Pessoal, tudo bem que às vezes algumas paixões sobre determinados assuntos podem fazer a gente se desviar do bom senso.Mas até irracionalidade tem limite!
Vejam só, o Night , assim como dez entre dez direitistas, citam os prêmios Nobel Friedrich Hayek e Milton Friedan como pessoas que defendem a mesma posição doutrinária que ele.O que ele parece não saber é que ser liberal é uma coisa, ser darwinista social é outra.Porque entre defender a extinção de políticas sociais compensatórias e se simpatizar pelo Darwinismo Social, é só um passo.Obviamente, eu posso provar como o argumento dele não tem fundamento citando argumentos de dois de seus ídolos (os dois principais gurus do Neoliberalismo): Hayek e Friedman.
Sobre o problema de como mitigar a pobreza, Friedman diz em “Capitalismo e Liberdade” (1984, Abril Cultural, p. 174,175):
“Primeiro, se o objetivo é mitigar a pobreza, deveríamos ter um programa para ajudar o pobre. (...)
O procedimento mais recomendável em bases puramente mecânicas seria o imposto de renda negativo.Temos atualmente uma isenção de 600 dólares por pessoa em termos de imposto de renda federal (mais um mínimo de 10% de dedução uniforme).Se um indivíduo receber renda de dólares em excesso, após o cálculo da isenção e da dedução, pagará certo imposto.De acordo com nossa proposta, se a renda for menos 100 dólares, isto é, 100 dólares abaixo da isenção mais a dedução, terá que pagar um imposto negativo, isto é, receber subsídio.Se a taxa do subsídio for, digamos, 50%, receberá 50 dólares.
(...)
Como qualquer outra medida para mitigar a pobreza, reduz o incentivo para que os ajudados se ajudem a si próprios, mas não o elimina inteiramente, como o faria um sistema de suplementação das rendas até um mínimo estabelecido.Um dólar extra ganho significa sempre mais dinheiro para gastar.”
Vejam só como Friedman refuta a falácia “o assistido não procura outras fontes de recurso para que possa realmente se incluir na sociedade através do trabalho”.No programa de renda mínima, o miserável que tem salário de mercado de 0 dólares (desempregado) irá receber 300 dólares, se receber de salário de 100 dólares terá renda total de 350 dólares, se o salário for de 200 dólares, irá receber 400 dólares e assim por diante.
Está claro que algo semelhante ocorre no “Bolsa Família”. Os valores pagos pelo Bolsa Família variam de R$ 15,00 a R$ 95,00, de acordo com a renda mensal por pessoa da família e o número de crianças.Ou seja, quanto mais pobreza, mais benefício.Se há algo errado na forma como os benefícios são distribuídos, provavelmente o careca monetarista diria que extinguir o Bolsa Família seria a pior solução.
Outra coisa é uma meia-verdade quando Friedman diz “nossa proposta”.A idéia do imposto de renda negativo foi criado por ninguém menos que....Friederich Von Hayek!!!Não por acaso o professor Mário Henrique Simonsen disse certa vez: “Em matéria de assistencialismo puro, na verdade o melhor programa é o da renda mínima (ou imposto de renda negativo), defendido por Hayek (...)Em vez de distribuir cestas básicas, remédios e outros serviços específicos, o governo daria dinheiro a todos, para que fosse usado segundo as preferências de cada um”(“Textos Escolhidos”,p.318, Editora FGV ou Exame,31-3-1993.Matéria “Pelo que o presidente Itamar deveria chorar”)
Veja que o Bolsa Família é um programa de TRANSFERÊNCIA DIRETA de renda, o que é compatível com a “liberdade do pobre de escolher se seu gasto deve ser diferente ou não daquele pretendido pelo burocrata”(visão de Friedman).Outra coisa que Friedman exalta na unificação das políticas sociais através de um único programa de transferência de renda direta é que a carga administrativa diminui e os custos diminuem, tornando um programa relativamente barato (p.175).E o que foi feito recentemente foi unificar Auxílio-Gás, Bolsa Escola, Cartão Alimentação e Bolsa Alimentação.
