Questão de Cristologia

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Questão de Cristologia

Mensagem por Apo »

A FÉ DO SENHOR JESUS

Para muitos teólogos não há como atribuir fé a Jesus. Uns a excluem dele, por causa da "visão beatifica". A visão de Deus e sua fruição plena eliminam a fé, conforme o próprio Paulo nos lembra (lCor l3,8-l3). Outros a negam por causa de sua autoconsciência de Filho e de sua visão imediata do Pai, que não deixariam espaço algum para a fé.

Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

A fé não deve ser concebida, primariamente, como adesão a verdades reveladas, mas, no sentido bíblico, como entrega confiante e pessoal a Deus. Ora, a auto-entrega de Jesus visa ao Pai. Ela integra a "vida religiosa" de Jesus, sua vida de oração. Ao longo de sua existência terrena, doou-se a si mesmo ao Pai, procurou cumprir sua vontade e somente a ela se prendeu. Não de forma passiva, mas sempre ajustando-se, livremente, a ela e envidando todas as suas energias humanas para executá-la. Essa conformação à vontade do Pai transforma-se, porém, em "fé cega", quando, no cenário da agonia no horto, a vontade do Pai se torna obscura e Jesus tem de procurá-la entre tormentos e lágrimas. Criou-se, então, misteriosa distância entre a vontade do Pai e a vontade humana de Jesus, distância que Jesus vivenciou profundamente e superou pela oração. Cabem à cena da agonia as palavras da Carta aos Hebreus:

"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão. Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).
Temos acima a descrição perfeita do que representou a vida de fé para Jesus em seus aspectos mais trágicos e profundos: a luta na busca da vontade do Pai e na submissão a ela, uma confiança indestrutível nela e o abandono total a ele na obediência máxima e, graças a tudo isso, o crescimento do homem Jesus em sua filiação divina e em seu poder salvífico em prol da bumanidade. E de notar também que a Carta aos Hebreus descreve Jesus como o "iniciador da fé e (quem) a conduz à realização" (12,12). Origem ou modelo, ou ambas as coisas? Seja qual for a interpretação desse texto, ele transluz, junto com o Evangelho de João, a expressão mais profunda da fé que Jesus depositava em Deus, seu Pai. A compatibilidade dessa fé com a autoconsciência de Jesus como Filho e com sua "visão imediata" do Pai será exposta [posteriormente], quando se falar, explicitamente, da vontade humana e do sofrimeuto de Jesus. Já que o sentido de dependência do Pai vivido por Jesus era a expressão humana de sua relação filial intratrinitária, isso pressupunha, mais do que contrariá-la, sua identidade de Filho. A fé que havia em Jesus não anula nossa fé em Jesus, mas fundamenta-a. Faz parte da cristologia implícita do Jesus terreno, no qual se baseia a cristologia explícita da Igreja apostólica.

Jacques Dupuis
"Introdução à Cristologia" - ed. Loyola - pp. 162 - 175
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Fernando Silva
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fernando Silva »

Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

Como assim, fé, se ele era Deus e sabia de tudo? Como Jesus poderia precisar de fé?
"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão".

Como assim, foi atendido, se acabou morrendo na cruz?
E essa morte não fazia parte do plano, desde o início?
Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).

Como assim, "aprendeu" ?
Ele já não sabia de tudo o que iria acontecer, sendo Deus?

Quanto blá-blá-blá vazio...

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Aranha
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Aranha »

Fernando Silva escreveu:
Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

Como assim, fé, se ele era Deus e sabia de tudo? Como Jesus poderia precisar de fé?
"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão".

Como assim, foi atendido, se acabou morrendo na cruz?
E essa morte não fazia parte do plano, desde o início?
Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).

Como assim, "aprendeu" ?
Ele já não sabia de tudo o que iria acontecer, sendo Deus?

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- Tudo isso se responde pelo dogma que reza que JC era 100% Deus e 100% homem ao mesmo tempo, seja lá o que isto for.

Abraços,
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Fenrir
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fenrir »

Fernando Silva escreveu:
Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

Como assim, fé, se ele era Deus e sabia de tudo? Como Jesus poderia precisar de fé?
"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão".

