começar a desenvolver cartilhas com orientações aos sobreviventes sobre como lidar com as difíceis condições de vida neste futuro sombrio.
A reação do mundo a um alerta como esse, vindo de um dos mais reconhecidos cientistas do nosso tempo, deveria ser de comoção popular. Deveríamos parar tudo e começar a centrar nossos esforços em formas de ao menos minimizar os tenebrosos efeitos anunciados. Mas nada disso aconteceu e tudo segue normalmente como se essa fosse apenas mais uma notícia trivial e corriqueira. Um jornal publica o artigo, outro dá uma nota curta e seca e assim vamos tocando nossas vidas normalmente.
Essa atitude seria compreensível se a visão de Lovelock fosse apenas uma no meio de outras conflitantes. Poderíamos confortavelmente acusá-lo de louco, exagerado, catastrófico. Mas não é o caso. Já não são levadas a sério as cada vez mais raras correntes científicas que colocam em dúvida o fato de que a Terra sofre um processo de aquecimento acelerado, dificilmente reversível.
Segundo o Instituto Goddard de Estudos Espaciais, da Nasa, 2005 foi o ano mais quente desde o início dos registros climáticos modernos, em 1890. E, pior, de acordo com o instituto, todos os cinco anos mais quentes durante este período ocorreram na última década, mostrando clara tendência de aquecimento global. Um representante do órgão declarou à imprensa que, usando medições indiretas que vão a um passado ainda mais remoto, o ano passado foi provavelmente o mais quente dos últimos milhares de anos. Mais uma notícia que lemos e viramos a página, sem dar muita atenção.
Mais: um aumento de 3ºC na temperatura média da Groelândia duplicou a quantidade de água que suas geleiras vêm derramando no Oceano Atlântico, segundo recentes pesquisas do Laboratório de Propulsão a Jato e do Instituto de Tecnologia da Califórnia. Há registros de diminuição das geleiras no Himalaia, nos Andes, no Monte Kilimanjaro, e a única estação de esqui da Bolívia, Chacaltaya, fechou porque sua neve está acabando.
Acha pouco? A lista é longa, o espaço de um artigo é limitado. O diretor da Pesquisa Antártica do Reino Unido, Chris Rapley, disse, em janeiro passado, durante reunião da Sociedade Americana para o Avanço da Ciência, que algumas partes da camada de gelo da Antártida começaram a derreter em um ritmo assustadoramente intenso e anormal. Rapley afirmou que, há apenas cinco anos, a Antártida era considerada como um gigante adormecido em termos de mudança climática. "O gigante despertou e é melhor que se preste atenção nele", disse o cientista. Ninguém parece muito preocupado. A humanidade finge não ver o que está acontecendo.
Enquanto isso, James Hansen, o principal especialista em mudança climática da Nasa, denuncia uma tentativa do governo dos EUA de silenciá-lo. A campanha começou depois de um discurso proferido em dezembro passado, quando Hansen pediu a rápida redução na emissão dos gases estufa, relacionados ao aquecimento global. Segundo ele, diretores da Nasa deram ordem aos responsáveis pelas relações públicas do órgão para revisar os textos de suas futuras conferências, suas publicações no sítio do instituto na Internet e para controlar os pedidos de entrevistas de jornalistas.
Há caminhos que podem ser trilhados se a humanidade realmente abrir os olhos para a questão. Uma série de ações voltadas ao fomento de fontes de energia renováveis, em um livro elaborado por 250 analistas internacionais, foi apresentada recentemente pelo diretor-executivo da Agência Internacional da Energia, Claude Mandil. Aparecem, entre elas, as energias produzidas pelo vento, o sol, as fontes geotérmicas e os oceanos. Ótimo, não? Não, se o raciocínio que só encontra sentido na produção otimizada e no lucro continuar reinando absoluto. Segundo o próprio Mandil, o grande problema de suas propostas é o custo econômico alto para trazê-las para a prática, o que, segundo diz, inviabiliza suas iniciativas e faz os governos se mostrarem reticentes a elas.
Por que é que a gente é assim? Por que fechamos os olhos para estes alertas, apesar de estar claro que é apenas uma questão de tempo para as conseqüências nefastas de essas previsões começarem a afetar brutalmente nossas vidas e, principalmente, as vidas de nossos filhos e netos? Acho que a nossa espécie, apesar da capacidade relativamente bem desenvolvida de prever o futuro, é menos competente na hora de mudar suas atitudes, mesmo quando colocada contra a parede. Enquanto não superarmos esta limitação, não haverá espaço para a esperança.
