Mulheres marroquinas aderem ao véu islâmico

Fórum de discussão de assuntos relevantes para o ateísmo, agnosticismo, humanismo e ceticismo. Defesa da razão e do Método Científico. Combate ao fanatismo e ao fundamentalismo religioso.
Avatar do usuário
spink
Mensagens: 3106
Registrado em: 08 Nov 2005, 11:10
Gênero: Masculino
Contato:

Mulheres marroquinas aderem ao véu islâmico

Mensagem por spink »

Le Monde


Cada vez mais, as mulheres marroquinas aderem ao véu islâmico
Aos poucos, por meio de pressões mais ou menos sutis e de maneira subliminar, os costumes islâmicos vão se impondo na sociedade, dificultando a diversidade

Catherine Simon
enviada especial a Rabat, Marrocos

É uma revolução silenciosa, quase reprimida. Uma revolução verde, da cor do Islã. No centro de Casablanca, a capital da modernidade marroquina - onde, em 8 de março, dia da Festa internacional das mulheres, alguns restaurantes descolados eram reservados apenas à clientela feminina -, assim como em Marrakech, cujos palácios envelhecidos e cuja medina (parte antiga da cidade) se tornaram coqueluche da classe média francesa e dos ricos ocidentais, os visitantes passam ao lado sem nada perceber.

Contudo, basta dar uma curta volta por um dos bairros populares ou pelas ruas de uma aglomeração de porte médio, tal como Mohammedia, Oujda ou Meknès, para se ter uma idéia da sua amplidão. O "hidjab", o véu islâmico, tornou-se a regra.

Mas a "revolução verde" no reinado dos xerifes (título honorífico da família real marroquina, que significa "descendente de Maomé") vai muito além. "O mundo encolheu", resume Soukaina, que diz "não mais reconhecer" seu país, nem ela mesma. A história desta quadragenária professora de francês no ensino médio, que uma depressão nervosa conduziu, há um ano e meio, a deixar seu trabalho, e que só aceitou responder às nossas perguntas com a condição de não ter seu nome verdadeiro revelado, é ao mesmo tempo banal e exemplar da evolução dos países do Maghreb (da África do Norte), onde o domínio do islamismo, com ou sem representações partidárias, se revela profundo e duradouro.

No seu colégio, quando ela começou a trabalhar, vinte anos atrás, Soukaina recorda-se de que uma única professora trajava o hidjab. Hoje, é o inverso que acontece: ela faz figura de exceção, enquanto toda a população feminina do estabelecimento, inclusiva as alunas, usa o véu. Soukaina acabou não suportando mais a pressão.

"Nunca houve nenhum ataque direto por parte dos fundamentalistas", sublinha Soukaina. Foi antes um acúmulo de coisas minúsculas. Tais como aqueles comentários recorrentes a respeito das camisas femininas de mangas curtas, do batom ou das saias que deixam aparecer a panturrilha: "É uma pena começar o dia com uma roupa que é 'haram' (pecado)", comentam as docentes veladas a respeito das suas colegas, consideradas sem-vergonha.

Ou ainda aquele lenço de pescoço cor-de-rosa, que tiraninhas anônimas deixaram, em três oportunidades, no escaninho de Soukaina, no intento de lhe sugerir o caminho certo... "Alguém enfia uma pedrinha no seu bolso. Uma pedrinha não tem peso algum. Então, um dia, acaba ficando tão pesado que você se sente incapaz de se levantar".

Neste dia, a jovem mulher decide não mais retomar o caminho do colégio. Ela se sente oprimida, esgotada. As "pedrinhas" acabaram superando sua resistência. Esta depressão que a deixa arrasada, "é algo que eu carregava em mim havia muitos anos", garante hoje Soukaina. "Algo que eu não conseguia admitir para mim mesma: um fracasso, meu e da sociedade marroquina como um todo".

Nascida numa família citadina de 10 crianças, com o pai funcionário e a mãe iletrada, ambos "crentes e tolerantes", Soukaina nada tem de uma "intelectual", e menos ainda de uma militante. Ela é uma marroquina ordinária, uma muçulmana igual a tantas, que usa óculos e camisetas de moletom de cores escuras, que adora seu marido e seu filho pequeno, e que foi, numa outra vida, uma jovem mulher "alegre, muito confiante e positiva".

Hoje, sem ajuda de medicamentos nem de um psiquiatra, ela segue tentando retomar pé. "Quem teria acreditado que uma tal pessoa duvidaria dela mesma, um dia, assim como acontece com uma criança?", diz. Por mais que ela tivesse conseguido identificar certos aspectos do seu "fracasso", existem outros que a deixam aterrorizada. "Não diga a ninguém que eu estou sozinha", diz ela em voz baixa, antes de desatar num choro convulsivo.

Nesta tarde, enquanto ela está sentada num canto do salão de um grande hotel de Casablanca, as más notícias de Meknès ainda não chegaram até ela. Um jornal de língua árabe, além da revista semanal de língua francesa "Tel Quel" (Tal Qual) na sua edição de 11 de março, revelarão que cinco docentes, as únicas professoras não veladas da Escola superior das artes e profissões da universidade da antiga cidade imperial, receberam na sua caixa de correio, dentro do campus, uma missiva anônima.

Esta carta se inspirava num site fundamentalista na Internet para "aconselhá-las", em nome do islã, a trajarem o véu. "É a primeira vez que tais coisas acontecem no Marrocos", comenta, preocupado, o redator-chefe da "Tel Quel", Driss Ksikes. Ou, de maneira mais verossímil, que elas são denunciadas à luz do dia.