Como assim, foi atendido, se acabou morrendo na cruz?
E essa morte não fazia parte do plano, desde o início?
Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).

Como assim, "aprendeu" ?
Ele já não sabia de tudo o que iria acontecer, sendo Deus?

Quanto blá-blá-blá vazio...


Um teologo, nao me lembro bem no momento se Santo Anselmo, explicou o dogma trinitario mais ou menos da seguinte forma: "Assim como a fonte, o curso e a foz do rio Nilo nao sao a mesma coisa, todas sao chamadas Nilo e todas sao Nilo (uma vez que suas aguas formam o Nilo e sao parte do Nilo - acrescimo meu), assim Pai, Filho e Espirito Santo sao o mesmo, mas sao tambem distintos, tres pessoas em uma: unidade divina na diversidade de pessoas" (mais ou menos isto, acho).

Apelando para o dogma, um teologo,responderia facilmente estas questoes dizendo que Cristo pode e deve ter fe enquanto filho e o fato de ser participe do trindade divina e portanto se identificar com Deus, nao invalida esta fe ja que ele a tem enquanto filho e nao enquanto pai.

Sobre ser atendido ou aprender, poderia o teologo responder da mesma forma.

Porem, isto causa um problema espinhoso: voltemos a analogia de sto. Anselmo(?) com o Nilo e vamos supor que as tres pessoas divinas compartilham a consciencia assim como a fonte, o curso e a foz do Nilo compartilham a agua.
Ora se compartilham a consciencia, entao devem compartilhar o conhecimento de serem Deus e portanto as dificuldades que o Fernando apontou continuam e a colocacao do hipotetico teologo nao soluciona o problema.

Se, ao contrario, nao compartilham a mesma consciencia, entao seria possivel ao filho ser de natureza divina e ao mesmo tempo nao ser consciente disso? Caso afirmativo, pareceria entao termos tres Deuses e nao um so e o dogma se desfaz!
Caso nao fosse possivel, reverteriamos a posicao do paragrafo acima...
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emmmcri
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por emmmcri »

Fernando Silva escreveu:
Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

Como assim, fé, se ele era Deus e sabia de tudo? Como Jesus poderia precisar de fé?
"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão".

Como assim, foi atendido, se acabou morrendo na cruz?
E essa morte não fazia parte do plano, desde o início?
Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).

Como assim, "aprendeu" ?
Ele já não sabia de tudo o que iria acontecer, sendo Deus?

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Fernando Deus pede fé ao homem por isso, ele sabe que não temos capacidade para entende-lo, ter fé nos podemos .
Abraços.
"Assombra-me o universo e eu crer procuro em vão, que haja um tal relógio e um relojoeiro não.
VOLTAIRE

Porque tanto se orgulhar de nossos conhecimentos se os instrumentos para alcançá-los e objetivá-los são limitados e parciais ?
A Guerra faz de heróis corajosos assassinos covardes e de assassinos covardes heróis corajosos .
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Fenrir
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fenrir »

emmmcri escreveu:...
Fernando Deus pede fé ao homem por isso, ele sabe que não temos capacidade para entende-lo, ter fé nos podemos .
Abraços.


Nao foi o que o fernando quis dizer, emmmcri.
Ele perguntou, dentre outras coisas porque Cristo que se identifica com Deus
(sendo participe da trindade divina), precisa ter fé.
Logo, ele não se referiu ao homem e a alegada incognoscibilidade do Deus da ICAR, mas sim de Cristo e a fé de Cristo.

Por favor leia de novo o que o Fernando postou e minha resposta ao post dele.
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Fernando Silva
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fernando Silva »

emmmcri escreveu:Fernando Deus pede fé ao homem por isso, ele sabe que não temos capacidade para entende-lo, ter fé nos podemos .
Abraços.

Só que, para acreditar em que Deus pede fé ao homem, é preciso ter fé.

Em resumo: temos que ter fé em que é preciso ter fé.

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Apo
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Apo »

Fenrir escreveu:
Fernando Silva escreveu:
Recentemente, porém, alguns teólogos afirmaram que Jesus viveu uma verdadeira vida de fé, constituindo-se, na verdade, no modelo perfeito e paradigmático da fé.