Redação 360
Danilo Di Giorgi
ECOLOGIA : 8/3/2006 Vindas das mais variadas fontes, as notícias sobre o futuro da humanidade não são nada boas. Não há mais volta: mesmo que mudemos radicalmente nossa forma de relação com o planeta a partir de hoje, o prejuízo causado por nossas ações predatórias já atingiu um nível tamanho que o derretimento das geleiras deve provocar o desaparecimento de todas as cidades ao nível do mar no máximo até o final deste século. Essa triste previsão está num artigo publicado há pouco mais de um mês pelo cientista britânico James Lovelock, autor da famosa Teoria de Gaia (segundo a qual a Terra assemelha-se a um organismo vivo, com mecanismos para auto-regular suas funções).
Ainda segundo Lovelock, a elevação da temperatura em até 8ºC nas regiões temperadas e 5ºC nos trópicos vai provocar também, antes de 2100, impactos desastrosos no equilíbrio ecológico, como a extinção maciça de espécies vegetais e animais e o desaparecimento de vastas áreas selvagens como a Floresta Amazônica, decretando o fim da maior parte da vida na Terra, com a morte de milhões, talvez bilhões de pessoas. Na opinião do cientista, governos sérios e responsáveis deveriam começar a desenvolver cartilhas com orientações aos sobreviventes sobre como lidar com as difíceis condições de vida neste futuro sombrio.
A reação do mundo a um alerta como esse, vindo de um dos mais reconhecidos cientistas do nosso tempo, deveria ser de comoção popular. Deveríamos parar tudo e começar a centrar nossos esforços em formas de ao menos minimizar os tenebrosos efeitos anunciados. Mas nada disso aconteceu e tudo segue normalmente como se essa fosse apenas mais uma notícia trivial e corriqueira. Um jornal publica o artigo, outro dá uma nota curta e seca e assim vamos tocando nossas vidas normalmente.
Essa atitude seria compreensível se a visão de Lovelock fosse apenas uma no meio de outras conflitantes. Poderíamos confortavelmente acusá-lo de louco, exagerado, catastrófico. Mas não é o caso. Já não são levadas a sério as cada vez mais raras correntes científicas que colocam em dúvida o fato de que a Terra sofre um processo de aquecimento acelerado, dificilmente reversível.
Segundo o Instituto Goddard de Estudos Espaciais, da Nasa, 2005 foi o ano mais quente desde o início dos registros climáticos modernos, em 1890. E, pior, de acordo com o instituto, todos os cinco anos mais quentes durante este período ocorreram na última década, mostrando clara tendência de aquecimento global. Um representante do órgão declarou à imprensa que, usando medições indiretas que vão a um passado ainda mais remoto, o ano passado foi provavelmente o mais quente dos últimos milhares de anos. Mais uma notícia que lemos e viramos a página, sem dar muita atenção.
Mais: um aumento de 3ºC na temperatura média da Groelândia duplicou a quantidade de água que suas geleiras vêm derramando no Oceano Atlântico, segundo recentes pesquisas do Laboratório de Propulsão a Jato e do Instituto de Tecnologia da Califórnia. Há registros de diminuição das geleiras no Himalaia, nos Andes, no Monte Kilimanjaro, e a única estação de esqui da Bolívia, Chacaltaya, fechou porque sua neve está acabando.
Acha pouco? A lista é longa, o espaço de um artigo é limitado. O diretor da Pesquisa Antártica do Reino Unido, Chris Rapley, disse, em janeiro passado, durante reunião da Sociedade Americana para o Avanço da Ciência, que algumas partes da camada de gelo da Antártida começaram a derreter em um ritmo assustadoramente intenso e anormal. Rapley afirmou que, há apenas cinco anos, a Antártida era considerada como um gigante adormecido em termos de mudança climática. "O gigante despertou e é melhor que se preste atenção nele", disse o cientista. Ninguém parece muito preocupado. A humanidade finge não ver o que está acontecendo.
Enquanto isso, James Hansen, o principal especialista em mudança climática da Nasa, denuncia uma tentativa do governo dos EUA de silenciá-lo. A campanha começou depois de um discurso proferido em dezembro passado, quando Hansen pediu a rápida redução na emissão dos gases estufa, relacionados ao aquecimento global. Segundo ele, diretores da Nasa deram ordem aos responsáveis pelas relações públicas do órgão para revisar os textos de suas futuras conferências, suas publicações no sítio do instituto na Internet e para controlar os pedidos de entrevistas de jornalistas.