Nas universidades assim como nos bairros populares, o islamismo, lentamente, foi construindo seus feudos. E ele deveria colher em breve os frutos políticos dos seus avanços: ninguém parece duvidar da vitória dos islâmicos do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (PJD) nas próximas eleições legislativas, em 2007.

O caso de Meknès ou a depressão de alguém como Soukaina são apenas síndromes miúdas deste vasto movimento de reversão de tendência. As mulheres não são as únicas a serem alvejadas. Os homens também, de vez em quando, são objetos de maldades. Tais como este professor de El-Jedida, perto de Casablanca, vítima de uma campanha de rumores, apoiada por pichações nos muros, que o qualificam de "ateu" e de "infiel", por causa, provavelmente, das suas atividades culturais consideradas como não conformes ao dogma do Alcorão.

"Ele está sofrendo muito", comenta um dos seus amigos. "Os seus alunos se tornaram desconfiados; eles não o respeitam como antes". Em outros lugares, na universidade, alguns grupos de docentes rejeitam abertamente, sempre em nome do Islã, a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies ou o mito platônico da androginia, sobre a diferença dos sexos.

No início dos anos 90, no campus da faculdade de medicina de Casablanca, os estudantes islâmicos tentaram impor suas crenças à força. "Eles queriam que as aulas fossem interrompidas para a oração da tarde. Mas a reitoria não deixou. A universidade é um lugar do saber; existem outros próprios para a prática espiritual", lembra a professora Nouzha Guessous Idrissi, membro fundador da Organização marroquina dos direitos humanos (OMDH), que foi um dos integrantes, no início dos anos 2000, da comissão real consultiva para a revisão da Mudawana (o código da família marroquino).

No colégio de Soukaina, freqüentado pelos moleques dos bairros populares e das favelas, ninguém procurou "dar um basta" à escalada da perseguição carola. É lógico, ninguém se deu conta de nada. As mentes, assim como as roupas, foram mudando aos poucos, quase que insensivelmente, sem que haja debate algum, sem nenhum comício nem disputas.

As fotos de classe que Soukaina trouxe com ela são recordações de um outro século: "Olhe para esta; ela data de 1992: são todos os docentes do colégio, homens e mulheres, que estão posando juntos. Hoje, isso não seria mais possível". Alguns anos atrás, quando ela quis fazer com que os seus alunos trabalhassem com base no célebre desenho animado dos Pokémons, os adolescentes se recusaram a obedecer, sob pretexto de que "aquilo era de origem judaica". A professora foi obrigada a ameaçar a classe com sanções para que eles se executassem.

"O que está acontecendo com ela é uma história banal, mesmo se isso nem sempre acaba numa depressão", comenta, compassiva, Fadma Ait Mous, 33, uma doutorando em ciências políticas, que o "crescimento das intolerâncias, nos dois sentidos", deixa indignada.

"Para mim, é, sobretudo uma história absurda", rebate uma das suas amigas, Aicha Belhabib, 41, ela também doutoranda em ciências políticas. "Afinal, esta mulher não está sendo ameaçada por ninguém. Quem sabe, ela esteja com dúvidas em relação às razões que justificam o uso do véu, e não seria isso que a torna infeliz?", pergunta esta simpatizante do Partido da Justiça e do Desenvolvimento, ela mesma trajando o véu.

"Alguns muçulmanos comportam-se de maneira extremista, acusando outros de serem infiéis, por exemplo. Foi provavelmente o que aconteceu com ela", arrisca uma terceira doutoranda, Meriem Yafout, 36, uma dirigente da seção feminina da associação islâmica Al Adl Wal Ihssane, fundada pelo célebre xeique Yassine.

Ela também traja um hidjab. "É um passo importante em nosso caminhar rumo a Deus", explica. Uma colaboradora próxima a Nadia Yassine, a filha do veterano xeique e uma figura, bastante exposta pela mídia, do islamismo marroquino, Meriem Yafout diz ter sido ela mesma alvo "da discriminação e da intolerância" por usar o véu. Ela que pretendia se tornar jornalista enfrentou a rejeição da diretora de uma revista, que, segundo ela garante, considerou como "impossível recrutar uma mulher velada".

Contudo, o Marrocos é "um país muçulmano: está escrito na sua Constituição. Discriminar as mulheres velada é, portanto, contraditório com os princípios enunciados", afirma, sorrindo, a universitária de hidjab.

"Mais que o crescimento das intolerâncias, é o crescimento dos paradoxos que mais me impressiona", comenta a professora Guessous Idrissi, que se recorda de ter visto chegar ao campus da faculdade de medicina "um número cada vez maior de garotas veladas, mas, também, simultaneamente, um grande número de garotas trajando minissaia ou excessivamente maquiadas. Todas elas se entendem e convivem em paz", insiste a professora, "sem tensões nem violência".

Preciosa diversidade esta, da qual Soukaina, a sem-véu, parece ter sido
privada. "Os meus sonhos evaporaram", reconhece. "É só uma questão de tempo até vermos o islamismo nos comandos da nossa nação".
"Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma." (Joseph Pulitzer).

Avatar do usuário
Tranca
Mensagens: 11193
Registrado em: 24 Out 2005, 13:57
Gênero: Masculino
Localização: Aqui, ó.

Re.: Mulheres marroquinas aderem ao véu islâmico

Mensagem por Tranca »

Imagem

Assim eu sou a favor.
Palavras de um visionário:

"Seria uma ressurreição satânica retirarmos Lula e Brizola - esse casamento do analfabetismo econômico com o obsoletismo ideológico - do lixo da história para o palco do poder."

Roberto Campos

Trancado