É de conhecimento de todos aqui, ainda que superficialmente, a realidade brasileira. Sabemos que vivemos em um país com péssima distribuição de renda, e com agudas divisões de classes sociais. Sabemos que existem verdadeiras “ilhas” de classe média em meio ao “oceano” das periferias/favelas.
Sabemos também que o morador da periferia tem um estereótipo definido: em sua maioria com baixa instrução, geralmente negros ou pardos, gostam de cultura popular, ou seja, um pagodinho, sertanejo, funk ou axé, pouca leitura, e assistem muita televisão e sua programação altamente instrutiva com programas do tipo Domingo Legal, Domingão do Faustão e cia.
Sabemos também que o jovem de classe média tem um certo estereótipo: bem instruídos, fazem universidade, geralmente gostam de contracultura ,bandas de rock, ou bandas exóticas, ou estilos musicais pouco conhecidos pela cultura popular. Ainda, leitura erudita, entre outras características...
Estas diferenças sociais e econômicas acabam propiciando o surgimento de “tribos de interesse”, ou seja, pessoas que se juntam pela proximidade de estilo de vida e de gostos culturais; por exemplo, ao dar “um rolê” pelo centro aqui de Campinas fui até a “Feira Hippie”... lá é o local onde vemos bem a manifestação das “tribos urbanas”. Roqueiros todos de preto, alguns com a cara pintada, carregando suas bebidas, cigarros e violões; as moças todas de preto, etc. Tem também os bixos-grilos, tipo “pseudo-hippies” em seus cantos de boa, também com violões.
Tem os “regueiros” com suas camisetas do Bob Marley e seus grandes “rastafaris”, enfim... aí, caindo pra periferia, dando um rolê, vejo nas esquinas a turma dos pagodeiros organizando suas festas, os “manos” passando em seus carros com o rap “no talo” quase no último volume. Por curtir rap, já fui em muitas festas do gênero, e elas são bem “tribais” também. “Manos” com camisetas dos Racionais, Bone Thugs-N-Harmony, 2Pac, Notorious BIG, Rakim entre outros rappers.
A grande dificuldade que tive para escrever este texto foi o medo de pecar na hora dos estereótipos. A única finalidade que tive até aqui foi demonstrativa. Agora entrarei no que realmente quero dizer:
Acho interessante tanta diversidade cultural apresentada em cada uma destas verdadeiras “tribos urbanas”... ACHO QUE UMA INTERAÇÃO SADIA deveria ser mais praticada; acho que todos só teriam a ganhar em aprendizado e conhecimento cultural. Por exemplo, eu como autêntico “Mano”, por ter a mente aberta e conseguir conversar, respeitar e aceitar todas as outras tribos a cada dia creços pra caramba como ser humano.
O que não aprecio é o preconceito que infelizmente acaba acompanhando grande parte das tribos. Roqueiros não gostam de pagodeiros, que não gostam de metaleiros, que não gostam de punks, que não gostam de axé... enfim, todos justificam estes “não gostar” em questão puramente de gosto, mas é evidente que há algo além de “gosto” nisso. Não sei se cada uma das tribos se sente “ameaçada” pela outra, ou a falta de conhecimento entre si gera a repulsa, mas o que sei é que a repulsa é evidente.
Por exemplo, o fórum “Religião é Veneno” evidentemente em sua maioria é freqüentado por pessoas altamente intelectuais, pois são poucos que conseguem romper com valores religiosos tradicionais devido ao conhecimento que adquiriram. E ao ver e participar do “Jogo” de bandas musicais, muitas bandas ali nunca nem ouvi falar, e olha que conheço bastante coisa! Tem horas em que, ao acessar o RV, sendo jovem negro e de periferia, me sinto tipo um “peixe fora d’água”. Imagina o cidadão de periferia que, quando quer ouvir música vai no camelô e pede “me dá uma coletânea boa de românticas ou internacionais ou baladas, ou axé, ou pagode aí, aquela música da malhação serve!”...
Existem até mesmo sites anti pagodeiros, isto na minha opinião é uma forma velada de preconceito racial. Não há motivos aparentes para qualquer manifestação de animosidade contra apenas este estilo musical. Será que sua origem negra não pesa um pouco? Se a intenção é conscientizar as pessoas a respeito de boa música, porque não sites anti músicas vulgares, independente do gênero? Mamonas Assassinas e Raimundos só falavam merdas de duplo sentido como o funk carioca está fazendo atualmente, mas, por ser rock não estão no alvo do pessoal que recomenda boa música? É uma questão.
Concluindo, pra mim fica difícil ouvir qualquer um deste fórum dizer que detesta rap e não notar preconceito. Acho que é hora de cada um reavaliar seus conceitos e ver se detesta rap porque não conhece o que de fato é o rap, e começar a respeitar um gênero musical tão rico e em fase de evolução. No Brasil as produções do gênero já foram muito ruins, devido à falta de recursos, muitos rappers já falaram muita besteira (vários grupos de rap nacional eu reprovo, como o Facção Central (letras com violência gratuita e muita apologia ao crime) e De Menos Crime (apologia gratuita à maconha) , mas o nível está melhorando e atualmente já temos bons grupos brasileiros. Vide: Apocalipse 16, DMN, Racionais, MV Bill, Helião e Negra Li, Ao Cubo, Professor Pablo, SNJ entre outros.