Há caminhos que podem ser trilhados se a humanidade realmente abrir os olhos para a questão. Uma série de ações voltadas ao fomento de fontes de energia renováveis, em um livro elaborado por 250 analistas internacionais, foi apresentada recentemente pelo diretor-executivo da Agência Internacional da Energia, Claude Mandil. Aparecem, entre elas, as energias produzidas pelo vento, o sol, as fontes geotérmicas e os oceanos. Ótimo, não? Não, se o raciocínio que só encontra sentido na produção otimizada e no lucro continuar reinando absoluto. Segundo o próprio Mandil, o grande problema de suas propostas é o custo econômico alto para trazê-las para a prática, o que, segundo diz, inviabiliza suas iniciativas e faz os governos se mostrarem reticentes a elas.
Por que é que a gente é assim? Por que fechamos os olhos para estes alertas, apesar de estar claro que é apenas uma questão de tempo para as conseqüências nefastas de essas previsões começarem a afetar brutalmente nossas vidas e, principalmente, as vidas de nossos filhos e netos? Acho que a nossa espécie, apesar da capacidade relativamente bem desenvolvida de prever o futuro, é menos competente na hora de mudar suas atitudes, mesmo quando colocada contra a parede. Enquanto não superarmos esta limitação, não haverá espaço para a esperança.
Redação 360
Danilo Di Giorgi
- Fernando Silva
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- Registrado em: 25 Out 2005, 11:21
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Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Parece com esses filmes sobre tragédias: alguém avisa e as autoridades o desacreditam por várias razões: medo de parecerem ineficientes, medo de afastar os turistas, coisas "mais importantes" para se preocupar, como política etc.
Quando a tragédia ocorre, ninguém está preparado.
Realmente, um dos problemas é que, a partir de um certo ponto, não adianta mais tomar medidas para evitar o aquecimento. O castelo de cartas, mantido em equilíbrio por tanto tempo, desaba e não se reconstrói sozinho. Ou seja, quando as pessoas se convencerem do desastre, já era.
Quando a tragédia ocorre, ninguém está preparado.
Realmente, um dos problemas é que, a partir de um certo ponto, não adianta mais tomar medidas para evitar o aquecimento. O castelo de cartas, mantido em equilíbrio por tanto tempo, desaba e não se reconstrói sozinho. Ou seja, quando as pessoas se convencerem do desastre, já era.
Re: Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Fernando Silva escreveu:Parece com esses filmes sobre tragédias: alguém avisa e as autoridades o desacreditam por várias razões: medo de parecerem ineficientes, medo de afastar os turistas, coisas "mais importantes" para se preocupar, como política etc.
Quando a tragédia ocorre, ninguém está preparado.
Realmente, um dos problemas é que, a partir de um certo ponto, não adianta mais tomar medidas para evitar o aquecimento. O castelo de cartas, mantido em equilíbrio por tanto tempo, desaba e não se reconstrói sozinho. Ou seja, quando as pessoas se convencerem do desastre, já era.
Parece mesmo, Fernando. No filme O Dia depois de Amanhã, fica muito patente que as autoridades jamais cedem à pressão das previsões, a não ser quando já se tornam eventos...

Não sei até que ponto é para evitar histeria coletiva. Mas de toda forma, acobertamento dos culpados, nesse caso, só vai aumentando o problema. Alguma coisa teria que ser feita sim.
Beijos
Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Bom, não precisamos mais nos preocupar com a violência no Rio.
E vocês achando que o Garotinho não tem capacidade administrativa... afffff....
E vocês achando que o Garotinho não tem capacidade administrativa... afffff....
The Pensêitor admitindo que estava enganado: http://www.rv.cnt.br/viewtopic.php?p=53315#53315
Eu concordando plenamente em algo com o VM: http://www.rv.cnt.br/viewtopic.php?p=239579#239575

Eu concordando plenamente em algo com o VM: http://www.rv.cnt.br/viewtopic.php?p=239579#239575

Re: Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
aknatom escreveu:Bom, não precisamos mais nos preocupar com a violência no Rio.
E vocês achando que o Garotinho não tem capacidade administrativa... afffff....



Faz sentido...

Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
POLUIÇÃO AMBIENTAL
Um assunto público que foi privatizado
Sandro José (*)
Em matéria publicada em 12/2/06 no jornal A Gazeta (ES), a poluição perdeu o rosto: a maresia, o clima seco e até os ventos que vêm do mar são os responsáveis pela "poeira negra"! Enquanto isso, o governo estadual, que deveria fiscalizar, abre mão desse nosso direito e o entrega à empresas "mais eficientes" na medição e no controle da poluição! O que é melhor, o jornal foi totalmente parcial, pois negligenciou informações e, coisa comum, foi aos consultórios médicos saber o que pensam os especialistas...