Dizer que o Bolsa Família “pressiona as contas públicas” é uma MENTIRA DESLAVADA!Pelo que li numa apostila de Concurso Público, recentemente o The Economist exaltou o fato do progama não gerar impacto significativo nas contas públicas diante de seu raio de abragência.Também pudera.Pelo que vi na Wikipédia, o programa consome míseros 0,4% do PIB!!!! Para vocês terem uma idéia de quanto isso representa, o gasto com pagamento da dívida consome cerca de 7% do PIB.Além disso, 0,4% do PIB foi o que reduzimos de pagamento com juros da dívida pública de 2005 a 2006.Ver:
http://www.bcb.gov.br/
Há outros argumentos pífios para a extinção do Bolsa Família.Tem , por exemplo, o argumento “Dê emprego pro cara, que ele sai da miséria”.Essa falácia se esfarela em duas observações básicas.Em primeiro lugar, o salário de mercado muitas vezes é insuficiente para retirar a pessoa da miséria.Por exemplo, um pai de família viúvo que ganha o salário mínimo e tem 3 filhos, obtém uma renda por pessoa de 95 reais.Os tecnocratas que criaram as regras do Bolsa Família consideram que quem tem uma renda por pessoa de até 120 reais é uma família miserável.Em segundo lugar, ainda que o salário de mercado fosse suficiente alto, a mera possibilidade de se está desempregado pode transformar o salário de mercado em 0 reais.Como o Seguro desemprego só vale por cinco meses, quem estivesse desempregado por mais tempo que isto estaria lascado!Todos os países desenvolvidos já passaram por crises que deixou gente involuntariamente desempregada por mais de cinco meses.
Outra falácia contra políticas sociais compensatórias é dizer que a única maneira de se acabar com a miséria é aumentar a capacidade produtiva dos mais pobres.Por exemplo, maiores investimentos em educação e qualificação dos trabalhadores pobres levam à acumulação de capital humano (existem outras, como o acesso a microcrédito e a terra).Para que esse argumento funcionasse seria necessário que as políticas sociais compensatórias excluíssem as políticas sociais estruturais.Esse não é o caso.Além disso, considerando o nosso nível relativamente elevado de renda (nosso PIB per capita é de 6571 dólares) e o altíssimo grau de desigualdade, programas compensatórios abrangentes têm de ser parte importante da política social.Política social compensatória serve para COMPLEMENTAR a política social estrutural, não para excluí-la.
Além disso, no que se refere à inserção competitiva no mercado de trabalho, a literatura econômica indica que o fraco desempenho educacional no Brasil decorreu da dificuldade em manter as crianças e os jovens na escola, sobretudo os de famílias de menor renda.A razão para isso é óbvia.Um dos motivos é porque crianças pobres trabalham para ajudar os pais.Enfim, existem outros motivos para evasão escolar além da péssima qualidade do ensino fundamental.Ao entrar no Bolsa Família, a família se compromete a manter suas crianças e adolescentes em idade escolar freqüentando a escola.Qual pai não vai pensar duas vezes antes de deixar o filho fora de escola?A condicionalidade do Bolsa Família serve como uma forma de poder de barganha do Estado na hora de conceder o benefício.Ajuda também a política social estrutural.E uma coisa interessante postaram na Wikipédia:“Alguns críticos do programa alegam que o Bolsa Família teria causado uma maior evasão escolar, pois os alunos não vêem mais uma obrigação para ir a escola, aumentando também o trabalho infantil - mas nunca apresentaram estatísticas para confirmar suas hipóteses”.
Por outro lado, quem acha que Estado não tem função de redistribuição de renda (observação: não estou citando ninguém em particular; veste a carapuça quem quiser)
deveria está fazendo uma passeata pedindo para que seu imposto de renda tivesse alíquota igual ao de Antônio Ermírio de Morais.Ou quem sabe, está visitando o dia-a-dia de uma família pobre para saber se as condições de inserção competitiva na economia capitalista delas é igual à de uma família de classe média alta.Quem sabe a pessoa que faça isso, anote tudo o que viu e ganhe o Prêmio Nobel de Economia, refutando o trabalho que deu esse mesmo prêmio ao economista indiano Amartya Sen.Para quem não sabe, a principal contribuição de Sen foi provar que o baixo desenvolvimento está essencialmente ligado às oportunidades que o Estado oferece à população de fazer escolhas e exercer sua cidadania.
Por fim, há o argumento da geração de empregos.Obviamente, o texto que o Night colocou diz que o Bolsa-Família não gerou empregos...NO NORDESTE.Pode ter gerado no Sudeste, onde se concentra a maior parte da produção do que é consumido no Nordeste.Em termos macroeconômicos, dá no mesmo.É verdade que nem sempre maior consumo gera emprego, mas a questão é que Bolsa Família não tem como objetivo resolver o problema do desemprego.Por outro lado, tem empresário formado em Administração que acha que políticas de transferência nunca podem ter impacto no crescimento econômico.Isso não é verdade:
https://antigo.religiaoeveneno.com.br/viewtopic.php?p=263769#263769