Começo com uma das predições mais essenciais da Teoria Sintética da Evolução ( darwinismo + genética mendeliana ) desde sua elaboração há mais de 70 anos; espera-se que seres vivos mais aparentados possuam genomas mais parecidos. Essa predição é corrobada de forma independente pela embriologia, paleontologia, biogeografia mas mostro nesta postagem unicamente o suporte da biologia molecular.
A Teoria Sintética estaria falseada, por exemplo, se humanos tivessem DNAs mais parecidos com crocodilos do que elefantes. Não haveria convergência de evidência, em uma mesma teoria os fósseis apontariam para uma coisa e a genética para outra; poderia ter havido evolução, mas não da forma neodarwinista.
1) Uma resposta comum se segue; similaridade genética não implica em um ancestral comum, implica em um projetista em comum.
- A primeira resposta que dou é; qual a base científica dessa alegação? O fato de Pablo Picasso ter pintado quadros cubistas indica que todos os quadros cubistas foram pintados por Picasso? Poderia-se contra-argumentar que o traço de Picasso era característico e discernível de seus conteporâneos. Ora, os seus falsários replicaram as mesmas técnicas. Ou seja, múltiplos projetistas podem também produzir obras similares.
- A alegação não pode ser usada tendo o teísmo judaico-cristão como premissa; primeiro, porque ela incorre que os criacionistas entendem os desígnios divinos. E segundo, porque um Criador Onipotente poderia por definição criar os seres vivos que bem entender, Ele não estaria preso à padrões. Essa alegação também não seria falseável.
- Se é esperado de obras similares o mesmo projetista, então o argumento perde o valor ao se assumir a existência de somente um projetista porque ele também precisa acomodar a existência de seres vivos radicalmente diferentes uns dos outros tanto genética quanto morfologicamente.
Picasso pintou tanto quadros cubistas quanto expressionistas. Se um mesmo designer pode fazer trabalhos radicalmente diferentes e designers diferentes podem fazer trabalhos parecidos, então não existe um requerimento de que obras parecidas são esperadas por um mesmo projetista.
- A similaridade entre os DNAs de seres vivos mais aparentados é uma predição da Teoria Sintética que foi formulada muito antes do desenvolvimento de tecnologias de seqüencimento de genomas e não uma interpretação a posteriori, como o caso dos questionamentos criacionistas.
2) Outro tipo de questionamento é a visão de que o DNA funciona analogamente à uma linguagem de programação, portanto seres vivos estruturalmente parecidos precisam possuir códigos genéticos similares
- Primeiro o argumento é reducionista; existem fatores ambientais que influenciam na anatomia de seres vivos
- Segundo, o argumento parte do fenótipo para justificar o genótipo. Isso é refutado quando confrontamos animais fisionomicamente muito parecidos como o ictiossauro ( um réptil ) e um golfinho ( mamífero ) ou um bicho-pau ( inseto ) e vegetais típicos de seu ambiente. Similaridades fenotípicas nem sempre incorrem em genomas parecidos.
Mesmos designs em seres vivos de táxons diferentes habitando ambientes com pressões seletivas equivalentes é uma predição do oportunismo evolucionário. E seleção natural também explica satisfatoriamente o mimetismo deveras especializado de alguns insetos.
- Terceiro, só 3% do genoma é efetivamente expresso em proteínas. Os outros 97% nunca são traduzidos; cogitam-se várias possíveis funções para essa grande massa como importância estrutural para os novelos de cromossomos. Mas o ponto é que a organização sequencial desses bilhões de nucleotídeos não influem no fenótipo de seres vivos; por qual razão que os pseudogenes e não só os genes ativos são mais similares em formas de vida aparentadas?
3) Outro questionamento que li recentemente é que o fato de encontrarmos os mesmos constituintes químicos em oceanos ou minerais não implica que possuímos mesmos ancestrais em comum com essas estruturas; esse argumento não faz o menor sentido porque esses exemplos carecem de hereditariedade e replicação baseada em um código genético de ácidos nucleicos como propriedades físicas.
Então, por que pode-se utilizar similaridade genética para indicar ancestralidade comum com certeza?
Nem tudo que está presente no seu genoma é de procedência do seu organismo; existem parasitas celulares que durante infecções inserem seus códigos genéticos nos DNAs de células que tomam como hospedeiras. Notavelmente, retrovírus que se apropriam da enzima transcriptase reversa para converter em DNA seu código genético viral baseado em RNA e inserir no genoma das células hospedeiras para sua multiplicação.
Ao contrário do que eu havia informado em outros tópicos, a localidade genômica onde o DNA viral é inserido não é puramente aleatória; alguns estudos mostram que é preferencial sua inserção nos genes que são traduzidos com maior frequencia. Mas também não é puramente determinística.
Pense no ponto de vista de um retrovírus em especial. Pense agora que ele infectou uma célula. Pense que ele não infectou uma célula qualquer, mas uma célula germinativa. Pense que ele não infectou uma célula germinativa qualquer, mas uma célula germinativa que será fecundada e o zigoto se desenvolverá em um indivíduo que vai sobreviver e passar adiante esse DNA viral no seu genoma.
Hipotetize que esse ser vivo não é um indivíduo qualquer, mas um ser vivo que será ancestral de algum ancestral direto entre duas linhagens de primatas.
Imagine que esse evento nesse exato procedimento, apesar de sua raridade, ocorreu várias vezes em intervalos entre a divergência das linhagens de primatas.
Se o modelo neodarwinista estiver certo, o que esperamos que aconteça?
Esperamos compartilhar mais instâncias de DNA viral nas mesmas posições genômicas em primatas com DNAs mais similares do que os nossos.
O que os fatos mostram?
Analisem esse gráfico:

Ele mostra, em um cladograma, as instâncias do retrovírus HERV-K que são compartilhadas na família dos primatas.
Humanos possuem DNAs mais parecidos com chimpanzés do que com gibões; esperamos, portanto, pela Teoria da Evolução que humanos devem possuir um ancestral em comum com chimpanzés mais recente do que com gibões.
Humanos compartilham com chimpanzés 11 DNAs do retrovírus HERV-K nas mesmas posições genômicas ao passo que só compartilham 7 com gibões. A predição anterior foi confirmada.
Dado que esse evento é raro, você falsearia o modelo neodarwinista por exemplo se encontrasse 11 retrovírus HERV-K compartilhados com gibões e 7 com chimpanzés, ou 20 HERV-Ks com sagüis e 7 com gibões.
Esses pseudogenes até o presente momento mostraram-se como indicadores diretos de ancestralidade comum.
Similaridade genética, por si só, não indica ancestralidade comum. Mas unindo os retrovírus genéticos da biologia molecular, os estágios de desenvolvimento embrionário da biologia do desenvolvimento, o registro fóssil compatível com as predições macroevolucionárias e a disposição da biogeografia terrestre atual, observa-se uma convergência de evidência para uma mesma conclusão: todos os seres vivos desse planeta são parentes.
Os processos que levaram os mesmos a serem parentes e sua influência relativa ainda estão em constante debate e aperfeiçoamento.