Como assim, fé, se ele era Deus e sabia de tudo? Como Jesus poderia precisar de fé?
"Foi ele quem, durante sua vida terrena, ofereceu orações e súplicas com grande clamor e lágrimas àquele que podia salvá-lo da morte, e foi atendido por causa de sua submissão".

Como assim, foi atendido, se acabou morrendo na cruz?
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Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelos próprios sofrimentos, e, levado até a própria consumação, veio a ser, para quantos lhe obedecem, causa da salvação eterna" (5,7-9).

Como assim, "aprendeu" ?
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Um teologo, nao me lembro bem no momento se Santo Anselmo, explicou o dogma trinitario mais ou menos da seguinte forma: "Assim como a fonte, o curso e a foz do rio Nilo nao sao a mesma coisa, todas sao chamadas Nilo e todas sao Nilo (uma vez que suas aguas formam o Nilo e sao parte do Nilo - acrescimo meu), assim Pai, Filho e Espirito Santo sao o mesmo, mas sao tambem distintos, tres pessoas em uma: unidade divina na diversidade de pessoas" (mais ou menos isto, acho).

Apelando para o dogma, um teologo,responderia facilmente estas questoes dizendo que Cristo pode e deve ter fe enquanto filho e o fato de ser participe do trindade divina e portanto se identificar com Deus, nao invalida esta fe ja que ele a tem enquanto filho e nao enquanto pai.

Sobre ser atendido ou aprender, poderia o teologo responder da mesma forma.

Porem, isto causa um problema espinhoso: voltemos a analogia de sto. Anselmo(?) com o Nilo e vamos supor que as tres pessoas divinas compartilham a consciencia assim como a fonte, o curso e a foz do Nilo compartilham a agua.
Ora se compartilham a consciencia, entao devem compartilhar o conhecimento de serem Deus e portanto as dificuldades que o Fernando apontou continuam e a colocacao do hipotetico teologo nao soluciona o problema.

Se, ao contrario, nao compartilham a mesma consciencia, entao seria possivel ao filho ser de natureza divina e ao mesmo tempo nao ser consciente disso? Caso afirmativo, pareceria entao termos tres Deuses e nao um so e o dogma se desfaz!
Caso nao fosse possivel, reverteriamos a posicao do paragrafo acima...


É, já ouvi uma explicação muito semelhante. E acho mesmo que a trindade não faz o menor sentido. Só há uma chance ( a meu ver ) de não se dissolver: que haja níveis diferentes não acessiveis a cada um dos três, por características nã atribuídas por Deus como ele é caracterizado em sua onipotência. Seria como criar um filho gêmeo geneticamente, mas que desenvolve ( auto-imune) características distintas, que o possibilitam um certo arbítrio, consciências parcialmente não compartilhadas. Mesmo assim, Deus perderia uma boa parte de seu poder, ou concede a Jesus, em alguns momentos, esta dissociação ( enquanto homem).
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Fenrir
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fenrir »

Fenrir escreveu:Se, ao contrario, nao compartilham a mesma consciencia, entao seria possivel ao filho ser de natureza divina e ao mesmo tempo nao ser consciente disso? Caso afirmativo, pareceria entao termos tres Deuses e nao um so e o dogma se desfaz!
Caso nao fosse possivel, reverteriamos a posicao do paragrafo acima...


Acho que falhei neste raciocinio. O correto seria dizer que se não compartilhassem uma mesma "consciência divina", então haveriam
tres consciências divinas o que pareceria ser o mesmo que dizer
que haveriam tres deuses e não um só.
O fato de Cristo ser ou não ignorante de ter uma tal consciencia,
seja compartilhada, seja distinta das outras duas pessoas não
muda isto em nada.

De qualquer modo, a dificuldade de explicar a trindade persiste.
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Fernando Silva
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Re: Questão de Cristologia

Mensagem por Fernando Silva »

Demolindo o dogma da Santíssima Trindade
http://ateusdobrasil.com.br/artigos/con ... indade.php

Um texto sobre os paradoxos, contradições e origens do dogma.

Trancado