Pelo amor de deus! A poluição é um assunto público que foi privatizado. Explico. Nos anos 70 e 80 havia inúmeros movimentos sociais que indicavam a poluição como um dos males que afetavam as pessoas na era moderna, fosse na cidade ou no campo. Denúncias de contaminação não faltavam naquela época, e a pressão pela fiscalização fez surgirem os institutos governamentais encarregados do monitoramento da poluição. O forte apelo dos movimentos sociais estava vinculado à percepção do avanço do capitalismo sobre a vida cotidiana e a eliminação da qualidade de vida em favor do progresso. O progresso não chegava a todos, mas a poluição, com certeza.
Nos Estados Unidos foi constatado que as regiões mais degradadas ambientalmente acomodavam as populações mais desprestigiadas naquele país, como negros e latinos. Quanto mais favelado o lugar maior exposição a produtos tóxicos. As empresas no mundo inteiro se adiantaram em criar elas próprias o que seria o padrão aceitável de poluição. Vieram as normas e os médicos, especialistas em gente, e o Estado fizeram coro e assinaram embaixo. Tudo se resolveu. Mais ou menos. As pessoas continuam a morrer de câncer no campo e na cidade, o nível de intoxicação do ar é alarmante em muitas capitais e as franjas da cidade se tornaram um depósito de gente exposta ao que de pior podemos produzir.
Reféns do modelo
No Espírito Santo, onde a onda do desenvolvimentismo ainda não atingiu a administração sonolenta, morrem crianças envenenadas por produtos tóxicos proibidos no mundo inteiro, uma paisagem lunar se cria a cada nova mina de mármore descoberta, quase 10% da Mata Atlântica do estado viraram eucalipto, as empresas monitoram elas próprias seus níveis de poluição, com certeza sempre abaixo dos níveis máximos, enquanto eu e você temos que conviver com esgoto a céu aberto quando fazemos compras nos shoppings.
Não fique triste, você está no centro e paga por tudo isso. Será que a poeira negra é mais fatal que a branca?, perguntaria uma criança. Para as ciências sociais a natureza é uma construção social. Ela está inscrita de diferentes maneiras na história das sociedades porque interessaram à humanidade de diferentes formas. Poluir, em nosso exemplo, é um termo ambíguo, pois envolve uma percepção religiosa da maioria das pessoas. Um dos fundamentos do sagrado é estar separado do impuro. Todas as religiões buscam isto em seu cotidiano ritual, que quer tornar o profano sagrado. No cotidiano, estas operações pela busca do sagrado como limpo é uma obsessão que os inúmeros produtos de limpeza não me deixam mentir.
No nosso caso, esse quadro foi construído de maneira a separar o meio ambiente e os seres humanos, tornar estas coisas "coisas", retirando delas seu sentido de integração e atribuindo-lhes uma equação. Quando culpam os carros pela poluição é como se eles não fizessem parte do desenvolvimento gerado pelos grandes projetos. O mundo da técnica separou os saberes comuns como formas não-científicas de tratar do assunto da poluição e, portanto, passou a desconsiderá-las como uma forma legítima de conhecer. À situação de pobreza das pessoas foi colado um rótulo de ignorante e, daí, a descaracterização dos seus direitos. Isso provocou um movimento inverso de "colagem" dos saberes tradicionais na natureza, vista como coisa simples. Daí eles estarem desautorizados a falar sobre assuntos que são "coisas técnicas". Assunto de pobre se tornou violência, controle de natalidade e cesta básica.
A poluição é uma coisa pública porque afeta o direito das pessoas a se indignarem com ela. O técnico, a lei, o nível aceitável de poluição são invenções de alguns humanos e podem mudar. Se a partícula tem 0,00005mg ou uma tonelada isso não afeta o direito das pessoas se manifestarem, isso sob pena de ficarmos reféns do modelo de natureza e direito criados pelos outros.
Um assunto público que foi privatizado
Sandro José (*)
Em matéria publicada em 12/2/06 no jornal A Gazeta (ES), a poluição perdeu o rosto: a maresia, o clima seco e até os ventos que vêm do mar são os responsáveis pela "poeira negra"! Enquanto isso, o governo estadual, que deveria fiscalizar, abre mão desse nosso direito e o entrega à empresas "mais eficientes" na medição e no controle da poluição! O que é melhor, o jornal foi totalmente parcial, pois negligenciou informações e, coisa comum, foi aos consultórios médicos saber o que pensam os especialistas...
