07 de junho de 2006 - 10:10
Sem-terra que depredaram Câmara serão levados para presídioBRASÍLIA - Os 545 sem-terra presos em Brasília na terça-feira, depois de depredar instalações da Câmara dos Deputados e ferir 26 pessoas, vão ser levados para o Presídio da Papuda. Antes disso eles passam pelo Instituto Médico Legal (IML) para fazer exame de corpo de delito. Os presos passaram a noite no Ginásio Nilson Nelson, mas 11 líderes do grupo ficaram na 2ª Delegacia de Polícia de Brasília.
A vítima mais grave dos ataques, Normando Fernandes, está consciente e passa por novos exames nesta quarta-feira, segundo boletim médico do Hospital Santa Lúcia. Fernandes teve traumatismo craniano ao ser atingido por uma pedra lançada pelos invasores da Câmara. Ele é coordenador de Apoio Logístico do Departamento de Polícia Legislativa.
No presídio da Papuda, os detidos ficarão em uma ala nova, que comportará até mil pessoas mas ainda não inaugurada por falta de agentes carcerários. Segundo o Comando de Policiamento do DF, como o grupo não oferece maiores riscos, a vigilância das celas deverá ser feita pelas polícias Militar e Civil.
Eles devem responder por crimes contra o patrimônio público, lesão corporal grave, formação de quadrilha e corrupção de menores (havia crianças e adolescentes no grupo que invadiu e depredou a Câmara).
Flagrante e transferênciaOs presos, todos integrantes do Movimento pela Libertação dos Sem-Terra (MLST), foram autuados em flagrante e fichados pela polícia. O trabalho só terminou por volta de 1h30 desta quarta.
Os líderes do movimento ficaram na 2ª DP, localizada na Asa Norte de Brasília, para serem ouvidos pelo Departamento de Polícia Legislativa da Câmara (Depol) - que coordenará o inquérito - e pela própria Polícia Civil.
O primeiro depoimento, de Bruno Maranhão, líder do MLST, encerrou-se por volta das 3h30 desta quarta.
Inicialmente foram identificados 11 líderes. Entre eles está Arildo Joel da Silva, 21 anos, morador em Lindo Oeste (PR), apontado como o agressor do servidor Fernandes.
Também foi identificada Francielli Acencio, 21 anos, moradora de Uberaba (MG), que apareceu nas imagens destruindo os terminais de auto-atendimento e os computadores da portaria do anexo 2 com uma barra de ferro e de concreto.
CriançasDurante a madrugada, por volta de 1 hora, um grupo de 15 crianças e adolescentes, acompanhados por 10 mães, foi transferido para um alojamento do próprio movimento dos sem-terra, localizado na cidade-satélite do Guará.
Meia hora depois, outras 27 que estavam desacompanhadas - com idade entre 12 e 17 anos - foram removidas para o SOS Criança, localizado na cidade-satélite de Taguatinga.
Essas 52 pessoas (42 menores de idade) foram separadas do grupo principal logo no início da noite e levadas para a Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA), da Polícia Civil.
A separação atendeu a uma determinação do presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo, de que todas as regras e leis vigentes no que se refere a direitos e deveres de presos fossem aplicadas e cumpridas - incluindo a que prevê a separação entre adultos e crianças.
AlimentaçãoA Câmara adquiriu marmitas de comida para todo o grupo, que recebeu alimentação pouco depois da meia-noite. Foram servidos salada, batata, arroz, feijão e carne.
O Diretor-Geral da Câmara, Sergio Sampaio acompanhou todos os procedimentos administrativos durante toda a madrugada.
Direitos humanosLogo no início da noite, o grupo recrbeu no ginásio a visita da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Seção DF, e de um grupo de integrantes do Ministério Público. Eles foram averiguar as condições de prisão do grupo, mas não identificaram problemas.
O Departamento Médico da Câmara dos Deputados e o Corpo de Bombeiros do DF montaram um plantão médico no ginásio. Até as 3 horas foram realizados cerca de 30 atendimentos, sendo que apenas um - o de um rapaz com cardiopatia - precisou de remoção para atendimento hospitalar.
O policiamento estava sendo feito por duas companhias da Polícia Militar, com aproximadamente 80 homens.
Invasão, depredação e agressãoA invasão das dependências da Câmara começou no início da tarde de terça-feira e durou cerca de seis horas. Ao fim de tudo, havia um rastro de destruição entre o Anexo 2 e o Salão Verde da Câmara.
Os sem-terra destruíram um automóvel Uno no estacionamento do Anexo 2, quebraram a porta de vidro e depredaram vários equipamentos, como os postos informatizados de atendimento ao público. Enquanto tentavam chegar ao plenário da Casa, os manifestantes quebraram vasos de plantas, painéis e maquetes de uma exposição.
Dos feridos, 24 são funcionários do Legislativo atingidos por pedradas, pauladas e socos. Um agente de segurança quebrou a perna ao ser jogado de uma altura de cerca de três metros próximo à escada rolante que dá acesso à entrada do subsolo do Anexo 4.
De acordo com informações da Secretaria de Comunicação da Câmara, dois manifestantes também saíram feridos.
MotivosSegundo o MLST, o grupo veio a Brasília para reivindicar a revogação da medida provisória que impede a vistoria em terras ocupadas e mais dinheiro para reforma agrária. Segundo ele, os manifestantes vieram da Bahia, de São Paulo e Minas Gerais.
O presidente da Câmara chegou a conversar rapidamente o líder do grupo, Bruno Maranhão, e avisou que não haveria negociação enquanto a Câmara estivesse ocupada, além de avisar que tinha dado a ordem para que todos fossem presos.
Após ser informado sobre a ordem de prisão, Maranhão pediu para que os manifestantes deixassem a Câmara e se concentrassem em frente ao prédio do Congresso.
Ali, policiais da Câmara prenderam Bruno Maranhão, que passou mal e caiu no chão. Maranhão foi abordado por oito policiais da Câmara que lhe deram ordem para acompanhá-los. Ele se negou a obedecer a ordem dos policiais e foi agarrado por um dos agentes, que o dominou com uma "gravata".
Os invasores conseguiram a promessa de uma audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros da Fazenda e do Desenvolvimento Agrário.
DissidênciaO MLST é uma dissidência do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem-terra. Atua principalmente no Estado de Pernambuco.
Surgiu em agosto de 1997 e é formado por militantes de esquerda e por ex-lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O movimento tem representantes em Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Maranhão. O movimento tem melhor organização em Pernambuco.
O movimento já invadiu, em abril do ano passado, o Ministério da Fazenda em Brasília. A ocupação também foi comandada por Bruno Maranhão.
Cerca de 1.200 manifestantes tomaram todos os andares do prédio, reivindicando a liberação de recursos para a reforma agrária.
Fonte:
Jornal O Estadode São Paulo