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O Exército não festejou o golpe, nem comemorou o 31 de março
O general Albuquerque, comandante do Exército, exorbitou, ultrapassou os próprios limites, não consultou ninguém, não recebeu autorização para dizer o que disse, surpreendente.
Portanto não falava em nome do Exército, que o reprovou silenciosamente. (Por causa da hierarquia e disciplina.) Sua fala foi inesperada, inusitada e não aprovada. O general Albuquerque não representava nem representa verdadeiramente o Exército como um todo.
E não falava pelos generais "golpistas" de 64, não era um deles, obviamente por causa da idade. Em 1964 ninguém sabia quem era o oficial Francisco de Albuquerque. Que agora, na sexta-feira reviveu velhas feridas, que por um compromisso mútuo e tácito ficaram sepultadas embora não esquecidas.
O problema do general Albuquerque é com o governo e deveria ter sido demitido na própria sexta-feira, logo depois dessa assombrosa e desgastante ordem do dia. O general Albuquerque, ocupando um cargo de confiança, de nomeação do próprio presidente da República, teria até o direito de violar a Ética e o compromisso, como violou, se fizesse o pronunciamento, não em ordem do dia, mas sim em discurso de despedida.
A República nasceu militar, militarista e militarizada, mas o Exército sempre respeitou os limites do comportamento humano. Sempre desejou o Poder, sempre viveu à sombra do Poder, sempre se agitou em torno do Poder, mas jamais com o apoio da tropa, da oficialidade do Exército propriamente dito.
Em diversas e muitas oportunidades, uma parte do Exército apoiou ditaduras nefastas, mas não ficou com o Poder, sua vocação era democrática. Apoiou o cruel e sangrento Estado Novo, mas não foi o Exército e sim alguns generais. Esse Exército todo de verde, aí sim, como um todo, combateu de armas na mão contra o fascismo e o nazismo, na Segunda Guerra Mundial. Mas em plena guerra, visitado pelo então ministro da guerra, mandou o ultimatum ao ditador apoiado por alguns generais ambiciosos: "Quando voltarmos, queremos o fim da ditadura. Não tem sentido expor a vida combatendo o nazi-fascismo e conviver com ele dentro de casa". Chegaram, 3 meses depois acabava a ditadura.
Esse era o Exército BRASILEIRO, que nas lutas pela Abolição se recusou a perseguir negros fugidos da escravidão. E que manteve sempre a nobreza, a grandeza e a generosidade, com a exclusão de alguns generais ocasionais. Como os generais da cúpula de 64, que criaram ali perto do Maracanã glorioso, o DOI-CODI odioso e o AI-5 monstruoso. Esse não é o Exército BRASILEIRO e também não é representado pelo general Albuquerque.
O episódio não está encerrado com a fala de Waldir Pires, duplamente surpreendido: com a sua escolha para ministro da Defesa e com a obrigação de responder ao general Albuquerque. (Embora com a sua nomeação não pudesse ficar surpreendido. Há 3 meses, quando era candidato a senador, eu lhe disse: "Waldir, você será o novo ministro da Defesa, José Alencar vai se desincompatibilizar". E publiquei o fato, que se confirmou.)
A tentativa do general Albuquerque de ressuscitar episódios já enterrados, não agradou ao Exército. Principalmente porque no Chile e na Argentina, que tiveram ditaduras militares mais curtas, os generais golpistas continuam sendo punidos e execrados. E o "apoio popular" do qual falou o general Albuquerque, vai para as punições e não para a impunidade. Como Waldir Pires só tomará posse hoje à tarde, espero que não precise dizer mais nada sobre o episódio que já estará encerrado com a demissão do general.
PS - Mais grave de tudo foi o fato do general ter utilizado o nome do Exército como um todo, para curar ou amenizar o ressentimento por causa do episódio do avião parado em plena pista. Na oportunidade, o pára-quedas do general não abriu. Agora nem usou pára-quedas, acreditou que não precisava.
"Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma." (Joseph Pulitzer).