Pelo amor de deus! A poluição é um assunto público que foi privatizado. Explico. Nos anos 70 e 80 havia inúmeros movimentos sociais que indicavam a poluição como um dos males que afetavam as pessoas na era moderna, fosse na cidade ou no campo. Denúncias de contaminação não faltavam naquela época, e a pressão pela fiscalização fez surgirem os institutos governamentais encarregados do monitoramento da poluição. O forte apelo dos movimentos sociais estava vinculado à percepção do avanço do capitalismo sobre a vida cotidiana e a eliminação da qualidade de vida em favor do progresso. O progresso não chegava a todos, mas a poluição, com certeza.
Nos Estados Unidos foi constatado que as regiões mais degradadas ambientalmente acomodavam as populações mais desprestigiadas naquele país, como negros e latinos. Quanto mais favelado o lugar maior exposição a produtos tóxicos. As empresas no mundo inteiro se adiantaram em criar elas próprias o que seria o padrão aceitável de poluição. Vieram as normas e os médicos, especialistas em gente, e o Estado fizeram coro e assinaram embaixo. Tudo se resolveu. Mais ou menos. As pessoas continuam a morrer de câncer no campo e na cidade, o nível de intoxicação do ar é alarmante em muitas capitais e as franjas da cidade se tornaram um depósito de gente exposta ao que de pior podemos produzir.
Reféns do modelo
No Espírito Santo, onde a onda do desenvolvimentismo ainda não atingiu a administração sonolenta, morrem crianças envenenadas por produtos tóxicos proibidos no mundo inteiro, uma paisagem lunar se cria a cada nova mina de mármore descoberta, quase 10% da Mata Atlântica do estado viraram eucalipto, as empresas monitoram elas próprias seus níveis de poluição, com certeza sempre abaixo dos níveis máximos, enquanto eu e você temos que conviver com esgoto a céu aberto quando fazemos compras nos shoppings.
Não fique triste, você está no centro e paga por tudo isso. Será que a poeira negra é mais fatal que a branca?, perguntaria uma criança. Para as ciências sociais a natureza é uma construção social. Ela está inscrita de diferentes maneiras na história das sociedades porque interessaram à humanidade de diferentes formas. Poluir, em nosso exemplo, é um termo ambíguo, pois envolve uma percepção religiosa da maioria das pessoas. Um dos fundamentos do sagrado é estar separado do impuro. Todas as religiões buscam isto em seu cotidiano ritual, que quer tornar o profano sagrado. No cotidiano, estas operações pela busca do sagrado como limpo é uma obsessão que os inúmeros produtos de limpeza não me deixam mentir.
No nosso caso, esse quadro foi construído de maneira a separar o meio ambiente e os seres humanos, tornar estas coisas "coisas", retirando delas seu sentido de integração e atribuindo-lhes uma equação. Quando culpam os carros pela poluição é como se eles não fizessem parte do desenvolvimento gerado pelos grandes projetos. O mundo da técnica separou os saberes comuns como formas não-científicas de tratar do assunto da poluição e, portanto, passou a desconsiderá-las como uma forma legítima de conhecer. À situação de pobreza das pessoas foi colado um rótulo de ignorante e, daí, a descaracterização dos seus direitos. Isso provocou um movimento inverso de "colagem" dos saberes tradicionais na natureza, vista como coisa simples. Daí eles estarem desautorizados a falar sobre assuntos que são "coisas técnicas". Assunto de pobre se tornou violência, controle de natalidade e cesta básica.
A poluição é uma coisa pública porque afeta o direito das pessoas a se indignarem com ela. O técnico, a lei, o nível aceitável de poluição são invenções de alguns humanos e podem mudar. Se a partícula tem 0,00005mg ou uma tonelada isso não afeta o direito das pessoas se manifestarem, isso sob pena de ficarmos reféns do modelo de natureza e direito criados pelos outros.
"Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma." (Joseph Pulitzer).
- Storydor
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Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Só falta dizer que a próxima glaciação [ periódica ] foi adiantada e antes de 2060 vai acontecer 

"E quem era inocente, hoje já virou bandido, só para comer um pedaço de pão fudido" Chico Science


- Ateu Tímido
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Re.: Tapando o Sol com peneirinha de chá...
Vocês não sabiam que o aquecimento global não existe? A prova irrefutável é o inverno russo.
http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm= ... 9845722176
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